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Legion: realidade ou loucura? | /Divulgação
Legion: realidade ou loucura?| Foto: /Divulgação

O cinema e a TV precisam de mais e mais franquias de super heróis? Enquanto estiverem dando lucro a resposta é sim, mas precisa parecer novo e emocionar. Quem disse isso foi a produtora executiva Laura Shuler Donner durante o lançamento de um novo desdobramento do universo X-Men que chega ao Brasil nesta quinta-feira, às 22h30, no canal pago FX.

Legion” conta a história de David Haller (Dan Stevens, de “Downtown Abbey”), que na verdade é filho do professor Xavier e, segundo o primeiro episódio ao qual a reportagem da Gazeta do Povo teve acesso, o mutante mais poderoso do mundo.

Leia entrevista com Lauren Shuler Donner, produtora da série

Claro que a humanidade não o vê assim. Por ter visões e mover objetos com o poder da mente, David é visto por grupos paramilitares como uma arma, mas pela família é tido como perigoso, esquizofrênico e acaba trancafiado em um hospício chamado Clockwork.

Qualquer semelhança com o clássico de Stanley Kubrick “Laranja Mecânica” não é mera coincidência. E como a metáfora sobre intolerância dessa vez é a loucura, outros filmes que tratam do assunto — como “Um Estranho no Ninho” e “Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças” — também foram usados para materializar visualmente os delírios do personagem em uma estética que se inspira nos cenários e na trilha sonora do anos 1960/1970.

Mente caótica

Dirigida por Noah Hawley (da premiada série de TV “Fargo”), “Legion” tem um roteiro fragmentado, com memórias dentro de memórias que formam um caleidoscópio de imagens que mais confunde que esclarece a história do mutante.

O objetivo é fazer o espectador enxergar a narrativa através da mente caótica do protagonista, que nunca sabe se o que está vendo é real ou se aquilo são apenas as vozes da sua cabeça. Por isso a produtora executiva diz que esta série “é diferente de tudo o que já se viu neste gênero” (embora também seja igual a muita coisa que já se fez).

E seguindo a receita de Shuler Donner para se elaborar uma franquia de sucesso (leia entrevista abaixo), logo no primeiro capítulo a suposta loucura de David ganha um ponto de ruptura (ou quem sabe uma nova camada), quando ele se apaixona por uma nova paciente que chega ao Clockwork.

Interpretada por Rachel Keller, também de “Fargo”, a garota é linda, se chama Syd Barrett (como o guitarrista do Pink Floyd) e diz para David coisas como “talvez isso que chamem de loucura, essas vozes que você ouve, talvez tudo isso seja o que faz você único”. Ele a pede em namoro imediatamente. E ela aceita, tudo ao som de “She’s Like a Rainbow”, dos Rolling Stones.

Só tem uma ressalva para esse amor quase perfeito: ele não pode tocá-la de jeito nenhum, senão coisas muito perigosas podem acontecer. “As mais gostosas são sempre as mais loucas, né?”, brinca Lenny, a colega de hospício de David, interpretada por Aubrey Plaza (“Parks and Recreations”).

Química

Um namoro sem beijo, portanto, precisa de muita química. E isso os dois atores têm de sobra. Quando questionados pela reportagem se tinham noção disso, Rachel Keller comentou: “Eu não sei se já amei alguém que nunca pude tocar, mas eu já tive essa sensação de ‘eu não sei se eu te amo, mas eu te conheço, tem algo em você que eu reconheço’. E começa quando ele a pede em namoro tão abruptamente. Vem de algo que vai além do toque.” Dan Stevens complementou: “se não tem toque, tem que ter química, não tem outra opção”.

Química também não falta na série, especialmente entre os pacientes do Clockwork, que estão sempre sendo dopados — sem falar nas visões de David, que inspiradas pela atmosfera kubrickiana e pinkfloydiana da produção, levam o espectador a visualizar tudo como se fosse uma grande viagem de ácido e tranquilizantes. E os atores não passam impunes a isso.

“O fato de você estar em um hospício do Stanley Kubrick mexe com sua cabeça. Você tem horas que fica na dúvida se está no set de um filme dentro do set de uma série”, brinca Rachel Keller.

Mas para Dan Stevens, o que mais mexe com a sua cabeça são os figurantes do local, que interpretam os outros loucos.

“Tem gente que fica tão imersa no personagem que assusta. Tem essa menina que tem que ficar o tempo todo brincando com uma boneca como se fosse um bebê. Só que chega no intervalo, ela continua. Tem esse outro cara que fica fazendo dreads no cabelo. No fim do dia o cabelo dele está uma verdadeira loucura. Assusta, mas é divertido. O que não foi divertido foi quando conheci pessoas que sofrem dessas condições mentais e entender o quanto elas são incompreendidas e mal-interpretadas. Especialmente porque aquilo que eu passo na série [viver dopado] é a realidade delas. Então, de certa forma, essa série nos abre para entender que a compreensão do que é real é muito relativa para cada pessoa.”

