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Marco Nanini e as irmãs cajazeiras: cenas não dão tempo de se criar empatia pelos personagens | Divulgação
Marco Nanini e as irmãs cajazeiras: cenas não dão tempo de se criar empatia pelos personagens| Foto: Divulgação

O incômodo maior provocado pela adaptação cinematográfica de O Bem Amado, por Guel Arraes, não é ver Marco Nanini em uma atuação menos inspirada. Ainda mais quando o ator veterano enfrenta o papel de Odorico Paraguaçu, cristalizado (como poucos) no imaginário do brasileiro com as feições e trejeitos de Paulo Gracindo (1911-1995), que o popularizou na tevê nos anos 1970, com a novela, e 80, com a minissérie de mesmo nome.

Se falta vida ao seu personagem, para além da caricatura do prefeito de discurso empolado, a explicação está menos no trabalho individual do ator do que na escolha coletiva de transformar a obra de Dias Gomes (1922-1999) em uma sátira política atual e "ágil".

Tão ágil que as cenas se sucedem numa afobação desenfreada. Mal permitem ao espectador – e aos personagens – respirar. Quanto mais rir ou desenvolver algum tipo de empatia pelos homens e mulheres que vislumbra na tela entre um corte e outro. É o caso das irmãs cajazeiras, interpretadas por Zezé Polessa, Andréa Beltrão e Drica Moraes, num furor sexual desatado. Elas não se humanizam.

A direção de Arraes pesa a mão na linguagem que o consagrou em projetos anteriores, como O Au­­­­to da Compadecida e Lisbela e o Prisioneiro. O ritmo acelerado e a fala peculiar dos atores – ora a es­­perteza de um Chicó, ora a ingenuidade de Lisbela – também mar­­geavam a caricatura, mas de modo a dar personalidade aos filmes.

O Bem Amado não usufrui do mesmo efeito. Dispensando qualquer sutileza e atropelando o tempo, passa sem dar ao espectador ao menos uma brecha para embarcar junto.

Proeza

A atenção só não se perde de todo por proeza do texto. Não apenas as expressões engraçadas que Odorico emprega para ludibriar seu eleitorado e acalmar a expectativa de que enfim morra um cidadão de Sucupira e o cemitério que ele superfaturou possa ser inaugurado. A obra de Dias Go­­mes é rica em tiradas irônicas e, principalmente, na crítica política, que se estende à alta camada das socialites provincianas.

No entanto, essa mesma crítica política perde força na adaptação. Tentando aproximar a história do contexto atual, o diretor reformula o coronelismo típico da época, personificado por Odorico, em favor da "politicagem" mais contemporânea, também corrupta, oportunista e popularesca. Nessa atualização, a oposição (representada pelo dono de um jornal de esquerda) não é menos discutível em seus métodos do que o governo.

Sobra um jornalista honesto, papel de Caio Blat, criado por Arraes para tentar escapar do estereótipo de que ninguém ligado à política presta. Mas não acredite na salvação. O que o roteiro reserva ao rapaz é um romance adocicado com a filha do prefeito (Maria Flor), completamente anacrônico e largado pela metade, e uma esperança para o futuro político do país que surge deslocada do cenário original. GG

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