O Púcaro Búlgaro, romance levado literalmente à cena pelo diretor carioca Aderbal Freire-Filho, pede que se esqueça o verossímel. Campos de Carvalho (1916-1998), o autor, lançava seus personagens além das fronteiras do factível, bolando tramas surreais como a de Hilário, protagonista da montagem em cartaz hoje e amanhã no Teatro Regina Vogue
O personagem é alguém que se espanta ao ver uma antiguidade em um museu (breve aparte: púcaro não é mais do que um recipiente pequeno) e tanto se deixa levar pela excentricidade do nome rimado que descarrega o estranhamento sobre o país de origem e se pergunta: existe mesmo a Bulgária?
Figuras ainda mais disparatadas do que Hilário surgem para acompanhá-lo na expedição de desbravamento à qual é impelido por essa indagação. Gente como o alfarrabista (vendedor de livros antigos) convencido de abrir uma fábrica de acentos circunflexos no território balcã. Nos meses entre outubro e dezembro de 1960, se ocupam dos preparativos da aventura, que obviamente não leva a lugar nenhum.
A obra literária é recriada no teatro sem qualquer alteração no texto original. Este é, enfim, um dos princípios que regem o romance-em-cena, um gênero que Aderbal pôs em prática em montagens anteriores como O Que Diz Moleiro (apresentada no Festival de Curitiba em 2004).
Os atores dizem todo o texto, inclusive o relativo a seus personagens, em terceira pessoa (portanto, próximo da forma épica). Ao mesmo tempo, porém, representam as ações que narram (no modelo dramático). Entram assim em uma alternância vertiginosa de quase 50 personagens, propositadamente caricatos. A encenação tende para o farsesco, ora esbarrando em um humor escrachado, ora deslizando para referências cultas.
A proposta é bem diferente das adaptações de Shakeaspeare que o diretor, marido da atria Marieta Severo, recentemente trouxe à cidade: Hamlet, com Wagner Moura, e Macbeth, com Daniel Dantas e Renata Sorrah.
Último
O Púcaro Búlgaro foi o último romance escrito pelo mineiro de Uberaba. Publicado em 1964, encerrou uma obra não muito numerosa, mas singular entre os brasileiros, pelo seu parentesco com o surrealismo. Antes, Campos de Carvalho. lançou títulos como A Lua Vem da Ásia (1956), Vaca de Nariz Sutil (1961) e A Chuva Imóvel (1963).
Sua prosa não é fácil de ser vertida em cena, mas Aderbal encontrou a forma adequada na peça que estreou em junho de 2006.
Serviço: O Púcaro Búlgaro. Teatro Regina Vogue (Av. Sete de Setembro, 2.775 Shopping Estação), (41) 2101-8292. Texto de Campos de Carvalho. Direção de Aderbal Freire-Filho. Com Ana Barroso, Candido Damm e Gillray Coutinho. Dia 3, às 21 horas, e dia 4, às 19h30. R$ 30 e R$ 15 (meia). Classificação indicativa: 14 anos.
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