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| Foto: Brunno Covello/Gazeta do Povo

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Tangueria: Rádio E-Paraná (97.1Mhz.). Domingos, às 23 horas.

Todos os domingos, às 23 horas, quem sintoniza a rádio e-Paraná FM (antiga Educativa) tem a oportunidade de trazer para dentro de casa, e dos ouvidos, um pedaço importante da cultura argentina. O programa Tangueria oferece ao ouvinte, em seus quatro blocos, um cardápio refinado e eclético que revela, a cada edição, a riqueza do gênero musical nascido na região do Rio da Prata, mas que ao longo do século 20 ganhou o mundo, assumindo muitos sotaques e roupagens.

Nos dois primeiros segmentos do programa, se concentram gravações de manifestações mais tradicionais do gênero musical, instrumentais e cantadas. O terceiro é dedicado exclusivamente a composições de Astor Piazzolla (1921-1992), responsável pela renovação da linguagem do tango, e que, com sua obra, desbravou as fronteiras entre a música popular e a erudita. Fecha o Tangueria um bloco todo dedicado a releituras e a novas conceituações feitas por artistas de todo o mundo, inclusive brasileiros.

Há dois anos e meio no ar, a atração dominical da e-Paraná é obra de um personagem cuja história de vida é tão épica quanto sugere seu nome: Alejandro Daniel Enrique Di Núbila, dono de um acervo que hoje conta com mais de 10 mil composições, distribuídas em uma discoteca gigantesca – só de CDs de Piazzolla são mais de cem.

Imigração

Natural de Buenos Aires, onde nasceu há 48 anos, Alejandro vive no Brasil desde 1990, quando durante uma das muitas crises econômicas atravessadas pelo seu país nas últimas décadas, ele decidiu emigrar em busca de melhores condições de vida e trabalho. A proximidade geográfica foi, sem dúvida, um fator importante, mas a musicalidade do país vizinho também teve seu papel: "Ouvia muito o LP Elis &Tom, e quis ver tudo isso mais de perto".

Formado pelo Conser­­vatório Municipal de Buenos Aires, Alejandro, que também compõe e toca violão, piano, viola e flauta transversal, trouxe na bagagem o seu instrumento de especialidade: o bandoneón, sem o qual o tango não seria o que é. Mas, para sobreviver, o músico tinha outra carta na manga. Para garantir-lhe o sustento, sempre trabalhou como afinador de pianos, ofício que aprendeu muito jovem, em Buenos Aires. "Venho de uma família muito musical. Minha mãe era pianista."

Em menos de um ano na capital paulista, Alejandro já havia conquistado um espaço expressivo com sua habilidade técnica. "Cheguei a afinar os pianos do Departamento de Música da USP [Universidade de São Paulo], e logo muitas oportunidades começaram a surgir."

Quis o destino, no entanto, que ele partisse rumo a Curitiba. A primeira esposa, então sua namorada, ficou grávida de sua filha mais velha, Clarisse, hoje com 22 anos. "Ela era de Blumenau, mas morava aqui. Daí, resolvi me mudar, e acabei ficando." Da união, também nasceu Bruna, 20.

Bandoneón

Embora instrumentista e professor de música diplomado na Argentina e no Brasil – é formado pela Escola de Música e Belas Artes (Embap) –, Alejandro segue vivendo de afinar pianos. Gerencia, inclusive, a loja Plander, de instrumentos musicais. Também se apresenta, com seu bandoneón, toda segunda-feira, às 20 horas, no restaurante espanhol Pata Negra, na Praça da Espanha. Por uma década, também foi atração no tradicional Velho Madalosso, em Santa Felicidade, e no Beto Batata do Alto da XV.

Curiosamente, o músico conta não ter, atualmente, alunos de bandoneón. "É um instrumento muito difícil, que se toca às cegas. São dois teclados com ele fechado, e mais dois, com ele aberto. E como as teclas são todas laterais, não é possível vê-las."

Criado na Alemanha, para ser usado na música religiosa e na popular, o bandoneón foi levado à região do Rio da Prata na virada do século 20 por imigrantes, e acabou sendo incorporado pelo tango, tornando-se seu principal instrumento. Antes, o gênero era tocado com violino, violão, flauta, clarineta e saxofone. "O bandoneón substituiu os outros instrumentos de sopro e harmônicos, tornando-se essencial."

Alejandro diz que o sucesso do programa Tangueria tem a ver com a paixão que os brasileiros têm por essa expressão musical argentina, cujas origens são imprecisas, mas, segundo teoria defendida por ele, tem conexão com os três outros grandes gêneros do século 20: a música popular brasileira, o jazz e a música cubana, todos de raízes africanas, assim como o tango.

Saudade

Criado na região central de Buenos Aires, a poucas quadras do Teatro Colón, onde cresceu assistindo a concertos, óperas e balés, Alejandro, diz, em seu português com algum sotaque portenho mas gramaticalmente impecável, sentir falta das apresentações gratuitas em locais públicos da capital argentina. Ele diz ver como uma espécie de missão estreitar os laços entre a cultura de seu país natal e a terra onde resolveu viver, onde a música feita em outros países da América Latina é pouco ouvida. Esse intuito se materializou no projeto intitulado Encontros: Piazzolla e Villa-Lobos, apresentado em 2011, com lotação esgotada, na Capela Santa Maria, em Curitiba, com o Trio Santa Fé, formado por Alejandro, no bandoneón, Fábio Cardoso e Marsal Nogueira, piano e contrabaixo, respectivamente.

Em breve, por meio da Lei Municipal de Incentivo à Cultura, e já com a captação toda feita, a proposta, que constrói uma ponte entre as obras de Piazzolla e do compositor carioca Heitor Villa-Lobos (1887-1957), vai virar CD.

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