Fernando Bezerra vive Expedito, um homem que reaprende a ver o mundo ao caminhar pelo Rio de Janeiro| Foto: Divulgação

Se for para apontar o melhor filme brasileiro exibido em Curitiba neste ano, o processo de escolha não consumirá muito tempo. Transeunte, primeiro longa-metragem de ficção do diretor carioca Eryk Rocha que estreia nesta sexta-feira no Unibanco Crystal, tem vários méritos para merecer esse título. Aos 30 anos, o filho do cineasta Glauber Rocha (1939-1981) conseguiu realizar uma obra ao mesmo tempo ousada do ponto de vista estético e tocante.

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A trama gira em torno de Expedito, um aposentado viúvo de 65 anos, que não tem ninguém, nem filhos nem amigos. Ele parece um espectro, a sombra de um ser humano. Seus atos são mecânicos. Os olhos, desprovidos de expressão, vagam pelo mundo que o cerca, à procura não se sabe bem do quê.

Talvez por conta dessa aparente indiferença a tudo, que o desempenho do ator principal, Fernando Bezerra, impressione tanto. Ao ponto de, quem não o conhece, suspeitar que ele seja um amador, mas não é esse o caso. Bezerra é ator experiente.

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Quem for assistir a Transeunte, tem de estar preparado para en­­­frentar uma experiência cinematográfica incomum, original. Não é um filme hermético, complicado do ponto de vista narrativo. Pelo contrário. É tão direto que, em alguns momentos, faz pensar na linguagem documental. Há características, contudo, que o distinguem do que se vê habitualmente nas telas. Para contar a história de Expedito, Eryk recorre a uma economia total de diálogos e a muitos closes. Faz questão de que o espectador conheça cada ruga, cada vinco no rosto dele.

Engana-se, entretanto, quem, pela sinopse de Transeunte, acredita tratar-se de uma obra deprimente, pessimista. Pelo contrário: fala do emocionante processo de renascimento de um sujeito sem esperanças, cuja existência parece ter chegado ao fim após a morte da esposa, mas que, muito aos poucos, redescobre razões para tocar a vida.

Um dos pontos altos de Transeunte é sua bela direção de fotografia em preto e branco, de Miguel Vassy. A opção lhe dá um tom intimista, reforçado pelo já citado uso dos closes e pelas muitas cenas noturnas – Expedito, afinal, é um notívago, um lobo da madrugada. Essa decisão estética se mostra ainda mais pertinente se levarmos em conta que, além de Expedito, o outro grande personagem do filme é o Rio de Janeiro, com seus sons, homens, mulheres, trânsito caótico, becos, ruas e botecos. GGGG