Existem duas cenas no primeiro episódio de “Santa Clarita Diet”, nova comédia do mesmo criador de “Better Off Ted”, Victor Fresco, que são tão nojentas que me provocam enjoo mesmo uma semana depois de ter assistido. Em uma delas, Sheila (Drew Barrymore), uma agente imobiliária que trabalha com o marido Joel (Tomothy Olyphant), começa a vomitar e não consegue parar: conseguimos ouvir tudo e a câmera persiste em mostrar o resultado.
Depois, quando já descobrimos que isso era parte do processo de transformação de Sheila em um zumbi (ainda que uma zumbi que pode evitar o apodrecimento do corpo, manter uma vida sexual ativa e um senso de espontaneidade quando é bem alimentada), somos levados para uma cena sangrenta em que ela devora sua primeira refeição com carne humana.
Eu não gosto de assistir coisas nojentas — e tenho uma grande tendência de ter enjoo — mas isso é parte do meu trabalho. E eu consigo reconhecer quando algo nojento acontece por um motivo. Mas “Santa Clarita Diet” é um lembrete de que embrulhar o estômago dos espectadores não é a mesma coisa que causar uma reação significativa. Às vezes nojo é somente nojo.
Para dar alguns contraexemplos: eu não gostei do clímax do duelo entre Gregor Clegane (Hafþór Júlíus Björnsson) e Oberyn Martell (Pedro Pascal) em Guerra dos Tronos, que terminou com o primeiro esmagando a cabeça do segundo com apenas um golpe de seu enorme e poderoso punho. E eu não precisava ver um cachorro rasgando a mandíbula de Ramsay Bolton (Iwan Rheon) depois de ter perdido uma batalha para Sansa Stark (Sophie Turner), que o executou da mesma maneira com que ele matou tantos outros.
Mas eu consegui entender o motivo do programa ter feito essas escolhas. A morte de Martell no momento em que ele parece ter vencido a luta é uma inversão chocante e uma vitória da força bruta sob a esperteza. E o fato de Stark ter usado os próprios métodos de Bolton para matá-lo foi uma das melhores maneiras de demonstrar o quanto ela estava afetada e diminuir a impressão de sua liberação ser uma vitória ambígua.
“Santa Clarita Diet” é um lembrete de que embrulhar o estômago dos espectadores não é a mesma coisa que causar uma reação significativa. Às vezes nojo é somente nojo.
O que a sequência de vômito e a visão de Sheila comendo um corpo comunica é principalmente que o processo pelo qual ela está passando é asqueroso. Eu suponho que exista um certo frisson em “Santa Clarita Diet” pela justaposição entre um banheiro incrustado de vômito e algumas entranhas ensanguentadas e a suposta organização da vida suburbana de Sheila e Joel, assim com as casas fantásticas que eles vendem e o aumento do apetite sexual dela. Existem bile, nervos e intestinos atrás de todos os nossos desejos.
Mas “Santa Clarita Diet” parece muito leve para suportar a verdadeira escuridão; o seriado oferece várias piadas sobre vômito, não uma vivissecção da alma num estilo Hannibal ou uma meditação sobre o fim da sociedade como “Walking Dead”. Talvez “Santa Clarita Diet” chegue lá, ou pelo menos chegue em um lugar mais interessante.
Com tantas outras opções para assistir, eu não vou acompanhar o programa durante sua jornada. Ao contrário, “Santa Clarita Diet” vai ficar como um lembrete que a licença que o Netflix oferece para os criadores, que podem fazer episódios mais longos ou mais curtos que o padrão ou ter conteúdo sexual e violento explícito, não é sempre significativo. Assistir a Sheila vagar pela cozinha comendo um hamburguer cru de uma bandeja de isopor pode ser mais perturbador do que olhar os destroços nauseantes de seu vômito.