Recife Um dos destaques da 11.ª edição do Cine PE - Festival do Audiovisual foi a apresentação do filme Não Por Acaso, primeiro e aguardado diretor paulista Phillipe Barcinski, premiado diretor de curtas e possível vencedor de vários prêmios da mostra recifense.
O filme, que passou na noite de sexta-feira, após o fechamento desta edição, é estrelado por Rodrigo Santoro, Leonardo Medeiros e por Letícia Sabatella, mineira de nascimento, mas criada em Curitiba, onde iniciou sua carreira artística.
A atriz conversou com o Caderno G via e-mail, antes de chegar a Recife, e comentou seus trabalhos no cinema, que incluem sua estréia na direção com um documentário sobre os índios krahô, que vivem no estado do Tocantins. Letícia Sabatella, conhecida também por uma postura política ativa, falou também sobre o governo Lula e o MST.
Caderno G Fale sobre seu personagem em Não por Acaso. Fez teste para o papel ou foi convidada diretamente pelo Phillipe Barcinski?
Letícia Sabatella Lúcia é o nome da personagem. Soube do filme pelo Daniel de Oliveira que estava cotado para o papel que o Rodrigo Santoro fez. O Daniel estava sendo testado na época em que fazíamos juntos Hoje É Dia de Maria, nós três já éramos amigos e colegas. Uma noite, minha agente me ligou dizendo que queriam que eu fizesse um teste para duas possíveis personagens do filme. Recebi o texto e achei o roteiro muito bom e escolhi uma das personagens para fazer o teste. Por fim acabei fazendo o filme.
Que tipos de personagens a atraem? Como se prepara para viver um personagem? Faz muita pesquisa? Ou fica mais atrelada ao roteiro (do filme ou da novela) ou indicações do diretor?
Gosto de poder brincar e gosto também de me aprofundar. Acho sempre bom diversificar, tanto o método como as personagens, assim dá para estar sempre "viva" em cena, pois sempre será um novo desafio.
Você realizou um documentário sobre os índios krahô. Fale sobre essa experiência de convivência diária com os índios. Como está sendo o traballho com o Gringo Cardia, que co-dirige o filme? Cardia é conhecido por sua arte visual essa experiência dele na área será transportada para o filme?
Estamos finalizando o documentário Hotxuá O Riso Krahô, sobre os palhaços sagrados da tribo do povo krahô. Esta tem sido a mais perfeita de todas as boas experiências que o ofício de atriz tem me oferecido, para que eu aprenda cada vez mais sobre a vida, a arte, a humanidade e o sagrado. Acredito que o que este povo tem a nos ensinar pode contribuir imensamente para uma cultura de paz, igualdade, equilíbrio com a natureza. Além de oferecer sua arte e a força milenar de sua cultura, pois o documentário foi um pedido da própria aldeia para que esta tradição fosse transmitida às novas gerações e a outras "tribos".
Tive uma oportunidade única de adentrar o universo do palhaço pela arte ancestral de nossos mestres indígenas. Nada poderia ser mais legítimo. Os krahôs são amorosos, muito acolhedores. São detentores de uma sabedoria e consciência planetária com a qual temos muito que aprender. É um patrimônio muito valioso que precisa ser respeitado e melhor aproveitado por todos os brasileiros. Historicamente, com pelo menos três grandes massacres sofridos, além de epidemias e desprezo de parte da sociedade brasileira, que visa o lucro imediato e desconhece o alcance de sua cultura e de seu espírito, eles hoje ainda resistem íntegros, coesos, contra inúmeras ameaças em torno de sua reserva, que é a maior área de cerrado preservado ainda existente, graças a eles.
A primeira pessoa que chamei para dirigir o documentário foi Leila Hipólito e ela fincou pé no tema do Hotxuá, dizendo que isso ainda não tinha sido feito. Por motivos pessoais, ela precisou se afastar e, pelo meu grande envolvimento com os krahô, dei continuidade ao projeto. Mais tarde, chamei Gringo para co-dirigirmos o filme, uma vez que não tinha experiência de direção. A própria Leila achou ótima esta combinação. O Gringo, com sua enorme experiência de direção de arte (ele já havia me dirigido no videoclipe A Cigarra, de Elsa Soares), somou brilhantemente ao conteúdo que eu já tinha bastante elaborado. Agora estamos eu, o Gringo e a Leila, que assina a montagem.
