Tatuagem conta a história dos artistas do cabaré Chão de Estrelas, inspirados no grupo teatral Vivencial Diversiones, de Recife| Foto: Divulgação

Cinema

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Quem acompanha de perto o cinema brasileiro desde meados dos anos 1990 já deve ter ouvido falar de Hilton Lacerda. Ou, pelo menos, dos longas-metragens cujos roteiros contaram com sua colaboração. O pernambucano radicado em São Paulo tem no currículo alguns dos títulos mais importantes das duas últimas décadas: Baile Perfumado (1996), Amarelo Manga (2003), A Festa da Menina Morta (2008) e Febre do Rato (2011). Todos premiadíssimos.

Agora, Lacerda faz uma transição importante em sua carreira. Além de ter escrito, ele dirigiu Tatuagem, que estreia amanhã em Curitiba, depois de ter levado três Kikitos, incluindo o de melhor filme, no Festival de Gramado, e o Prêmio Especial do Júri do Festival Internacional do Rio de Janeiro, entre outras láureas (veja o serviço completo no Guia Gazeta do Povo).

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Tatuagem se passa em 1978, ano em que a ditadura militar começa a dar sinais de esgotamento, com o fim do Ato Institucional N.º 5 (AI-5) e a possibilidade concreta de uma Lei de Anistia, promulgada um ano mais tarde. A ação do longa é centrada, principalmente, mas não apenas, em uma trupe de artistas, que se apresenta em um misto de teatro e cabaré chamado Chão de Estrelas, na região de Recife. O grupo – inspirado em uma companhia chamada Vivencial Diversiones, que de fato existiu naquela época, entre 1972 e 1981 – provoca a moral estabelecida por meio de atitudes irreverentes e provocativas, dentro e fora das apresentações.

O Chão de Estrelas é liderado por Clécio (Irandhir Santos, melhor ator em Gramado), que se apaixona por Fininha (Jesuíta Barbosa, premiado no Festival do Rio), um jovem soldado do interior pernambucano que descobre no cabaré um espaço de liberdade, contraponto à rotina de disciplina e opressão do quartel.

Apesar de a trama se passar há 35 anos, Lacerda, em entrevista concedida à Gazeta do Povo, por telefone, diz que o filme discute temas muito contemporâneos. "O presente é fruto de uma história. Tatuagem está falando de quase 40 anos atrás e, nesse tempo, o que foi feito? As discussões já estavam se definindo ali, estavam indo para algum lugar. Mas a gente caiu em uma esculhambação conservadora tão grande..."

Segundo Lacerda, embora o roteiro tenha como inspiração o Vivencial Diversiones para a criação do Chão de Estrelas, a história é toda fictícia. O cineasta conta que já tinha em mente desenvolver uma narrativa na qual houvesse um processo de construção do futuro, a partir de um momento importante na história do país, que aponta para uma mudança, para um futuro promissor, como o esgotamento do processo de militarização do Brasil e a possibilidade de construção de um país novo, sem censura e repressão moral. Essa promessa, vista com olhos de hoje, ganha um sabor de desilusão, como se esse sonho de liberdade tivesse cedido lugar a uma sociedade cada vez mais conservadora e retrógrada, segundo Lacerda.

Tatuagem, apesar de ser político em sua essência, não advoga em nome do embate direto. A guerrilha se dá em outro palco: o do humor, da irreverência e da provocação, sobretudo, diz Lacerda, por meio do uso do corpo físico, da nudez, da liberdade afetiva e sexual.

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O diretor, no entanto, refuta a ideia de que o filme busque chocar por meio das cenas de sexo. "O que causa mais desconforto é a afetividade entre Clécio e Fininha. As pessoas têm mais dificuldade em lidar com a possibilidade de amor entre dois homens, do que com a ideia do sexo."