Certos filmes do cinema ou programas de tevê marcam profundamente a memória afetiva das pessoas. Por essa razão, não deveriam ser vítimas de remakes ou atualizações cada coisa pertence a seu tempo. Mas a eterna crise de criatividade de Hollywood faz os produtores apelarem constantemente ao resgate dessas obras passadas. Se o reaproveitamento de idéias é inevitável, esse tipo de projeto teria sempre que ficar nas mãos de alguém com um mínimo de personalidade no trabalho, que tentará de todas as formas fazer algo original como aconteceu recentemente com Tim Burton na ótima refilmagem de A Fantástica Fábrica de Chocolates.
Mas a realidade quase sempre pende para o outro lado, das adaptações que decepcionam, como comprova A Feiticeira, de Nora Ephron, filme estrelado por Nicole Kidman e Will Ferrell, principal estréia da semana nos cinema brasileiros.
A produção tenta resgatar a magia do seriado veiculado na tevê americana entre 1964 e 1972, e sucesso até hoje nos canais de programas antigos da tevê paga (em Curitiba, ainda passa na canal 59, UHF), mas o resultado final é um filme insosso, sem brilho, apenas um esboço de comédia romântica.
Pelo currículo recente de Ephron responsável pelos fracos Bilhete Premiado e Michael Anjo e Sedutor (ambos com John Travolta), além do apenas razoável Mensagem para Você não dava para esperar algo melhor.
A cineasta assina o roteiro ao lado da irmã Delia e apresenta a história de Jack Wyatt (Ferrell), ator em plena decadência depois do fracasso do seu último filme. Ele tenta dar um novo gás à carreira migrando para a televisão fato que tem acontecido na vida real com diversas estrelas de Hollywood, algumas com sucesso (Kiefer Sutherland, em 24 Horas, e James Spader, em Justiça sem Limites), outras não (Bill Pullman, com Revelações, e John Goodman, em Center of the Universe). O ex-astro é escalado para protagonizar uma refilmagem da série A Feiticeira, mas precisa desesperadamente arrumar uma atriz que saiba fazer o famoso movimento de nariz da personagem Samantha (eternizado por Elizabeth Montgomery) e que não ofusque sua nova tentativa de sucesso. E aí que aparece Isabel Bigelow (Kidman), uma bruxa de verdade, descontente com o mundo da feitiçaria e decidida a levar uma vida normal. Ela se encanta com o pateta Jack e aceita prontamente fazer parte do elenco do seriado.
O filme se perde em encontros e desencontros do casal, piadinhas e os efeitos especiais dos poderes da personagem de Kidman, que faz o que pode com o fraco papel que tem em mãos. Ferrell (Melinda e Melinda) cai bem na pele do apalermado ator, mas não apresenta nada de novo se não se cuidar, vai acabar ficando marcado apenas por esse tipo de personagem. Há poucos momentos realmente engraçados. Do casal protagonista, vale destacar apenas a cena em que Isabel usa seus poderes para fazer Jack se atrapalhar na gravação do programa caminho aberto para Ferrell fazer algumas caretas. A graça fica mesmo por conta dos coadjuvantes: Michael Caine, para variar, rouba a cena como o pai de Isabel, que se envolve com o personagem de Shirley McLane (uma atriz que se revela uma bruxa também, intérprete de Endora, mãe de Samantha na série). Há, ainda, uma rápida e divertida participação de Steve Carrell (O Virgem de 40 Anos), que faz um desencarnado tio Arthur (personagem do seriado). Se é para estragar, para que refilmar? GG
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