Para Jürgen Berger, o argumento é o ponto central da crítica.| Foto: Divulgação

Me smo na Alemanha, onde grande parte da população lê muito, os veículos de comunicação passam por uma profunda mudança. Mas se engana quem pensa que lá eles têm respostas melhores. Para o jornalista Jürgen Berger, “ninguém realmente sabe como custear o jornalismo profissional na internet”. A área em que ele atua é ainda mais restrita: a crítica teatral.

CARREGANDO :)

Mas iniciativas como portais nacionais têm ajudado a angariar leitores e credibilidade. Também no Brasil, orientados por ele e apoiados pelo Instituto Goethe, um grupo de críticos lança o portal Agora Crítica Teatral para atuar em rede. A Gazeta do Povo é um dos veículos apoiadores. Saiba um pouco do que foi discutido nos cinco dias de oficina realizada em Porto Alegre:

Publicidade

Num momento de transformação dos veículos, como fica o papel da crítica de arte, de teatro especificamente?

A posição do crítico de teatro nos jornais da Alemanha é frágil, porque custa muito. Você não pode assistir somente às peças da sua cidade, precisa ter a possibilidade de compará-las com o que é feito ao redor do país, por diferentes diretores. Por outro lado, recebemos o trabalho de muitos diretores nas nossas cidades graças ao sistema de teatros públicos. Mas você também precisa frequentar grandes festivais. No passado, era comum ter a viagem custeada, mas agora isso está ficando mais raro. Ao mesmo tempo, desenvolvemos plataformas na internet para criar a crítica.

Versão de “Medeamaterial”, de Heiner Müller, foi um dos espetáculos acompanhados por grupo de críticos que integra o portal. 

E existe público para ela?

Sim, já temos duas ou três plataformas. A mais conhecida é Nacht Critik [“crítica noturna”], em que os críticos precisam entregar o texto até as 6 horas da manhã após acompanhar uma estreia. É ambicioso, porque na mídia impressa os textos saem só no dia seguinte. O problema é que o trabalho de edição na mídia impressa não é tão profissional, você tem escritores profissionais e não profissionais. Com muita descrição, não uma crítica verdadeira.

Publicidade

No Brasil vê-se uma vertente que determina o que é bom ou ruim, e outra que traz uma reflexão sobre a cena.

É uma questão do gênero. Se você fala em crítica, precisa ter uma opinião própria, e escrever o que pensa. “Ser bonzinho” não é uma categoria, e sim ser verdadeiro e honesto. Preparar-se para não apenas dizer “gosto” ou “não gosto”, mas argumentar. É o ponto central da crítica. Argumentar por que gosta ou não de algo. A opinião é sempre subjetiva, mas o ponto é escrever sobre ela de forma que o leitor perceba qual é essa opinião, com argumentos. Para o artista, não é bom que o crítico seja “bonzinho”, porque no teatro as pessoas já são legais umas com as outras. Se beijam e dizem “Estávamos ótimos!” Por que o crítico faria o mesmo?

E como é o relacionamento com os artistas?

Na Alemanha, na Suíça e na Áustria, mas não na França, existe uma longa tradição de crítica. Elas são duras, mas sempre mantemos o respeito uns pelos outros. E temos a tradição de conversar depois – às vezes a discussão é muito pesada. Por exemplo, um diretor pode me dizer “tenho a impressão de que você não entende o que eu estou fazendo”. Então eu posso pedir “então me conte o que eu não vi no palco”.

E quando são amigos?

Publicidade

É um ponto importante, é preciso ser honesto com essa questão. Por vezes até deixar de escrever sobre um espetáculo.

Portal

Leia críticas de espetáculos de todo o país no site Agora Crítica Teatral.

Ficou a curiosidade: como é na França?

Talvez como no Brasil. Escreve-se muitas matérias descritivas antes da estreia. A crítica que vem depois é muito diferente da nossa, quase como uma descrição e explicação do background da peça e do diretor. Com frequência não se fala do que aconteceu no palco, qual era a ideia do diretor para a peça, se trouxe novas ideias.

Alguns diretores encantaram a Alemanha, como o norte-americano Robert Wilson. Por que esse tipo de teatro encontrou ressonância lá?

Publicidade

Bob Wilson desenvolveu uma forma muito especial de teatro, que funciona com imagens fantásticas no palco, na linguagem do gesto, não da emoção, com influência do teatro japonês. Foi muito importante para a Alemanha ver isso. Por exemplo, ele pegou textos de Georg Büchner, como “Leôncio e Lena”, muito difíceis, mas conseguiu realizar. Você assiste e diz “a, isso é ‘Leôncio e Lena’”. Então a Alemanha aprovou a inovação.