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Para o cineasta Alexander Mindadze, Sábado Inocente proporciona o encontro dos novos cinemas russo e romeno | Divulgação
Para o cineasta Alexander Mindadze, Sábado Inocente proporciona o encontro dos novos cinemas russo e romeno| Foto: Divulgação

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Seleção do público tem a cara do evento

Leon Cakoff tinha o maior orgulho do formato de competição da sua mostra. O público seleciona e, sobre esta pré escolha, o júri delibera e atribui o troféu Bandeira Paulista. No sábado, houve a tradicional coletiva do júri, coincidindo com o anúncio dos filmes selecionados pelo público para concorrer ao troféu Bandeira Paulista, nas categorias de ficção e documentário. Houve um tempo, durante a ditadura, que a Mostra era o único lugar do Brasil onde as pessoas podiam exercer o democrático direito do voto. Isso faz parte da história do evento. O tempo mudou, as condições são outras, mas um dos jurados – o diretor canadense de origem armênia Atom Egoyan, que vai receber o prêmio de carreira Humanidade Leon Cakoff –, disse que já foi a muitos festivais, mas nunca encontrou nenhum com esse formato tão democrático. Outro jurado, o francês Frédéric Boyer, acrescentou que conhecia os filmes mais votados pelo público e foi definitivo: "O público da Mostra é um excelente programador". Renata de Almeida, a quem cabe agora levar a Mostra adiante, após a morte do marido, Leon, observou que o público, sempre soberano, costuma surpreender. "Às vezes a gente jura que determinado filme estará entre os selecionados, mas não acontece."

Por mais de 30 anos, Alexander Mindadze foi roteirista para o cineasta Vadim Abdrashitov. Fizeram 11 filmes, entre eles A Pray for a Passenger, que ganhou o Urso de Prata de roteiro no Festival de Berlim em 1995. Mindadze voltou este ano com seu segundo longa como diretor. Sábado Inocente, que erá exibido hoje na Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, passa-se num único dia. O que ocorreu em 26 de abril de 1986, em Chernobyl, virou tabu na antiga União Soviética, que tentou minimizar os efeitos da radiação nuclear provocada pelo vazamento no reator da usina. Hoje, sabe-se que morreram muito mais pessoas e os danos foram maiores do que os anunciados há 25 anos. Para Mindadze, seu filme não é sobre o acidente nuclear. É sobre a luta de um homem contra forças – o sistema, a tecnologia – que o esmagam.

Se fosse sobre o acidente nuclear, Mindadze poderia ter feito um documentário. Ele nem cogitou da possibilidade. Logo no começo, o protagonista – um improvável dublê de músico e burocrata do partido – tenta alertar as autoridades, mas se choca com a intransigência dos superiores. Ele resolve fugir. A namorada não encontra o passaporte. Quando correm para pegar o trem – o último que sai de Chernobyl –, ela quebra o salto.

"Interesso-me basicamente por pessoas. O eterno drama humano. O comunismo foi-se, mas as dificuldades de viver continuam imensas na Rússia." O filme sobre Chernobyl era um desejo antigo, ele revela. "O reator da usina era novo, as chances matemáticas de um acidente eram insignificantes, cerca de 0,0000001%. Isso é nada, mas ocorreu." Mindadze filmou numa pequena cidade da Ucrânia, que tem um reator idêntico ao de Chernobyl. Os efeitos – a rachadura e a cortina de chamas e de fumaça – foram feitos na Alemanha, por computador. Mindadze agradece ao produtor Alexander Rodnyansky por haver contratado um grande diretor de fotografia, o romeno Oleg Mutu, de A Morte do Senhor Lazrescu e Quatro Meses, Três Semanas e Dois Dias. "Este encontro do novo cinema romeno com o russo é o grande acontecimento de Sábado Inocente", reconhece.

Plano-sequência

Há uma longa cena de câmera na mão, quando Mutu se movimenta no estrado em que Valerij toca com sua banda numa festa. A cena é essencial na arquitetura dramática de Sábado Inocente. A banda rachou no passado, quando o rock era sinônimo de decadência burguesa. Explodem velhos ressentimentos. Os convidados bebem até cair. A música é barulhenta. Lá fora, o mundo está acabando. A alienação é total. "A cena parecia bem escrita, mas não creio que tivesse funcionado sem a mão de ferro de Mutu. O plano-sequência foi desenhado no set. Chegamos à conclusão de que seria mais forte, ao invés dos cortes, tipo MTV, associados à linguagem do rock", disse o diretor.

Para ele, a Rússia atual assemelha-se a um vasto cemitério, e por isso a metáfora de Chernobyl lhe pareceu atraente como tema contemporâneo. "O conceito é a civilização industrial global contra o homem insignificante. Como nas tragédias gregas, o destino nos ultrapassa. É uma tragédia russa? Por certo, mas é também uma tragédia global." Mindadze foi profético. Fez a afirmação dias antes que o tsunami no Japão provocasse o acidente nuclear de Fukushima. Seu filme incita à reflexão.

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