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| Foto: Leo Martins/Agência O Globo

Auto da Compadecida

Ariano Suassuna. Agir, 232 págs. R$ 39,90.

Romance d’a Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-volta

Ariano Suassuna. José Olympio, 756 págs., R$ 70.

O Santo e a Porca

Ariano Suassuna. José Olympio, 154 págs., R$ 20.

Adaptações

A obra de Suassuna foi transportada várias vezes para a tevê e o cinema. Confira algumas delas:

• Auto da Compadecida

Em 1969, foi levada às telas como A Compadecida (1969). Armando Bógus (1930-1993) vive o protagonista João Grilo e Antônio Fagundes, seu parceiro Chicó.

Em 1987, a peça voltou aos cinemas em Os Trapalhões no Auto da Compadecida, com direção de Roberto Farias. Renato Aragão e Dedé Santana encarnavam, respectivamente, João Grilo e Chicó.

A mais conhecida adaptação é de 1999, numa minissérie da Globo de quatro capítulos transformada em filme de sucesso no ano seguinte. Com a letra "o" adicionada ao título, o trabalho foi dirigido por Guel Arraes. Matheus Nachtergaele (João Grilo) e Selton Mello (Chicó) interpretaram com brilho a dupla central.

• A Farsa da Boa Preguiça

A peça inspirou em 1995 um especial da Globo dirigido por Luiz Fernando Carvalho, com Jackson Antunes, Laura Cardoso e Patrícia França no elenco.

• A Pedra do Reino

Luiz Fernando Carvalho volta ao universo de Suassuna em 2007, em homenagem aos 80 anos do escritor, e transforma o romance em série de cinco capítulos. Muito elogiado pela crítica, o programa, considerado hermético, foi fracasso de audiência.

Opinião

Uma vida-espetáculo

Guga Azevedo, especial para a Gazeta do Povo

A primeira entrevista que fizemos na faculdade foi com Ariano Suassuna. Éramos um grupo de estudantes ingênuos, despreparados, estabanados e felizes. A graça toda era estar na casa do autor, sentado em sua grande sala decorada com temas nordestinos e tomada pela grave voz rouca. Um sotaque sertanejo fortíssimo e muita tosse. Não tínhamos uma pauta robusta, não conhecíamos bem sua obra e não entendíamos ao certo quais eram suas posições políticas e culturais. Era 2002, e o Bruno ainda lembra que foi a pior transcrição de entrevista que fizemos na vida. Foi, mas foi demais.

Seguimos diferentes caminhos profissionais com essa marca no início de carreira. Desde então, o carinho pela figura alta, encurvada e carrancuda só aumentou. Ele citava músicas do Raul Seixas (criticando estrangeirismos) como se tivessem sido lançadas ontem. Ao mesmo tempo em que acompanhou de perto todo o auê do manguebeat e a situação do Sport pelos campeonatos da vida.

O causo mais marcante de todos contado por ele foi o do rico senhor que possuía terras na divisa entre Pernambuco e Paraíba. Ele demorou anos para concluir a construção de um engenho no local. O trabalho de uma vida que, quando concluído, viria acompanhado pela cova. O rico senhor terminou o engenho e faleceu, coroando a mais fina ironia da vida, só encontrada na literatura de cordel. Ariano contou essa história quando falou sobre um livro que estava escrevendo. "O maior de todos", que estava sendo preparado desde o início dos anos 1990, e ele enrolava porque sentia uma diferente ligação com a obra. Se ele terminasse o livro, encontraria a morte. Acabo de ler um artigo falando que essa obra era sobre sua vida – provavelmente com todas as deliciosas fantasias na narrativa. Fico triste por ser uma obra incompleta, e feliz por ganhar mais alguns anos sendo aluno de sua vida-espetáculo nesse mundo. Guga Azevedo é jornalista, editor do portal Pop e autor do blog Grande Escape. Entre 2001 e 2002, estudou na Faculdades Integradas Barros Melo, em Olinda (PE), onde teve a oportunidade de entrevistar Ariano Suassuna.

Não é por acaso que a estreia de Ariano Vilar Suassuna, ainda estudante de Direito, tenha sido com a peça Uma Mulher Vestida de Sol, de 1947, narrativa trágica do sertanejo diante do calor, do agreste e da terra queimada de sol. Ao longo de quase 70 anos de produção, 18 peças e mais de trinta livros de ficção e de poesia, Suassuna erigiu um castelo afetivo onde se acomodavam malandros, santos, poderosos, prostitutas, avarentos, medíocres e sonhadores, entre outros tipos que caracterizaram, cada qual à sua maneira, um jeito brasileiro de sentir e existir.

