Em Memórias do Subsolo (1864), Fiodor Dostoievski antecipou discussões filosóficas que retomaria nos seus romances seguintes. A partir desse livro, também, o autor russo lançou as sementes de uma variedade de outros monólogos vividos por personagens igualmente subterrâneos em sua inadequação e contrariedade ao mundo. Pode-se pensar em Dias Felizes, de Samuel Beckett, ou em A Queda, de Albert Camus.
Como esses dois, o texto de Dostoievski chegou aos palcos. O diretor curitibano Emerson Rechenberg foi o responsável pela montagem que estreou em 2005, na Casa de Artes Helena Kolody, assumindo uma outra tradução para o título: Memórias do Subterrâneo. Na época, Nawbert Cordeiro atuava. Entre 2006 e 2007, o ator Ade Zanardine ficou com o papel. De volta ao cartaz de hoje a domingo, agora no Espaço Dois, é Rechenberg quem surge em cena (confira o serviço completo).
Por essa mudança central, o diretor encara a nova temporada quase como uma remontagem. "Precisei me livrar, no bom sentido, tanto da minha concepção de encenador quanto das referências que tinha dos atores que eu dirigi", diz. Cada um ressaltava um viés distinto do personagem: Cordeiro, o lado doentio. Zanardine, a fúria visceral. "Opto pelo caminho da ironia e do sarcasmo, vital em Dostoievski a partir do momento que se começou a traduzi-lo direto do russo, sem os floreados do francês."
No momento em que Rechenberg dirige a si mesmo, consegue imprimir melhor do que nunca sua concepção do espetáculo. Mas corre o risco de se perder na falta de uma referência externa para evitar isso, chamou colegas a olhar de fora e dar seus pitacos.
Outra mudança recente é o abandono do porão cenográfico construído para as primeiras apresentações em Curitiba e em São Paulo. Levava um mês para ser montado, restringindo as chances de viajar com a peça. Já nas vezes em que a encenou em Irati, Toledo e Cascavel, no interior paranaense, o diretor o trocou por um palco e alguns adereços essenciais.
No Espaço Dois, encontra um ambiente propício, por conta da arquitetura quase centenária, com tijolos à vista, que será incorporada ao cenário.
Memórias do Subterrâneo cumpriu um ano e meio de temporada em Curitiba e contabiliza 300 apresentações. Sua permanência se explica, segundo Rechenberg, pelo interesse do público pelas questões propostas por Dostoievski. "Basicamente, a crítica ao excesso de racionalismo e de cartesianismo, que é muito vigente na época em que ele escreve: querer calcular a vida com 30 ou 40 anos de antecedência", diz.
O tema que sempre reaparece nas discussões feitas com a plateia, foi o que seduziu Rechenberg a montar o espetáculo e o estimula a continuar rumo às 500 apresentações: "Nos transformamos nessa coisa quase autômata, abrimos mão dos desejos e dos instintos em nome de algo que tem de ser racional, concreto, tendo de dar resposta às pessoas e deixando de dar resposta a nos mesmos", conclui.
Serviço:
Memórias do Subterrâneo. Espaço Dois (R. Com. Macedo, 431), (41) 3326-6224. Texto de Fiodor Dostoievski. Adaptação, direção e atuação de Emerson Rechenberg. Dias 22, 23, 24 e 25, às 21 horas. R$ 20 e R$ 10 (meia). Confira o serviço completo
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