Se você digitar o nome de Clarice Lispector no Google Imagens, a foto acima irá aparecer em meio a inúmeras outras da escritora com “olhos de ressaca”, tais quais os de Capitu. Engana, não? Pois essa é a atriz carioca Rita Elmôr em divulgação de seu monólogo “Que Mistérios tem Clarice”, de 1998.
A semelhança obtida entre as artistas logrou vários editores de cultura pelo mundo, que acabaram estampando matérias e até uma capa de revista com essa imagem para falar da biografia definitiva lançada por Benjamin Moser (no Brasil, saiu em 2011).
A experiência mexeu com Rita, que se pôs a refletir sobre o que tinha de Clarice em si mesma. Ainda mais quando foi convidada a retornar com o espetáculo e percebeu que ele já não afinava com ela, 17 anos depois.
“Aquela foi uma fase mais triste, solitária, melancólica. Pensei ‘tenho que fazer uma peça nova’”, contou a atriz à Gazeta do Povo, que apresenta neste domingo, no Teatro Bom Jesus, o espetáculo “Clarice e Eu. O Mundo Não É Chato”.
“Comecei a aproximar ela de mim no meu novo momento.” E essa outra realidade tinha mais relação com textos bem-humorados de Clarice, em que a escritora “não estava deprimida”, nas palavras de Rita.
São escritos extraídos de crônicas, contos, cartas e trechos de livros da ucraniana-brasileira que falam de diversos assuntos, num total de quase 40 textos.
PROGRAME-SE
Teatro Bom Jesus (R. Vinte e Quatro de Maio, 135), (41) 2105-4000. Dia 7, às 21h, e 8, às 20h. R$86 e R$46 (meia). Classificação indicativa não informada.
Conforme a atriz, a peça revela um olhar crítico de Clarice que a aproxima mesmo de quem não gosta de ler – ainda. Outra diferença em relação ao solo de 1998 é que, naquela primeira iniciativa, havia dados biográficos da escritora que agora foram suprimidos.
No lugar, entra um tecido de relações com a própria atriz, seguindo uma tendência atual de misturar vida, ficção e personagens históricos a bel prazer. O ponto de partida é a experiência de Rita de ser confundida com Clarice.
“DAS VANTAGENS DE SER BOBO”
Veja alguns escritos de Clarice que serviram de base para o monólogo de Rita Elmôr:
Leia a matéria completaSutilmente entram então textos da escritora, e, em meio a eles, a atriz tece comentários que acabam se confundindo com o conteúdo literário. “Tomei cuidado para não empobrecer a dramaturgia, esse alinhavo é muito delicado”, explica. Em sua leitura, a escrita de Clarice selecionada para a peça soa extremamente atual. “Na verdade, estou me utilizando da Clarice para falar tudo que eu gostaria nesse momento”, diz Rita. “Ela me dá voz.”
Depois de partilhar a experiência de confusão de identidades, a atriz aborda a necessidade de solidão de Clarice, e um dos assuntos favoritos da escritora: seus filhos e as coisas incríveis que diziam. O próprio título do espetáculo – “o mundo não é chato” – foi tirado de uma fala de Paulinho, o Paulo Gurgel Valente, caçula dos dois irmãos. O tema comum a toda a peça é a ideia de desencaixe, resume Rita: a sensação de nunca se estar confortável no mundo. E a arma de Clarice para lidar com a situação era... o humor.
A estreia nacional do espetáculo aconteceu neste sábado, em Curitiba, por um acaso de produção.
Deixe sua opinião