Ainda sobre cinema, você vai estar no novo filme do Guel Arraes, Romance. Pode falar sobre o projeto e a personagem que vai interpretar? Tem outros convites para a tela grande em vista?
Como disse anteriormente, a gente sempre precisa se colocar desafios. A linguagem cinematográfica que o Guel criou sempre me chamou muito a atenção. Quando ele me convidou para trabalhar, o que me encantou foi o tema de Tristão e Isolda e o roteiro com a história de um casal contemporâneo, às voltas com seus encontros e desencontros, meio assombrados por este mito do amor-paixão. A personagem é uma atriz que se apaixona por seu diretor e parceiro de cena. O mais difícil foi fazer o filme durante a gravação de Páginas da Vida, e enquanto também dirigia o documentário, num malabarismo incrível das produções para conciliar os cronogramas. Tenho o convite para o filme de Caco Pereira, 400 contra 1, ainda sem data para as filmagens.
Você participou da microssérie Hoje É Dia de Maria, e atualmente o Luiz Fernando Carvalho está preparando a primeira microssérie do projeto Quadrante, A Pedra do Reino, baseado no romance do Ariano Suassuna. Vai participar dessa primeira adaptação? Fale sobre a importância do Luiz Fernando para sua carreira, pois foi ele quem a lançou na tevê (no especial Os Homens Querem Paz, de 1991).
O barato desse projeto do Luiz é trabalhar com as pessoas dos lugares onde se passam as histórias. Como eu não sou nordestina... O Luiz é importante para a televisão e o cinema brasileiros. Trabalhar com ele é sempre muito rico e transformador. E Hoje É Dia de Maria foi uma sagração disso, onde houve espaço para que se pudesse tentar abarcar amplamente todos os aspectos de uma criação artística. Isso não acontece todo dia, principalmente na televisão. O sentimento que eu tenho é de uma profunda gratidão e grande admiração pelo artista incansável, que nunca se acomodou aos padrões que encontrou e ousa cavar espaços onde poucos se atreveriam.
Ao contrário de boa parte dos atores, você apresenta uma postura política, envolve-se em questões sociais. Esse posicionamento chega a ser determinante na seleção que faz dos trabalhos que vai participar? Chega a atrapalhar, já perdeu algum trabalho por alguma questão política?
Não sinto que tenha perdido nada com as escolhas que fiz. Fiz escolhas artísticas, algumas pela sobrevivência também, mas não apenas, como também já recusei trabalhos para os quais não conseguiria contribuir com a minha alma.
Como vê a situação política atual do país, com essa constantes crises? Qual sua avaliação do primeiro mandado do presidente Lula e quais são suas expectativas a esse segundo período?
Mesmo com algumas boas conquistas de seu governo, tenho muito medo pela conduta adotada atualmente relacionada ao que ele chama de Programa de Aceleração do Crescimento. Na minha opinião, nada pode impedir mais o crescimento saudável de um povo do que a degradação do patrimônio ambiental, que é também fonte de vida, cultura, bem-estar e relações mais pacíficas. Para usar um dito bem popular: a pressa sempre foi inimiga da perfeição. Perfeição seria simplesmente podermos contar com projetos que favorecessem a autosustentabilidade de nossas riquezas naturais, das comunidades ribeirinhas, das aldeias, dos movimentos populares a fim de preservar para as futuras gerações o mesmo direito que temos hoje de usufruir desses bens.
Ainda está ligada ao Movimento dos Sem-Terra, ainda acompanha de perto o trabalho do grupo?
O movimento foi e continua sendo uma referência muito importante para mim. Um exemplo do pleno exercício que um grupo grande de pessoas pode ter de sua cidadania. É a pobreza que se organiza para transformar sua realidade e compartilhar como irmãos a terra, legitimamente reconquistada, não para o enriquecimento de um, mas na intenção de formar uma comunidade igualitária.
Volta sempre a Curitiba? Pretende desenvolver algum projeto na cidade?
Sim. Sempre tenho esta vontade de trabalhar com os artistas de Curitiba.
E o teatro? Alguma projeto em vista?
Alguns. Mas como estou ocupada com o documentário ainda não dá para pensar em outra coisa.
O repórter viajou a convite do evento.
Letícia Sabatella, atriz
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