Foi fazendo ilustrações para jornais de Mogi das Cruzes, interior paulista, que Mauricio Araújo de Sousa começou sua carreira como desenhista. Ao tentar um emprego na Folha da Manhã, atual Folha de S. Paulo, ele acabou conseguindo uma vaga de repórter policial. Não demorou muito para que o talento com o nanquim se sobressaísse. Em 18 de julho de 1959, uma tirinha com o personagem Bidu, inspirado em um cãozinho que tinha na infância, foi a estreia de Sousa na sessão de quadrinhos no jornal.
Hoje, com cerca de 500 personagens criados, entre protagonistas e coadjuvantes, Mauricio de Sousa é um dos maiores nomes do cartunismo brasileiro. Líder de uma equipe de mais de 200 pessoas, faz questão de analisar todos os roteiros que chegam a sua mesa.
Por telefone, depois de um longo dia de trabalho, ele contou à Gazeta do Povo sobre sua criação mais importante: a Turma da Mônica.
A Mônica completa 50 anos como protagonista dos quadrinhos brasileiros de maior sucesso e você começou com ela para seguir um sonho. A sensação é de dever cumprido?
Desde o início eu já estava vivendo esse sonho. Eu não percebia que o sonho viraria uma boa realidade durante tanto tempo. Nunca parei para pensar "vou desenhar durante os próximos 30, 40 anos. Nunca pensei "vou ser famoso". Pensei em continuar trabalhando. Felizmente, a Mônica caiu no gosto do público, tanto que ela era secundária na história do Cebolinha. Quando aparecia, ela roubava a cena, como fazem as mulheres, e assumiu a liderança no bairro do Limoeiro para desespero do Cebolinha.
E quais são os desafios para deixar a Turma da Mônica continuamente relevante?
Eu acho que isso é resultado do trabalho profissional, mais o trabalho carinhoso e o cuidado com o nosso público. Tudo isso junto, dá o resultado de sucesso.
Você percebe que existe uma competição hoje entre os quadrinhos e outras formas de entretenimento para crianças e adolescentes, como internet, tablets, smartphones?
Existe uma variedade muito gostosa que a criançada absorve tranquilamente. Elas não escolhem. Elas estão entrando em tudo quanto é plataforma, buscando informação, lazer, diversão... Tem a hora do gibi, a hora do game, a hora da tevê, da internet, a hora do brinquedo e do futebol. A multicidade da atenção diante de diversas manifestações é algo que a criança domina tranquilamente. Elas conseguem prestar atenção ao mesmo tempo em um monte de coisa. Vejo pelos meus filhos, que estavam ouvindo música, estudando, assistindo tevê, com game ligado e telefone do lado dois telefones! , e ainda discutindo, conversando. Eu comecei, a partir daí, a ver que a criançada de hoje não é mais a de antigamente. Elas aprenderam a se relacionar com essa comunicação em placas, em etapas curtas e, de alguma maneira, juntam tudo e fazem o mix da comunicação chegar até elas.
Ao mesmo tempo, a Turma da Mônica conquista não só crianças e adolescentes, mas também adultos. No momento da criação das histórias isso é levado em conta?
Sim. Nós temos que fazer história para todos os públicos. Não pode ser "tatibitate", porque as crianças não aceitam, nem muito adulta, porque não pode ser muito pesado. Hoje tem que ser dirigida ao leitor dos 12 aos 16 anos. Nós falamos com todos assim, pois a criançada quer ter 15 anos e os adultos também.
Como é sua rotina?
Normalmente, trabalho em casa, de manhã. Vejo os 200, 300 e-mails que recebo, e minha secretária ajuda um pouco. Vejo roteiros e até trabalho no estúdio. Às vezes, vou até tarde, meia-noite, 1 hora, e às vezes, até a madrugada, que é um horário maravilhoso para escrever alguma coisa.
O senhor mantém controle sobre todo o material produzido?
Todas as histórias passam por mim, depois eu delego. A diretora de arte, Takeda, por exemplo, é minha mulher. Mauro, meu filho, cuida do teatro. Estou tentando cada vez mais ir delegando pra sobrar tempo para criar.
A Turma da Monica foi, ao longo dos anos, incluindo personagens que representavam minorias (índios, sertanejos, portadores de necessidades especiais, entre outros) e refletindo, de certa forma, os avanços na sociedade brasileira. No que o senhor pensa quando cria um personagem desses grupos?
Quando eu sinto que está faltando algum elemento nas nossas histórias, algum portador de novas mensagens, eu estudo bem o que você chamou de minoria, estudo o que está acontecendo, suas dificuldades e felicidades. A gente tenta colocar bem o que acontece na vida real, mas não de forma dramática. Mostramos as possibilidades, as qualidades, a realidade possível. Em nossa revista, os personagens nunca estão para baixo, desanimados, nenhum deles é depressivo. Se tiver algum problema muito grave, eles resolvem. E a vida é assim. Chega uma hora em que é preciso bater o cartão do problema, porque amanhã é outro dia.
A Turma da Mônica Jovem foi uma aposta que deu certo. De onde surgiu a ideia de abordar os personagens adolescentes?
Era uma velha ideia, inclusive, sugerida pelos leitores. E, além disso, a criançada foi ficando cada vez mais com a infância encurtada, entrando na adolescência mais cedo, buscando alternativas para a leitura. Eles iam para o mangá japonês, então pensei em fazer um mangá "caboclo". Acho que eu atendo a todos. A Turma da Mônica Jovem se tornou a revista mais vendida do Ocidente. Inclusive nos Estados Unidos, a gente bate todas.
É verdade que o senhor criou a Turma da Mônica Jovem pensando em seu filho caçula? O que o senhor observou nele e nesta nova geração que o fez conceber a revista do jeito que é?
Não exatamente, mas eu conversei muito com meus filhos sobre tudo isso e todos eles sugeriram que eu deveria abrir esse lado.
Foi necessário formar uma nova equipe para essa revista ou ela é feita pelos mesmos roteiristas e desenhistas da Turma da Mônica?
Os mesmos. Todos eles estavam se preparando durante todo esse tempo.
O senhor poderia comentar um pouco sobre a versão adulta da Turma da Mônica que vai ser lançada em 2017?
Ainda tem um tempinho. Estamos planejando, descobrindo, vendo quem pode ajudar. Alguns escritores e novelistas da Globo também podem me ajudar. Estamos montando o projeto e tomara que tenha o mesmo sucesso, para poder acompanhar nosso público durante todas as fases da vida. Acho que vai ter.
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