Perfil
Wyeth se via como um pintor abstrato
Nascido em 1917, em Chadds Ford, no estado da Pensilvânia, Andrew Wyeth era filho de um ilustrador profissional e começou a pintar bem cedo. Com apenas 20 anos, fez sua primeira exposição individual. As aquarelas exibidas na Macbeth Gallery, em Nova York, foram todas vendidas e diante do sucesso, o jovem artista não teve mais dúvidas de qual carreira seguir. Wyeth expôs mais de uma vez na mesma galeria, que regularmente recebia mostras de outros norte-americanos realistas, como Edward Hopper e Winslow Homer.
Embora tenha sido classificado como um pintor realista, Wyeth se via como abstrato. Em 1965, o artista declarou à revista Life que os personagens de seus desenhos e pinturas "respiram de um jeito diferente". "Há um outro coração um sentimento que é, definitivamente, abstrato", disse.
O título de seu quadro mais famoso, Christinas World sugerido pela esposa, Betsy ajuda a entender a visão subjetiva de Wyeth sobre a tela e talvez sobre toda sua obra. Embora figurativa, Christinas World é, antes de tudo, uma expressão psicológica, defende Laura Hoptman, autora do livro Wyeth Christinas World.
"É o retrato de um estado de espírito mais do que o retrato de um lugar", afirma Laura. "[O quadro] traz a mistura provocativa de observação e imaginação", reitera. Laura Hoptman observa que a combinação entre o naturalismo e a fantasia torna-se cada vez mais importante e presente na obra dele.
Christinas World tornou-se uma imagem tão icônica que foi copiada pela publicidade. O livro editado pelo MoMA reproduz um anúncio de aparelho de ar condicionado, publicado em 1966 na revista New York Times Magazine. Na foto, uma garota aparece em pé, em frente a um vasto gramado, tendo ao fundo uma casa parecida com a dos irmãos Olson. Outra imagem traz a própria obra-prima de Wyeth reproduzida em cores mais fortes com uma gigantesca garrafa de cerveja no alto da colina.
Andrew Wyeth trabalhou até o início do século 21. Morreu em 2009, na mesma cidade onde nasceu, com 91 anos. Seu corpo foi enterrado ao lado do jazigo dos amigos Anna Christina e Alvaro Olson, no cemitério de South Cushing, conforme o próprio Wyeth havia pedido em vida.
Christinas World é uma das imagens mais conhecidas do século 20. Embora muita gente não saiba o nome do autor nem da obra, a figura solitária da moça sentada no campo, com a casa de fazenda ao fundo, magnetiza o olhar e adere à mente de forma instantânea. A importância da tela alcança o imaginário coletivo a ponto de ter influenciado até mesmo a publicidade norte-americana.
O autor da obra, Andrew Wyeth, é um dos mais importantes nomes das artes plásticas nos Estados Unidos. Foi um desses artistas que transformou o (aparentemente pequeno) mundo ao seu redor em um universo infinito. Cenários e personagens de um pedaço da América, que se repetem em suas obras, ampliam a conexão do artista com o subconsciente do público. Estão lá o silêncio, a solidão, as paisagens infinitas que em algum momento conhecemos ou desejamos conhecer, o passar do tempo na alma e as limitações humanas diante da magnitude da natureza.
São elementos que calam fundo ao espírito dos norte-americanos e aparecem, também, em diferentes expressões e em outras obras da exibição American Modern: Hopper to OKeeffe, em exposição no Museu de Arte Moderna (MoMA), em Nova York, até 26 de janeiro de 2014.
Os quadros, desenhos, esculturas e fotografias da mostra, pinçados do acervo do museu, foram produzidos na primeira metade do século passado. A curadoria da exposição explica que as obras refletem as transformações da sociedade dos EUA nesse período, tanto em regiões rurais quanto nas grandes cidades. Esse recorte talvez explique a sensação de solitude que muitas produções transmitem o homem conquista, constrói, industrializa e domina a terra, mas sua alma permanece só.
Entre os artistas participantes estão nomes bastante conhecidos, como Edward Hopper e Georgia O´Keeffe, e outros não tão famosos, mas não menos importantes: George Bellows, Stuart Davis, Charles Sheeler, Alfred Stieglitz e o próprio Wyeth.
Quem estiver em Nova York no período da mostra não deve perder a oportunidade. É fascinante contemplar um quadro de Hopper ao vivo e em cores, e compreender a conexão entre a obra dele e a de Andrew Wyeth. Dá para entender por que Christinas World ficou tão famosa.
A tela sintetiza a obra de Wyeth captura o olhar e nos faz viajar pelo campo em busca do acolhimento do casarão e também carrega mistérios. Por que a mulher de vestido rosa nos dá as costas? O olhar de Christina se dirige somente à casa? A moça não está relaxada, apreciando uma tarde preguiçosa no campo, como se poderia supor: há alguma tensão na figura. Christina busca algo e não sabemos o que é. A casa parece um refúgio difícil de alcançar, mas também pode ser um lugar escuro, fonte de pavores inexplicáveis.
Livro traz detalhes sobre a obra de Wyeth
O livro Wyeth Christinas World, de Laura Hoptman, editado pelo MoMA, estabelece ligações entre Andrew Wyeth e outros artistas contemporâneos que participam da mostra American Modern: Hopper to OKeeffe. Mais do que isso, na obra que integra a coleção "One on One", dedicada a artistas do acervo do museu a autora fala da vida e do legado de Wyeth, traz reproduções de muitos outros quadros do pintor norte-americano, fotos e a história por trás da icônica tela que estampa a capa do livro.
Andrew Wyeth conhecia bem a casa retratada em Christinas World. E também a própria Anna Christina Olson. Ela e o irmão, Alvaro, eram vizinhos da moradia de verão do pintor na cidade de Cushing, na costa do Maine. O casarão, construído no final dos anos 1700 por antepassados dos Olson, era a sede da fazenda onde viviam os irmãos, que herdaram a propriedade e nunca se casaram.
Wyeth conheceu Christina e Alvaro em 1939, apresentado por Betsy James, amiga dos Olson e com quem o artista se casaria. Wyeth e Betsy foram amigos próximos dos dois irmãos e frequentaram a casa deles por muitas décadas. O artista chegou a ter um estúdio em um dos quartos do casarão em estilo colonial.
Em Christinas World, feito em 1948, Wyeth retrata a amiga ao ar livre, situação incomum no dia a dia dela. Anna Christina Olson pouco saía de dentro da casa. Ela tinha paralisia nas pernas, consequência de poliomielite possivelmente contraída na infância.
No livro sobre Wyeth, Laura Hoptman conta que ele teve a ideia para Christinas World quando observou a amiga subindo sozinha uma colina, de volta à casa após colher verduras na horta da propriedade. Ela se recusava a usar cadeira de rodas preferia se arrastar usando os braços como impulso e não gostava que se apiedassem da situação. Christina participava como podia da vida da pequena comunidade de South Cushing e era conhecida por todos os moradores.
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