| Foto: Ilustração : Osvalter Urbinati

Neste ano, pela primeira vez, a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) fará as malas, repletas de livros brasileiros, repletas de cultura brasileira, e atravessará o oceano para desembarcar na Inglaterra. Tornando-se FlipSide, em versão europeia. Filha de nossa maior manifestação literária, a FlipSide acontecerá no complexo artístico Snape Maltings, a 100 milhas de Londres, entre os dias 4 e 6 de outubro.

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Manifestação literária?

Exatamente. A Flip não se posiciona como um evento literário – mas como forma de manifestação cultural. Ou então "um esforço de fazer a conexão entre o plano das manifestações culturais e das instituições." Foi esse o conceito defendido por Mauro Munhoz, arquiteto e diretor-geral da Casa Azul, em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo.

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Mauro Munhoz recebeu-me em São Paulo, no Museu do Futebol, projetado por ele, que chama a atenção pela expressiva linguagem arquitetônica. Ao cruzar a porta de entrada, fisicamente imerso naquela expressão autêntica, lembrei-me das tendas da Flip. Dos autores, do telão – também marcantes e também projetados por Munhoz. Perguntei-lhe: haverá, na FlipSide, a arquitetura característica das tendas?

"Não." Porque Snape Maltings tem uma estrutura permanente; com auditórios, adequada para receber concertos, óperas, palestras. Iniciativa de Benjamin Britten (grande compositor inglês, que viveu entre 1913 e 1976) e Peter Pears (cantor inglês, 1910-1986), o complexo artístico, localizado no vilarejo Snape, era uma antiga fábrica de cerveja. Por isso Maltings, relacionado ao malte da cerveja.

A fábrica foi restaurada – com intervenções de concreto – para se converter em um espaço destinado a educar e apoiar jovens músicos, difundindo música erudita. Mesmo após o falecimento de Britten e Pears, Snape Maltings continua ativo. Liz Calder, presidente do conselho diretor da Flip, mora nas proximidades do espaço e decidiu aproveitá-lo.

Vinicius de Moraes será homenageado. O show de abertura, intitulado The boys from Ipanema, ficará por conta do trio José Miguel Wisnik, Arthur Nestrovski e Paula Morelenbaum, que interpretará canções de Tom Jobim e Vinicius. Seguindo no universo musical, a FlipSide contará com a apresentação Just Adriana, de Adriana Calcanhotto, e rodas de capoeira.

Além de música, exposições, degustações de feijoada, cachaça, caipirinha; e não nos esqueçamos do principal: mesas de encontros e debates literários. Milton Hatoum, por exemplo, conversará com Ian McEwan; Bernardo Carvalho, com Will Self. Hatoum (autor de Cinzas do Norte) e Carvalho (Nove Noites) estão entre os melhores escritores brasileiros vivos; ao passo que Ian McEwan (Reparação) e Will Self (O Livro de Dave), entre os melhores escritores ingleses.

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Serão momentos de alto nível, importantes para a literatura mundial.

E, quem sabe, para o desenvolvimento de ideias sobre a relação entre arte e público. De acordo com Mauro Munhoz, "a Flip nasceu a partir de necessidades da literatura e de necessidades da arquitetura. Quando surgiu, os eventos literários eram promovidos pelo mercado editorial – ao passo que a Flip sempre foi promovida por pessoas que produzem literatura e arquitetura."

Um processo endógeno.

Munhoz comenta que a Festa Literária ainda dinamizou a economia de Paraty, criando alternativas de renda e empregos para a população local. "A Flip articulou a vida dos paratienses com o meio literário brasileiro. Se desejamos preservar – e preservar, inclusive, a cultura – é preciso transformar. Tal qual a intervenção de concreto na restauração da fábrica de cerveja."

Preservação e transformação. A fábrica não deixou de ter suas particularidades – vitorianas, do século 19 – para se converter em complexo artístico. Munhoz afirma que, assim como Snape Maltings, o ideal seria que a Flip dispusesse de uma estrutura permanente. Uma estrutura para abrigar diversas manifestações culturais. Diversas trocas de informação. E completa: "A literatura é um espaço público – uma praça que muitas pessoas habitam".

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