O grupo
Nós do Morro é uma escola de teatro da Comunidade do Vidigal que há 20 anos dá acesso à arte, cultura e cidadania à população mais pobre, com o ensino das artes cênicas. A proposta é ampliar os horizontes sociais e culturais de seus integrantes, inclusive, proporcionando oportunidades de ingresso no mercado de trabalho. O grupo reúne hoje mais de 50 pessoas, entre diretores, atores, técnicos, autores e colaboradores em diversas áreas. A gestão cabe a um núcleo de cinco pessoas: o ator e diretor Guti Fraga, a diretora Zezé Silva, o autor Luiz Paulo Corrêa e Castro, o iluminador e diretor Fred Pinheiro e o cenógrafo Fernando Mello da Costa.
Em 1986, Guti Fraga ficou mais pobre. E nem se importou. Trocou a segurança de seis anos como diretor de cena da atriz Marília Pêra para aceitar o convite de criar um grupo de teatro na Comunidade do Vidigal, no Rio de Janeiro. "Sabia que ia ter de mudar meu padrão de vida para entrar em um projeto como esse. Sou de origem pobre. A falta de oportunidade é algo que sempre me inquietou", conta.
Mato-grossense de nascimento, o diretor mora no Vidigal desde 1977. A convivência no morro foi um dos principais motivos que o levaram a aceitar o convite. Em uma das viagens que fez a Nova Iorque, percebeu que o mainstream nem sempre é sinônimo de qualidade. "Vi muitas peças do circuito off. Percebi que eram todas muito bonitas e que era possível criar um projeto sócio-cultural com qualidade e sem paternalismo".
Hoje, a meses de completar 21 anos, em outubro, o Grupo Nós do Morro venceu o estereótipo que injustamente se tachou às entidades sociais o de que não é possível aliar promoção social e bons resultados artísticos. "É como se fôssemos um cidadão sem identidade. A visibilidade nos deu essa identidade", diz Fraga.
À brasileira A recompensa pela qualidade do trabalho veio com pompa e estilo, em agosto passado, com aplausos entusiasmados do público multiétnico que assistiu a adaptação da primeira comédia romântica de Shakespeare, Os Dois Cavalheiros de Verona, apresentada pelo grupo no vilarejo-natal do bardo inglês, Stratford-Upon-Avon.
Enterrado em uma igreja, a 200 metros dali, ele talvez sorrisse ao ver adolescentes e jovens do Morro do Vidigal interpretarem seus personagens com tanta fidelidade, mas com um tempero bem brasileiro. "Fomos super-respeitosos com o texto. Fizemos só um enxugamento. A brasilidade se revela nos prólogos musicados", conta Fraga, que co-dirige a montagem com Fátima Domingues e Miwá Yanagizawa.
Se até mesmo os conterrâneos de Shakespeare não esconderam o franco entusiasmo, é bem provável que os exigentes curitibanos também aplaudam as apresentações do espetáculo, que abre a Mostra Oficial do FTC 2007, hoje e amanhã, às 20h30, no Guairão.
O espetáculo conta a história de Valentino e Proteu, dois nobres cavalheiros de Verona que vão para a corte do Duque de Milão. Lá, se apaixonam por Sílvia, a bela filha do Duque, que também se encanta com Valentino. Furioso, Proteu arma uma intriga para o amigo ser expulso da corte e, assim, conquistar a bela Sílvia. Júlia, com quem ele havia se comprometido antes de partir para Milão, se traveste de homem e vai atrás dele. Ao chegar à cidade, descobre o caráter distorcido do amado e decide ajudar Sílvia a desmascará-lo.
Ao texto original, o dramaturgo Luiz Paulo Corrêa e Castro acrescentou prólogos que foram musicados pelo elenco de 16 atores. Eles utilizam dois violões e instrumentos de percussão para executar números que passeiam por ritmos como o pop, a balada, o reggae, o hip-hop e o bolero. "A música é visceral no grupo. O brasileiro em geral tem muita facilidade com a música, por isso, só foi preciso moldar", conta o diretor.
Simplicidade
Nós do Morro já virou eu, tu, eles: por meio do Sesc, expandiu sua abrangência para outras três localidades cariocas Saquarema, Japeci e Itaocara e para escolas municipais de Nova Iguaçu. Para criar a metodologia do grupo, Guti Fraga se inspirou nas formas de fazer teatro de vários dramaturgos, de Stanislavski e Augusto Boal. Mas a grande inspiração foi o método pedagógico de Paulo Freire.
A soma de tudo produziu uma fórmula de sucesso que formou atores que já participaram de filmes e novelas como Thiago Martins, Mary Sheyla de Paula e Roberta Rodrigues. "Utilizamos a verdade da simplicidade na interpretação. São artistas que cresceram aqui dentro, têm um compromisso sério com a arte. Se estão em uma novela das oito, por exemplo, têm o compromisso de estar também nas internas, nos bastidores. Não podem perder a simplicidade, a essência".
Serviço: Os Dois Cavalheiros de Verona. Guairão (Pça. Santos Andrade, s/n.º), (41) 3304-7982. Com o Grupo Nós do Morro. Texto de William Shakespeare. Dias 22 e 23, às 20h30. Ingressos a R$26 e R$13 (meia).
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