Como um maestro conciliador, Suassuna conduziu cada uma de suas personagens ao chão do sertão, em um resgate entre o teatro grego e a literatura de cordel, um Nordeste picaresco e crítico. Traduzido em mais de dez línguas, este paraibano de coração pernambucano, nascido em Nossa Senhora das Neves, atual João Pessoa, num dia de Corpus Christi, fez de sua trajetória uma releitura mística do país e de seu tempo, um tablado para o seu particular modo de enxergar a literatura e, num plano maior, a identidade nacional.

Mediador

À moda de Gramsci, Suassuna foi um intelectual orgânico, bandeirante, capaz de transitar da anedota à política, de recriminar Madonna e Michael Jackson e divulgar, aos quatro ventos, sua paixão pelos cantadores de Olinda. Era um reclamão habitual das novidades tecnológicas e extremamente paciente e solícito com estudantes – suas aulas-espetáculo eram folclóricas.

Nos anos 1970, erigiu um movimento de resgate das origens culturais nordestinas, com o mote de conciliar o erudito ao popular. O Movimento Armorial foi uma das iniciativas emblemáticas do Brasil do século 20. Ao reunir nomes conhecidos do cenário cultural da época, como Capiba e Guerra-Peixe, procurou uma regionalidade capaz de abraçar o teatro, a dança e as artes visuais sem as influências externas da modernidade.

Relógio de sol

Em 1989, foi eleito para a Academia Brasileira de Letras. Mas não era muito de aparecer nas tardes de chá. Torcedor fanático do Sport, foi imortalizado em exposições, sambas-enredo, teses acadêmicas, séries de tevê e filmes que buscaram trazer um pouco de sua visão de nacionalidade caprichosamente medieval.

De fato, Ariano, desde 1955, com o estrondoso Auto da Compadecida, integrava o imaginário brasileiro. (Sob a alcunha de Arriando Suassunga, foi satirizado pela trupe do Casseta & Planeta. Suassuna, o original, não achava os quadros muito engraçados.) À esquerda, admirava Lula, considerado por ele, sem ironias, uma espécie de Sancho Pança.

Era uma alma pouco belicosa, amena e de humor acentuado. Sobre os vegetarianos, dizia que o cavalo e o humano da Idade da Pedra viviam aproximadamente 20 anos. O cavalo, apesar de sua alimentação saudável histórica, continuava vivendo os mesmos 20 anos de sempre. "O mundo é um circo e o mundo de meu teatro procura se aproximar dele: um mundo de sol e de poeira", proferia.

Cânone

Quando completou 80 anos, Suassuna cruzou o país para receber todo tipo de homenagem, apesar de sua aversão a voar de avião. Afirmava se recusar a morrer e ficava "preocupado" com a dimensão dos festejos quando completasse 160 anos. Para ele, a morte tinha um elemento de suicídio e não queria ser levado tão cedo pela Dona Caetana, eufemismo quase familiar para o fim em algumas regiões nordestinas.

O sertão, o nobre coloquial e as idiossincrasias de toda a gente foram camadas para o seu palco, um dramaturgo que carregou, a tiracolo, a sabedoria popular e a pulsão de viver, mesmo sob o sol inclemente. Suassuna deixa uma obra que permanecerá em nosso relicário por muito tempo. A cada dia algum brasileiro se deparará com a ingenuidade falsária de Chicó, os sonhos emparedados de Quaderna e, sobretudo, um universo de cores potentes e libertárias, quase saudosas, como, aliás, ele sempre advertia: "Liberdade é o artista fazer o que lhe agrada, contra os rótulos e as inclinações de seu tempo".

Obra

Suassuna deixou um dos maiores legados da literatura brasileira. Confira algumas de suas principais obras:

• Teatro

Uma Mulher Vestida de Sol (1947) Auto da Compadecida (1955) O Casamento Suspeitoso (1957)

O Santo e a Porca (1957) A Pena e a Lei (1959) Farsa da Boa Preguiça (1960) • Romance

A História do Amor de Fernando e Isaura (1956) Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta (1971) História d’O Rei Degolado nas Caatingas do Sertão/Ao

Sol da Onça Caetana (1977) • Poesia

Ode (1955) Sonetos com Mote Alheio (1980) Sonetos de Albano Cervonegro (1985) Poemas (1999)

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