Ao lado do diretor Marcio Abreu, o ator Guilherme Weber, curitibano, foi responsável pela seleção de peças do próximo Festival de Teatro, que começa dia 23 de março. Em conversa por telefone com a Gazeta, ele conta que o Festival buscou peças que pensam o Brasil. Também há algumas mais “anárquicas” e outras cujo radicalismo poderá ser incômodo.
Como vocês selecionaram as peças deste Festival?
Quando começamos a nos reunir, pensamos qual mudança poderia ser feita num festival que há 25 anos se estabeleceu com uma característica de trazer o novo. E ambos estávamos vindo de projetos que pensam o Brasil [“Puzzle” e “Projeto Brasil”]. Surgiu então essa reunião de coisas radicalmente opostas, sem nos preocupar com novidade. Por exemplo, a peça da Denise Stoklos, “Vozes dissonantes”, é de 15 anos atrás e já veio a Curitiba, mas faz uma reflexão das vozes rebeldes brasileiras. São questões que precisam ser pensadas sempre. Por exemplo “Cidade vodu”, em cartaz em São Paulo, fala de questões raciais, imigração, dos haitianos. Curitiba precisa pensar isso dentro da cidade.
Outro vetor de pensamento foi incluir o máximo possível a cidade de Curitiba. Por isso, vários eventos paralelos acontecerão na sede de companhias locais, para aumentar o intercâmbio. Além de produções próprias como “Iliadahomero” e “Nuon”, várias performances usam moradores como participantes (“Batucada, “Orgia” e “Cidade vodu”).
Vocês continuarão na curadoria nos próximos anos?
Falamos em três anos de curadoria porque ela precisa mudar, ser arejada, senão o pensamento se esgota. Em todos os festivais do mundo a curadoria muda. A curadoria antiga fez formação de plateia e reuniu espetáculos dos mais importantes.
Com essa grade arejada, acredita que o Festival de Curitiba volta a ter relevância nacional?
O mundo mudou. Quando o Festival se formou, era o único grande evento da cidade, e o mundo era difícil de ser abraçado. Hoje existem vários acontecendo pelo país. A relevância vem de um pensamento novo que difere de outros festivais, não por ser melhor ou pior, mas tendo um pensamento próprio. Claro que Curitiba já tem uma importância gigante só pelo tamanho do Fringe.
Você gosta do formato do Fringe, sem curadoria?
Sou defensor do Fringe, acho democrático e que ele estimula o mercado. Se tivesse curadoria não iria se diferenciar da Mostra. O que precisa sim é criar o olhar cuidadoso do espectador. O Fringe tem uma função que é revelar companhias que ninguém conhece. Temos que organizar grupos de pensadores críticos que possam mapear o Fringe para devolver depois para a cidade e o Brasil quais foram as surpresas.
A grade agradou a crítica. Como está sendo a resposta do público em geral?
Procuramos um equilíbrio entre espetáculos com curadoria e outros convidados, mesmo que não entrem nesse pensamento sobre o Brasil. Por exemplo, “Portátil” não está inserido nesse pensamento, mas é anárquico, com comediantes de ponta e cumpre a função de comunicação imediata com o público. Sinto que a programação tem um aspecto bem amplo. Mas o público médio poderá cair em algum espetáculo e estranhar bastante a linguagem radical. Por exemplo, a performance “Confete da Índia” é incômoda, violenta. Mas a ideia é fazer formação de plateia em todos os níveis.
Sobre sua carreira como ator e diretor: o que você guarda de sua formação em Curitiba?
Curitiba é minha cidade, mesmo morando no Rio. Não a vejo como distante, e sim presente. Curitiba me deu parceiros de trabalho, a possibilidade de formar e moldar um tipo de humor e de originalidade, a partir de artistas que me influenciaram. Não se cresce impune entre Paulo Leminski, Marcos Prado, Beijo aa Força, Dalton, ícones que formaram meu pensamento como artista. Todo o alicerce do meu repertório vem de Curitiba. Inclusive o Marcos Prado foi fundamental no pensamento dessa curadoria, porque ele continuou um poema de Gregório de Matos que diz “Onde quer eu vá tem um Brasil / que quer o Brasil que me persegue”. E a Mostra tem vários performers que moram fora e pensam o Brasil a partir desse olhar distante. A gente sempre vai pensar no Brasil, onde estiver.
Você acaba de estrear “A tragédia latino- americana”, com Felipe Hirsch, em São Paulo. O que mudou no método de trabalho de vocês desde o início em Curitiba?
O espetáculo é aberto, parecido com “Puzzle”, mais livre no sentido de pensar a América Latina a partir da literatura, não só “questões” da América Latina. Tem a característica de um organismo vivo, fragmentado.
Você também está nos cinemas em “Meu amigo hindu”. Como foi trabalhar com o protagonista Willem Defoe?
Ele é um grande ator, ponto; não por ser norte-americano. E é um grande colega. Essas características fazem com que ele se irmane com os outros atores, com humildade, profundamente ligado ao senso coletivo – até porque o tipo de cinema em que ele trabalha é esse.
Você gosta de fazer cinema?
Gosto muito. Acabo de dirigir o longa “Deserto” [com Lima Duarte], que estreia no fim do ano.
Você também dirigiu a peça “Os realistas”, no Rio. Quando ela vem a Curitiba?
No segundo semestre vai com certeza.
É seu sexto trabalho com uma peça de Will Eno. Como você acha que ele traduz o mundo contemporâneo?
Pela imensa confusão que é viver no mundo hoje. Ele é um parceiro, não só um dramaturgo que eu adapto. A gente conversa, e ele é um cara bastante habilidoso na relação com a estética... consegue usar a linguagem e traduzir sensorialmente a grande dificuldade de se administrar as emoções no mundo contemporâneo.
Você faz ainda a série “O negócio”, no HBO. Quando ela volta?
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