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Viagens à parte, é possível listar certas características que ajudam a definir um conto, ou pelo menos a chegar perto disso.

"Síntese, suspense, surpresa – mas é muito mais do que isso, ou bem menos do que isso, se pensarmos no lema do minimalismo, less is more (‘menos é mais’)", diz o escritor e jornalista Roberto Muggiati, organizador do volume A Selva do Dinheiro (Record).

Todo mundo parece concordar que não há regras nem fórmulas e tudo o que pode ser afirmado sobre o conto não consegue engessá-lo. "É uma narrativa estratégica. Um cálculo. Enquanto narra uma história – de forma precisa e densa – oculta uma outra, elíptica e fragmentária, cujo sentido se desvela no final fundindo as histórias de forma surpreendente", diz Livia Garcia-Roza (A Cara da Mãe), ecoando as palavras do argentino Ricardo Piglia.

Piglia, no livro Formas Breves, afirma que um conto apresenta sempre duas histórias: uma visível que esconde outra invisível. "Para mim, conto é um fragmento de algo que poderia ser maior e mais amplo, caso interessasse ao autor", diz Marçal Aquino (Cabeça a Prêmio).

Alguém pode reclamar que não cabe aos escritores explicar o conto, mas a ideia aqui foi exatamente essa: sem a visão acadêmica, ver o que diriam os ficcionistas.

Talvez seja uma referência banal, mas, no Dicionário de Termos Literários (Cultrix), Massaud Moisés faz um verbete de fôlego para apresentar uma definição elaborada do gênero, abordando temas como "a unidade de ação que gera a unidade de lugar", a representação do tempo (com lapsos) e o foco narrativo do conto. E mostra que há, sim, uma estrutura reconhecível nos textos curtos – embora não faltem escritores dispostos a detoná-la.

"Realmente não gosto e nem posso responder nada com muita objetividade", diz Luís Henrique Pellanda. "Mas arrisco que um conto decente deve ter entrelinhas largas, abster-se de detalhar demais o recorte de vida comum que optou por narrar, não desmatar muito o terreno ruim que vai explorar e fugir das facilidades do mero anedotismo e das chaves-de-ouro – quando fáceis, esclareço e repito."

Para arrematar a conversa, Milton Hatoum diz que Machado de Assis elaborou "uma poética do conto". "Já no primeiro parágrafo de ‘A Causa Secreta’, Machado dá uma ótima definição do gênero. Esse conto começa com uma cena de que participam os três personagens principais. Na quinta linha, o narrador escreve: ‘Como os três personagens aqui presentes estão agora mortos e enterrados, tempo é de contar a história sem rebuço’. Contar a história sem rebuço: não é esse o primeiro mandamento de quem escreve um conto?", pergunta Hatoum.

Se Machado diz para não dissimular, quem vai discordar?

No mais, ele é fulminante (nocaute), sem começo nem fim, uma travessia transformadora, efêmero (fósforo), sintético, tenso, surpreendente, estratégico, calculista, do tipo "dois-em-um" (história narrada que oculta outra invisível) e é fragmento de algo maior.

Por fim, a extensão de um conto pode criar a ilusão de facilidade, um negócio que se lê rápido. Na verdade, é o oposto disso. Enquanto o romance permite que sua atenção vacile de vez em quando – Roland Barthes chegou a escrever sobre essa experiência –, o conto leva o leitor com rédeas curtas. (IBN)

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