Sheila Hammond nunca esteve tão feliz. A corretora de imóveis que tem uma vidinha mais ou menos em um subúrbio de Los Angeles passa mal em um nem tão belo dia assim e morre depois de um espasmo violento, com toques escatológicos. Mas volta imediatamente à vida, loira, linda, plena e com um apetite de fato diferenciado. Veículo escolhido por Drew Barrymore, 41 anos, para voltar à ativa depois de três anos de abstenção de sets de filmagens, período “em que fui ao fundo do poço, terminei um casamento e engordei horrores”, “Santa Clarita diet”, cujos dez episódios estão disponíveis no cardápio da Netflix, usa e abusa do humor negro para fazer rir.
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O deboche assumido de séries de zumbis, filmes de mortos-vivos e projetos nominalmente mais sérios, interessados em destrinchar a vida da classe média americana, dividiu crítica e público, com fãs da comédia de Victor Fresco (de “Better off Ted”) defendendo a criatividade das cenas de canibalismo - ninguém, jamais, é comido do mesmo jeito em “Santa Clarita diet” - e detratores torcendo o nariz para o excesso de sangue e a repetição de piadas.
Os personagens, incluindo um ótimo Timothy Olyphant (“Justified”) como o compreensivo marido Joel e as revelações Liv Hewson, como a filha adolescente dos dois, Abby, e o vizinho nerd Skyler, papel de Eric Bemis, se dedicam à busca de uma cura para a estranha transformação da personagem de Drew. Esta, no entanto, parece pouquíssimo interessada em voltar à vida anterior, exultante com o empoderamento conquistado após sua transformação.
A atriz, que também, é produtora-executiva da série, conversou sobre sua estreia de fato fazendo tevê - exclui-se aqui uma participação em uma soap opera americana nos anos 90 e vozes emprestadas a personagens das animações “Os Simpsons” e “Family Guy” - e as alegrias e dificuldades de seu novo regime alimentar.
Uma dieta salvadora
“Havia decidido parar de trabalhar na frente das câmeras para me dedicar à criação de minhas filhas, Olive e Frankie. Nos últimos oito anos, já vinha em marcha lenta, fiz apenas dois filmes. E aí meu casamento (com o especialista em artes plásticas Will Kopelman) de quatro anos faliu. Estava mal pacas e queria ficar no meu canto, quietinha, lambendo as feridas. Mas o Victor queria que eu lesse o roteiro da série, me disse quer fazer tevê seria diferente, o Timothy conseguiu me enviar o primeiro episódio, muito contrariada resolvi dar uma olhada e não parei mais.”
Fiz porque a série era “gauche”
“Para mim, esta é uma das definições mais exatas para “Santa Clarita Diet”: uma série ao mesmo tempo inteligente e esquisita. Quando li o roteiro, foi meio como se você tivesse entrado aqui neste quarto de hotel e a luz estivesse apagada, as cortinas fechadas, mas você soubesse exatamente onde eu estava sentada e que era eu aqui nesta poltrona. E pensei: “estes dois me ferraram!”. Não consigo pensar em outra coisa, esta mulher sou eu, agora, precisando reagir à vida, ressuscitar. Sou a Sheila!”
Terapia
“Emendar o fim de um casamento, com duas filhas para criar em casa, com “Santa Clarita diet” foi a melhor coisa que podia ter feito na vida. Foi terapia pura passar o verão do ano passado em um set em Los Angeles com Victor e Timothy. Foi, também, uma espécie de despertar. Lendo as falas de Sheila, jogando a energia represada nas cenas explícitas de canibalismo, meio que me salvaram. Eu me senti tão melhor em relação a mim mesma e à minha vida que parecia um trem desgovernado. Quando terminei de gravar o último episódio da temporada, minha vida parecia ter sentido, estava mais saudável. Esta dieta deu muito certo.”
Canibalismo
“Avisei ao Victor: “minha vida está o caos, estou fora do peso e eu muito facilmente poderia sim entrar no clima de sair por aí comendo, literalmente, pessoas”. Será que isso vai funcionar? Ele me disse que queria justamente alguém que saísse por aí matando sem culpa vizinhos, colegas de trabalho, desconhecidos. E que, ao mesmo tempo, o público torcesse por ela. Era eu!”
Casamento perfeito
“O casamento de Sheila estava em ponto-morto e fica perfeito com a transformação dela. Eles não brigam mais. O foco é, pela primeira vez, nas necessidades de fato urgente dela. “Santa Clarita diet” vira, então, um comentário hilário sobre os relacionamentos modernos e a tentativa de manter a individualidade e os seus desejos em uma relação a dois. A reflexão, para mim, e aposto, para muitas mulheres, foi uma bênção.”
Felicidade
“Não gosto de drama, pronto, falei. Nem na vida real, nem no cinema. Fiz um único filme dramático em minha carreira, todo o restante, desde “E.T., o extraterrestre” (1982), são narrativas que giram em torno da busca da felicidade, em suas mais variadas encarnações. Sei que histórias dramáticas são importantes, que precisam ser feitas, mas, quer saber a verdade? Hoje já posso assumir publicamente que não quero fazer e muito menos ver qualquer coisa depressiva, o que me dá uma sensação enorme de liberdade, pessoal e estética. Quem sabe não teremos uma segunda temporada de “Santa Clarita diet” no ano que vem? Minha fome, garanto, é a mesma!”
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