Produtora que levou “X-Men” ao cinema diz que filosofia dos estúdios é o dinheiro

Depois de consolidar os personagens nas telonas, Lauren Shuler Donner, da Fox, agora tenta fazer o mesmo na TV

  • Los Angeles

Em um tempo em muito se discute a diversidade e a posição das mulheres na indústria do cinema, a produtora Lauren Shuler Donner, da Fox, talvez seja responsável por ter redefinido todo o modelo de negócios na Hollywood do século 21 quando decidiu acreditar na primeira grande franquia de super heróis dos anos 2000: a série “X-Men”, inicialmente dirigida por Bryan Singer e estrelada por Hugh Jackman, Ian McKellen, Patrick Stewart e Halle Berry.

À frente da produção executiva de “Legion”, ela conta um pouco dos bastidores desta série que se tornou um ícone na discussão sobre preconceito e intolerância no cinema.

Gazeta do Povo — Você foi a primeira a acreditar nos filmes de super heróis em Hollywood. Como você vê o desenvolvimento do gênero?

Lauren Shuler Donner — Quando comecei com essa franquia, me perguntaram por que eu estava fazendo aquilo, Naquela época, talvez à exceção de “Superman”, não havia muitos filmes bons de super heróis. Para mim, que não cresci lendo “X-Men”, foi revelador quando eu decidi ler. Eu vi personagens complexos, heróis trágicos, particularmente Logan. E percebi que se nós os fizéssemos com o pé no chão, as pessoas se identificariam com eles. Quando falei com o executivo da Fox, o Bill Mechanic, ele era simplesmente o cara que tinha vendido sua coleção de HQs dos “X-Men” para financiar seus estudos na UCLA, então eu estava pregando para um convertido. “Legion”, depois de fazer nove filmes de “X-Men”, vem em um esforço de centrar a narrativa nos personagens, baseada nestes 45 anos da série, mas com outros personagens.

Quando “X-Men” foi lançado, era evidente a mensagem sobre intolerância. Isso continua na série?

Sim, continua. Não tem como falar de “X-Men” sem tocar neste assunto. Há pessoas excluídas, diferentes, mal entendidas e que não são bem tratadas pela sociedade. Primeiramente todo mundo se sente desse jeito, mesmo não sendo necessariamente diferente. Então essa é a jornada do David (Dan Stevens), nosso personagem principal. Ele é colocado de lado, na verdade internado como um esquizofrênico, mas a discussão toda é: “Ele é mesmo esquizofrênico ou ele tem poderes?” Então, por causa de seus super poderes, eles foi classificado como louco. E eu tenho certeza que muita gente, porque é age diferente, é vista como louca.

A série vai se encaixar no universo dos filmes dos “X-Men”?

Olha, vai ter umas menções aqui e ali, mas a gente ainda vai como e quanto vai ter disso.

Por que vocês estão usando a psiquiatria como metáfora para esse show?

Porque a história do David é assim nos quadrinhos.

E vocês usam filmes como “Um Estranho no Ninho” e “Laranja Mecânica” como referências visuais?

Também “Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças” e os filmes do Terence Malick são uma influência.

Qual a diferença do retrato dos mutantes feito para a TV e para o cinema?

A gente quis fazer na TV para poder focar nos personagens. Quando fazemos filmes, a coisa mais importante são os efeitos especiais, as cenas de ação. Mas se você não se interessa por isso, temos que fazer algo mais emocional. Precisamos de mais espetáculo visual quando estamos fazendo filmes, porque é o motivo pelo qual as pessoas pagam para ir ao cinema hoje em dia. Na TV, podemos focar os personagens, que veremos toda semana. Então, esta é a diferença.

Por que precisamos de mais super heróis?

Porque esta série é diferente. É diferente de tudo o que você já viu em termos de super heróis na TV e no cinema. Temos histórias fragmentadas, memórias dentro de memórias, um narrador não confiável em um mundo de fantasia e ilusões. Então, confie em mim, você não viu nada parecido.

Você não acha que o gênero de super heróis suplantou outros gêneros, como o drama, no cinema? Por exemplo, no ano passado a bilheteria foi recorde, mas foram poucos os filmes que garantiram isso, a maioria deles franquias como “Star Wars”, “Capitão América” e animações como “Procurando Dory”, “Moana” e “Zootopia”…

Isto é por que os estúdios precisam ser muito cautelosos, pois são propriedade de grandes corporações. E a filosofia deles é dinheiro. Se você tem uma franquia de super heróis, você garante que terá dinheiro e lucro. Dramas têm feito muito mais sucesso na televisão. Veja, “The Crown”, “Breaking Bad”, “Mad Men”… Os melhores filmes desta temporada de Oscar são independentes. Os estúdios não estão mais se arriscando com essas produções.

E o dinheiro que os estúdios faturam com essas franquias é usado...

Apenas para financiar outras franquias. Veja, não quero cuspir no prato que eu como, mas de vez em quando os estúdios nos surpreendem produzindo algo como “La La Land”…

Qual o segredo para se fazer uma franquia de sucesso?

Número 1: sempre deixe claro os aspectos emocionais da história e dos personagens. Número 2: nunca deixe ninguém na audiência dizer: “ah, eu já vi isso, acho que essa franquia está esgotada”. “X-Men: Primeira Classe” era um filme de James Bond;, os Wolverines eram filmes “noir”; “Gambit” que está vindo agora é um filme de assalto. Cada um tem sua característica própria para não ser a mesma história batida. É assim que se constrói uma franquia

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