João Paulo Cuenca: projeto Amores Expressos o levou a Tóquio, de onde saiu com o romance O Único Final Feliz para uma História de Amor É um Acidente, publicado agora pela Companhia das Letras| Foto: Jorge Bispo/ Divulgação

Opinião

Dias incertos, noites nebulosas

Marcio Renato dos Santos, repórter da Gazeta do Povo

O Único Final Feliz para uma História de Amor É um Acidente pode confundir o leitor. Afinal, há muitas informações costuradas. Há mais de um ponto de vista a narrar o enredo. Mas, apesar disso, o livro não pode ser chamado de ruim. Ao contrário.

O terceiro romance de João Paulo Cuenca dialoga com o mundo contemporâneo. Até demais.

Estamos, todos, inseridos no tempo dos excessos, da saturação, por exemplo, de sinais. Todos querem falar, poucos estão dispostos a ouvir. É em meio a um caos do jeito que são esses dias e noites de 2010 que Shunsuke Okuda, executivo japonês, inicia um flerte com Iulana Romiszowska, garçonete romena-polonesa, que, no momento, parece estar envolvida com uma outra personagem.

Atsuo Okuda, o pai de Shunsuke, é um poeta que, no tempo presente, pretende destruir tudo o que filho procura, inclusive as possibilidades de felicidade.

A trama pode confundir quem lê.

Será que o efeito é intencional?

Independentemente de a resposta ser sim, ou não, o que ganha primeiro plano no romance é a linguagem, mais do que rápida, sedutora e inebriante.

Cuenca reinventou o Japão real por onde esteve por um mês.

Vemos Tóquio, não pela janela de um vagão, mas na página 17 do livro: "A paisagem que vemos pela janela deixa de ser um desconjunto de traços horizontais para se congelar em contornos iluminados por trás da chuva. Ao lado do pontilhão por onde passa a linha, há uma muralha de edifícios e galerias comerciais. No topo de tudo, um grande outdoor anuncia sopa em tubos de neon".

O Único Final Feliz para uma História de Amor É um Acidente é uma experiência literária ousada, que mostra uma visão de mundo crítica sobre os exageros que poluem o mundo, acima de tudo, um registro artístico desses dias incertos e dessas noites nebulosas que formam o início do século 21. GGG

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O carioca João Paulo Cuenca, que completa hoje 32 anos, vai passar os próximos dias no litoral fluminense. No domingo (8), me­­di­­­­ará uma mesa da programação oficial da 8.ª Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), com a presença de duas escritoras, a cubana Wendy Guerra e a chilena radicada no Brasil Carola Saavedra.

Mas, independentemente do compromisso, Cuenca pretende sorver o visual da cidade histórica e relaxar. Ele acaba de ver impresso o seu terceiro romance, O Único Final Feliz para uma História de Amor É um Acidente.

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A longa narrativa, que tem na capa o selo da Companhia das Letras, é fruto do projeto Amores Expressos, que a empresa RT/Features idealizou com a finalidade de enviar autores brasileiros para diferentes cidades do mundo. De volta ao Brasil, cada escritor teria de escrever um livro ambientado onde esteve. Joca Terron foi para o Cairo; Daniel Galera, para Buenos Aires. Luiz Ruffato passou uma temporada em Lisboa.

Cuenca, por sua vez, vagou pelos subterrâneos de Tóquio durante 30 dias, entre abril e maio de 2007. Ainda em território japonês, começou a esboçar a trama. Durante três anos, es­­creveu, reescreveu, deixou o texto descansando, retomou a narrativa e só deixou de modificar o romance quando a Companhia das Letras encaminhou o arquivo para a gráfica Bartira, no mês passado.

O romance é, na definição do autor, um livro sobre o artificialismo do amor, da literatura, sobre o tempo presente, "onde tudo é um fetiche".

Cuenca diz não ter muita expectativa sobre a recepção da obra, mas não esconde que abriria um sorriso permanente no rosto se O Único Final Feliz para uma História de Amor É um Acidente viesse a ser lido e, principalmente, traduzido para o japonês. Ele também experimentaria a felicidade na Terra se o livro deslocasse o leitor do seu ponto de equilíbrio.

E, se não for pedir demais, espera que a longa narrativa viabilize ao leitor, mais que respostas, novas perguntas.

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Cuenca respondeu por e-mail, sentado no quarto de seu apartamento no Rio de Janeiro, pouco mais de dez perguntas. Ele confirmou que, a exemplo de Corpo Presente e O Dia Mastroianni (seus dois outros livros), esta terceira obra também foi realizada a partir de uma encomenda.

"Considero todos os meus livros ‘sob encomenda’. Se é de um editor ou dos meus fantasmas, o processo de criação e o mergulho são os mesmos", confessa.

Ele tem exposição nos veículos de comunicação, mas não sobrevive da literatura, e sim das atividades paralelas como escrever para jornal e televisão, e ministrar oficinas. A literatura está se profissionalizando no Brasil? "Isso jamais aconteceu", responde. De toda forma, ele é escritor e não tem outra opção. Escreve continuamente. "Acho que um escritor, mesmo quando está longe de uma folha de papel durante anos, trabalha sem parar. Ou seja: trabalho todo dia, até, e principalmente, enquanto durmo", conta.

Cuenca gosta muito de Curitiba. Já esteve por aqui como atração do Paiol Literário. Depois do compromisso, saiu pela noite e foi visto em alguns bares. Conquistou fãs curitibanas. O escritor avisa que, em setembro, estará novamente na capital paranaense. E pretende empreender uma expedição noturna por "botecos" e outros espaços.

Serviço

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O Único Final Feliz para uma História de Amor É um Acidente, de João Paulo Cuenca. Companhia das Letras, 146 págs., R$ 36,50.