Após o fim da projeção de Universo Graciliano, estreia nacional que o Litercultura reservou para a programação deste sábado (22), a pergunta permanece: quem foi Graciliano Ramos? Um stalinista que não contaminou sua literatura com camisas de força ideológicas? Um irascível divertido? Um homem de tempos confusos e mulherengo convicto?
São diversas as facetas e as reentrâncias que o belo documentário de Silvio Back apresenta, um percurso comovente em que se insurge um personagem múltiplo, incandescente, ora um homem sem destino diante da morte da primeira e do filho, ora um sujeito capaz de defender, talvez de modo irônico, que a censura prévia aos livros poderia evitar tanto livro ruim nas prateleiras das livrarias.
Durante quase uma hora e meia descobrimos um autor impiedoso, direto, apaixonante e algo intolerante. "Jorge Amado escreveu das mais belas páginas da literatura brasileira, mas escreveu muita porcaria também. Enquanto eu sofro para escrever 17 páginas, ele produz 170, como quem mija", diz em certo momento o Velho Graça.
Nascido em Quebrangulo, num rincão de Alagoas, Ramos parece ter feito de sua vida um atestado das contradições de toda a gente, um autor que defendia (e pouco questionava) as suas convicções políticas, mas era abissalmente contra o realismo socialista isso de trazer as questões demagógicas para dentro do texto. Assim, nos extremos, erigiu uma obra capaz de resistir às intempéries do tempo porque universal e incisiva.
Dirigido com mão firme, o documentário causa desconforto nos entrevistados e retira-os da zona de amistoso típica Graciliano morreu em 1953, restam pouquíssimas pessoas que conviveram com o escritor. Alguns consultados, como Niemeyer, inclusive já morreram. E, como sempre diz Back, os mais velhos podem mentir muito...
Universo Graciliano comprova a "sorte" de Graciliano Ramos, que teve mais uma vez um grande registro cinematográfico envolvendo seu nome, possivelmente o único grande escritor brasileiro que sempre teve, sem medo de exageros, adaptações à altura de seu legado literário. GGGG