Comprar um disco da Orquestra Filarmônica de Berlim é o máximo que a maioria dos mortais vai conseguir fazer para se aproximar da formação erudita mais importante do mundo. Alguns poucos afortunados têm a chance de viajar para a Alemanha, pagar um ingresso de preço bem considerável e entrar na sala da mítica trupe de Karajan e Furtwangler. Agora, tocar na orquestra, convenhamos, é um sonho praticamente irrealizável. Ou não. Uma curitibana está lá para provar que tudo é possível.
Priscila Baggio Simeone, 25 anos, é uma típica garota da classe média. Tatuagem no braço devidamente escondida nos momentos em que a profissão de violinista exige unhas e cabelos bem cuidados, roupa descolada. Dificilmente alguém com imagens preconcebidas na cabeça olharia para ela e acreditaria que a moça chegou a um posto invejado por milhares de músicos sisudos, que ensaiam com seus arcos e cordas durante uma dezena de horas todos os dias.
Priscilla é uma dessas meninas-prodígio que se trancam no quarto para estudar de manhã à noite. Desde a pré-escola, estudou pelo método Suzuki, que ensina música a crianças que mal largaram as fraldas. Depois, passou para aulas tradicionais. Entrou na Orquestra Sinfônica do Paraná. Tinha tudo para fazer uma carreira de violinista e professora por aqui. Mas decidiu dar um passo adiante e foi estudar música na Alemanha. Neste ano, teve a melhor notícia que poderia esperar. Foi chamada para a Academia da Orquestra Filarmônica de Berlim.
Lá, como membro da academia, já teve chance de se apresentar com a orquestra e de ser regida pelo maestro britânico Simon Rattle, regente que sucedeu a série de mitos que inclui Karajan e Claudio Abbado. "É uma chance incrível. Mesmo quando você não está tocando, tem acesso às salas para assistir aos concertos. E pode trocar experiências com músicos de primeiro time", conta.
A trajetória de Priscila é sintomática do que acontece com os melhores músicos jovens do país. Depois de 10, 15 anos se dedicando a uma formação de primeiro time, vêem-se obrigados a uma escolha. Numa delas, ficam por aqui, perto da família e amigos, tocam em uma orquestra mal paga e complementam o salário de classe média com aulas para novos companheiros de profissão. Na outra, arriscam mais, perdem a raiz e vão em busca de um lugar onde sejam mais bem recompensados por seus esforços. Ou seja: Estados Unidos e Europa.
Ariadne Oliveira, uma jovem cantora curitibana que já ganhou cinco concursos nacionais de solistas acaba de tomar uma decisão semelhante. Ela ganhou uma bolsa Vitae para estudar em Milão, na Itália, onde vai se aperfeiçoar em Rossini e Mozart. "São os compositores que se encaixam melhor no meu tipo de voz e, aqui no Brasil, dificilmente eu teria chance de estudar esse tipo de repertório com mais profundidade", diz ela.
Ela sabe que sua vida em Milão não vai ser fácil. A bolsa cobre parte dos custos, mas ela vai precisar se virar para cobrir o resto. E vai começar tendo de arranjar já o dinheiro para as passagens, que não são pagas pela instituição. Se não tiver um patrocinador, talvez seja obrigada a desistir da bolsa. Seria uma pena, ela diz. "Para atingir um certo patamar, infelizmente ainda é necessário sair do país em algum momento da carreira", comenta.
Não são só jovens estudantes que decidem ir complementar seus estudos no exterior. O violinista Oliver Yatsugafu, da Orquestra Sinfônica do Paraná (OSP), já tem uma carreira sólida. Tem um nome na cidade e chegou a spalla uma das posições mais importantes no grupo. Entre os violinistas, ele só tinha uma função menos graduada do que a de Paulo Torres, o spalla principal da Sinfônica.
Oliver concorda que é impossível chegar ao nível de instrumentista internacional, estudando apenas no Brasil. Por isso, batalhou uma bolsa para fazer o mestrado em Técnica de Violino nos Estados Unidos. Conseguiu a inscrição na Universidade da Geórgia e está embarcando já neste fim de semana. No mínimo, ficará dois anos por lá. Mas já pensa em fazer doutorado. E voltar para cá apenas depois de terminar sua formação, para trazer ao Brasil a experiência e o conhecimento adquiridos no exterior.
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