O fotógrafo - Ohara criou obra "em silêncio"
A vida de Haruo Ohara não rende um filme. "Ele era um homem zen, amava a família, não tinha conflitos", conta Rodrigo Grota. Mesmo assim, o cineasta dedicou a última parte de sua Trilogia do Esquecimento ao fotógrafo japonês, que chegou em Londrina com a família em 1933 para trabalhar na lavoura.
Péssimo personagem, é verdade, mas com uma obra excepcional. Entre 1934 e 1999 ele produziu mais de 20 mil fotografias que se tornaram uma referência estética e histórica para a memória visual da cidade.
O camponês, que não gostava de ser chamado de fotógrafo, registrou a vida no campo, a cidade de Londrina, a família e, com a mudança para o centro da cidade, nos anos 50, imagens abstratas resultantes de um diálogo mais intenso com outros fotógrafos e cineclubes brasileiros. "Ele criou uma obra em silêncio", diz Grota.
Avesso à exposições, o público só teria acesso a uma retrospectiva de Ohara em 1998, realizada pelo Festival Internacional de Londrina (Filo, de teatro). O acervo da família foi comprada pelo Instituto Moreira Salles, em 2008.
Kinoarte produz filmes e faz eventos culturais
Desde que foi criado, em 2003, o Kinoarte Instituto de Cinema e Vídeo de Londrina já produziu mais de 20 curtas-metragens, quatro deles em película, e o média-metragem Inimigo Público Número 1 (2005), de Rodrigo Grota, sobre o músico londrinense Arrigo Barnabé, somando quase 30 prêmios em festivais nacionais e internacionais.
O cineasta Rodrigo Grota, 30 anos, não é de Londrina. É paulista de Marília, a 200 quilômetros dali, mas os dez anos que viveu na cidade, onde foi estudar Comunicação Social na Universidade Estadual de Londrina (UEL), acabaram tornando-o mais londrinense do que muitos "pé-vermelhos".
Grota sempre quis estudar Cinema, mas o pai recomendou-lhe algo mais "rentável". A "desformação" em Jornalismo, conta em tom de brincadeira séria, permitiu-lhe adentrar indiretamente na sétima arte, escrevendo críticas para a imprensa local. Em 2002, uma demissão decorrente de uma experiência frustrante como repórter de política, levou-o enfim a se dedicar ao cinema.
Em 2003, ao participar de uma oficina de Super 8 na Mostra Londrina de Cinema a mais antiga do Paraná, que completa 12 anos em 2010 , acabou conhecendo um grupo com quem criaria o Instituto de Cinema e Vídeo Kinoarte, que desde então tem proporcionado uma movimentação em torno do cinema sem equivalente na capital do estado.
No Kinoarte, Grota daria início a uma prestigiada trajetória como curta-metragista. Ao todo, já dirigiu seis. Os primeiros foram Londrina em Três Movimentos, Inimigo Público Número 1 e O Quinto Postulado. Os três últimos formam a Trilogia do Esquecimento, sobre três personagens estrangeiros da música, da fotografia e da poesia presentes na mítica Londrina dos anos 50: Satori Uso, Booker Pittman e Haruo Ohara.
"São filmes de ficção, mas foram construídos com abordagem totalmente documental. Isso causa uma confusão saudável no público", diz Grota. Quando lançou Satori Uso, em 2007, teve quem lhe dissesse que conheceu pessoalmente o poeta japonês que nomeia o filme. O fato é que ele nunca existiu. O personagem que teria passado por Londrina na década de 60 é, na verdade, uma invenção de Rodrigo Garcia Lopes este, sim, verdadeiro poeta londrinense.
Logo depois, Grota leu uma notícia de jornal sobre a passagem por Londrina de Booker Pittman, um reconhecido jazzista norte-americano que, nos anos 50, tocou ao lado de Count Basie e Louis Armstrong. Encontrar esse grande músico de trajetória errática, com passagens obscuras pelo interior do Paraná, levaria o jovem cineasta à criação da trilogia que incluiria, por último, o fotógrafo japonês Haruo Ohara.
Se o fictício Satori Uso era familiar a muita gente, houve quem achasse que Booker Pittman era uma criação de Grota para tratar de uma efervescente Londrina dos anos 50. Os dois personagens, no entanto, guardam dentro de si um terceiro indivíduo: Haruo Ohara. Suas mais de 20 mil imagens povoam a memória visual do londrinense e inspiraram a fotografia da trilogia feita pelo carioca Carlos Ebert (O Bandido da Luz Vermelha), que recentemente fotografou o longa-metragem curitibano Circular, dos diretores Alysson Muritiba, Adriano Esturilho, Bruno de Oliveira, Fábio Allon e Diego Florentino, em processo de pós-produção.
O filme sobre Haruo Ohara fará parte da mostra competitiva do 38.º Festival de Cinema de Gramado, que começa no próximo dia 6, com boas chances de sair premiado, a julgar pelos Kikitos de seus companheiros de trilogia Satori Uso levou dois, em 2007, e Booker Pittman, três.
O personagem foi deixado por último por ser, para Grota, o mais difícil. "Sabíamos que a fotografia do filme não poderia ser melhor do que as próprias fotos de Ohara, então, fizemos uma espécie de homenagem. O intuito não é ser biográfico, mas mostrar como se dava seu processo criativo, o que se passava em sua mente", conta Grota.
Cidade mítica
Essa forma de elaboração segue a linha dos outros curtas, em que interessa mais revelar o interior do personagem do que contar sua história. A própria cidade é apresentada, nos três filmes, de uma maneira aparentemente irreal. "É uma Londrina estilizada, quase mítica", conta Grota. Aquela do imaginário do próprio diretor, que mergulhou fundo na história, fascinado pelas suas contradições e diversidade.
A Trilogia do Esquecimento será reunida em DVD, com previsão de lançamento em dezembro, contendo os três filmes, making of e cenas cortadas. Com patrocínio da prefeitura de Londrina, terá distribuição gratuita em cineclubes e instituições culturais e educacionais.
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