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Se você gosta de livros, em algum momento, topa os americanos. Se lê a ficção dos EUA, com certeza, ouviu falar de The New Yorker. A revista representa a "torá" da literatura produzida no país da fast-food. Diria "bíblia" não fosse Nova Iorque uma cidade com uma influência judaica tão forte. O que sai em suas páginas tem chances de virar lei para ambos editores e leitores. E publicar contos não é só o que faz. Sua faceta jornalística é referência planetária. Uma amostra: as torturas sofridas por iraquianos na prisão de Abu Ghraib foi revelada por Seymour M. Hersh, correspondente da revista no Oriente Médio.

Ela dá também espaço a eventos culturais, critica filmes, discos, peças e exposições. E há os cartuns. The New Yorker é famosa por seu humor nem sempre inteligível – o que rendeu um episódio do seriado Seinfeld. No dia 21 de fevereiro passado, a publicação nova-iorquina completou 80 anos de existência e, para marcar a data, lançou uma caixa de oito DVD-roms reunindo todas as 4.109 edições. No Brasil, seu poder de fogo fica evidente nas prateleiras das livrarias. Impressiona o número de autores publicados – às vezes, descobertos – pela The New Yorker com títulos lançados no país.

Apenas nos últimos três meses, a Companhia das Letras lançou Bonequinha de Luxo, de Truman Capote, Busca o Meu Rosto, de John Updike, Filme, de Lilian Ross, e Breves Entrevistas com Homens Hediondos, de David Foster Wallace. A Ediouro, saiu com Fome de Paris, de A. J. Liebling, e a Rocco, com Tudo Se Ilumina, de Jonathan Safran Foer. Todos escritores que passaram pela The New Yorker. No caso Wallace, Ross e Liebling, os livros citados foram publicados antes pela revista.

Jornalismo literário

A influência exercida pelo quase-semanário – são 46 edições por ano –, é tamanha que daria para preencher o espaço desta matéria, daqui até o ponto final, só com nomes e sobrenomes de colaboradores importantes (confira o quadro com alguns dos mais conhecidos). Já a lista daqueles que tiveram seus textos recusados pela revista encheria mais de uma página.

Berço do jornalismo literário (new journalism), a revista publicou reportagens históricas. A mais importante talvez tenha sido Hiroshima, de John Hersey, que ocupou uma edição inteira em 31 de agosto de 1946, revelando os horrores da bomba que botou fim à Segunda Guerra Mundial. Mais tarde, o trabalho virou livro e Hersey voltou ao Japão nos anos 80 para ver como viviam as pessoas afetadas pela bomba.

É de momentos assim que a lenda em torno da The New Yorker se construiu. Truman Capote, um de seus colaboradores mais célebres é tema de uma cinebiografia estrelada por Philip Seymour Hoffman e intitulada apenas Capote. Sua fama como romancista começou e terminou com Bonequinha de Luxo, transformado em clássico do cinema com Audrey Hepburn. Na condição de jornalista, sua obra-prima foi A Sangue Frio, publicada em quatro partes ao longo de 1965. A matéria desvendou os fatos ligados ao assassinato da família Clutter, do Kansas, pela dupla Perry Smith e Dick Hikcock. Hiroshima e A Sangue Frio fazem parte da coleção Jornalismo Literário, da Companhia das Letras, que lançou ainda O Segredo de Joe Gould, de Joseph Mitchell, escritor que se tornou lenda pela demora com que produzia seus textos e, nos últimos 20 anos de carreira, por sua nulidade completa – nunca mais publicou coisa alguma, embora freqüentasse a redação diariamente, fazendo não se sabe o quê para justificar seu salário.

Além de escritores e jornalistas, a The New Yorker revelou muitos desenhistas. Art Spiegelman (Maus), um dos mais incensados, foi responsável por criar uma das capas mais importantes da publicação. A que circulou na semana seguinte ao 11 de Setembro. À primeira vista, parece só uma capa inteira preta. Porém, um olhar atento revela a imagem das torres do World Trade Center ainda de pé. O efeito fantasmagórico – reproduzido na capa do livro À Sombra das Torres Ausentes, de Spiegelman – é resultado da impressão em preto (mais intenso) sobre fundo preto. Uma solução genial.

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