O próprio humorista foi citado na operação porque um escritório de advocacia usou recursos da Lei Rouanet para contratar um show dele.| Foto: /Divulgação

Testemunha da Operação Boca Livre, Katia dos Santos Piauy, auxiliar administrativa e financeira do grupo Bellini Cultural em 2014, apontou fraudes praticadas pelo conglomerado investigado pelo desvio de R$ 180 milhões em projetos da Lei Rouanet.

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O depoimento foi dado à Polícia Federal em 30 de junho, dois dias após da deflagração da Operação Boca Livre. Nele, Piauy cita, entre as fraudes, a falsificação de recibos de doação de livros produzidos por meio de isenção fiscal. Para forjar os documentos, segundo ela, o grupo teria a ajuda da Academia Latino-Americana de Artes (ALA), dirigida pelo empresário Fábio Porchat, pai do humorista do Porta dos Fundos.

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Entre os conselheiros da associação está Antônio Carlos Bellini, presidente do grupo Bellini. As informações foram divulgadas nesta terça (12) pelo jornal O Estado de S. Paulo.

Piauy, que fez três projetos culturais e captou R$ 647,6 mil, afirma no texto da PF que “tinha conhecimento que Bellini, por possuir muitos contatos no meio artístico e cultural, conseguiria tais comprovantes”. Entre elas estaria a ALA, que “fornecia a Bellini essas declarações falsas de que teria recebido livros”.

Livros abandonados

Quanto aos livros que deveriam ser doados, Piauy disse que “tem conhecimento de que um grande número de exemplares encontravam-se abandonados na sede do escritório das empresas (Avenida Giovani Gronchi, no bairro do Morumbi, em São Paulo) e na Fazenda (São João da Boa Vista, interior paulista)”.

Ela relata, ainda, que a Bellini superfaturava valores de serviços gráficos de livros. De acordo com o depoimento, “o grupo Bellini se utilizava sempre da gráfica Mazer” e Felipe Vaz Amorim, filho de Antonio Carlos Bellini Amorim, presidente do Grupo Bellini Cultural, “não concordava com a utilização de outras gráficas ainda que com custos menores”.

À PF, Piauy afirmou ainda que, entre as supostas fraudes do grupo, estavam contrapartidas dadas às empresas patrocinadoras.

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Procurada pela reportagem, Piauy disse que não quer falar sobre o depoimento. A reportagem também procurou um representante da Mazer, mas, por meio de sua assessoria, a gráfica alegou que não sabia do depoimento e, por isso, não tinha o que comentar.

Fábio Porchat também foi procurado pela reportagem até o início da noite de terça-feira. Atendeu à ligação em uma das vezes e afirmou que retornaria o contato em breve, o que não ocorreu.

Humorista também foi citado

Seu filho também foi citado nas investigações da Boca Livre. Segundo o Ministério Público Federal, o escritório de advocacia Demarest usou recursos da Lei Rouanet na contratação do humorista para um show privado - algo vetado pela mecanismo de isenção fiscal - em comemoração aos 68 anos de fundação da sociedade jurídica. Para tanto, teria contratado o Grupo Bellini Cultural, que comandava o esquema segundo a Polícia Federal.

Na ocasião, Fábio Porchat, filho, afirmou à reportagem que é impossível saber a origem dos recursos de seus contratantes.

No início das investigações da Boca Livre, o humorista opinou que a lei precisava ser entendida pela maioria das pessoas. “Acho que a Lei Rouanet precisa ser mexida, precisa ser discutida, precisa ser debatida. É uma coisa que os artistas já vêm falando há muito tempo. A questão é que, quando entra para um debate popular, a maioria das pessoas não faz nem ideia de como funciona a lei. Acha que o governo dá o dinheiro na mão do cara, que o Tony Ramos pegou R$ 6 milhões para ele e foi embora. [A cultura no Brasil vem sendo] criminalizada principalmente pelas igrejas evangélicas que não pagam imposto”.

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O caso

Formado por 12 empresas, o grupo Bellini Cultural é acusado de operar um esquema de fraudes em leis de financiamento cultural investigado pelo Ministério Público Federal e pela PF.

A Operação Boca Livre estima que a Bellini tenha desviado, desde 2001, R$ 180 milhões em esfera federal por meio de notas frias, superfaturamento, sonegação e contratação de serviços e produtos fictícios.

Em vez de financiar os eventos discriminados nos projetos aprovados pelo Ministério da Cultura (MinC), os recursos acabaram bancando shows corporativos, como da banda Jota Quest, e até a festa de casamento de Felipe Amorim, em Jurerê.

A força-tarefa foi deflagrada em 28 de junho, quando 14 suspeitos foram presos. Na sexta (8), contudo, Antonio Carlos Bellini e seus filhos, Felipe e Bruno Vaz Amorim, tiveram o pedido de habeas corpus atendido pela Justiça.

Segundo decisão do desembargador Nino Toldo, a soltura dos três não prejudica as investigações, que acontecem desde 2014 “sem qualquer interferência durante dois anos”. Além disso, os projetos vinculados aos Bellini no MinC, assim como suas contas bancárias que, ainda segundo o texto, não possuem saldo.

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Procurados na noite desta terça (12), os advogados que representam os suspeitos não atenderam às ligações da reportagem.