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Paulo Venturelli, professor adjunto da Universidade Federal do Paraná e doutor em Literatura Brasileira pela Universidade de São Paulo | Albari Rosa/ Gazeta do Povo
Paulo Venturelli, professor adjunto da Universidade Federal do Paraná e doutor em Literatura Brasileira pela Universidade de São Paulo| Foto: Albari Rosa/ Gazeta do Povo

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Você defende com paixão e com muitos fundamentos o realismo na literatura. Não há aí o perigo de a literatura aproximar-se do jornalismo, ou esta é mais uma voz que a literatura incorpora?

Do ponto de vista da linguagem, prosa de ficção e jornalismo têm muitos pontos em comum; há mesmo uma certa tradição de identificar "reportagem" com "história", ou "estória" mesmo, como narrativa. A prosa de ficção se apropria de todas as linguagens, mas sem se confundir com elas, porque a intencionalidade é totalmente diferente. Vai um exemplo maravilhoso: A Guerra das Salamandras, do tcheco Karel Capek (1890-1938), é um livro escrito em forma de reportagem de jornal – toda a técnica jornalística está presente. E, no entanto, a narrativa é inteira fantástica, contando como as salamandras saíram do mar e tomaram conta da Terra, o que era uma alegoria do nazismo. A minha defesa do realismo não é, de modo algum, excludente. Capek usa técnicas realistas, assim como [Franz] Kafka (1883-1924), para contar suas histórias.

Você "repudia" a prosa poética e chega perto de dizer que isto é uma praga na literatura atual (você afirma abandonar um livro que está lendo quando há este gênero). Isto quer dizer que nada se salva em nossa literatura atual? Que autores escapam desta "armadilha"?

Vamos recolocar as questões para torná-las mais claras. Não faço referência à "literatura atual". O Espírito da Prosa é um livro que retoma a minha formação literária, a partir da virada social, política, cultural e literária dos anos 1960 e 1970. Naquele momento, houve uma implosão da tradição prosaica e uma hipertrofia do discurso poético, pela via da universidade – e também porque a centralização poético-utópica era o discurso do tempo. No Brasil, isso significou uma pulverização da prosa romanesca que perdeu significativamente espaço nas décadas seguintes, até os anos 1990. De 20 anos para cá, com uma geração que não viveu mais os respingos dos anos 1960, a prosa renasce no Brasil com muita força. Não há "armadilha" nenhuma – literatura e História andam juntas; pensar uma é pensar a outra. O que eu digo no meu livro é que, sob o ideário poético totalizante, a prosa perdeu força. E, com ela, a ética do realismo. O que também é outra história.

Como seu fundamento é Bakhtin e para Bakhtin a língua é sempre ideológica porque apresenta um ponto de vista sobre o mundo, como fica a questão da ideologia numa obra de ficção?

Você fez uma pergunta muito difícil, porque a palavra "ideologia" não é teoricamente transparente. Bakhtin – ao contrário de outros pensadores de seu círculo, como [Valentin] Voloshinov (1895-1936) e [Roy] Medvedev – não foi um marxista; o ideológico para ele não era o clássico "mascaramento do real" do marxismo ortodoxo, mas o ideário, ou o conjunto de valores que necessariamente entram em jogo na produção de sentido. Toda obra de ficção é, assim, "ideológica", na medida em que suas vozes expressam valores complexos, e não unicamente didáticos, políticos ou redutores.

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