Bady Assad faz tres shows na capital| Foto: Divulgação/Teatro da Caixa

Memória

Confira a seguir uma breve cronologia dos ataques terroristas que marcaram a história norte-americana e mundial no dia 11 de setembro de 2001 e cujas investigações inspiraram a obra O Vulto das Torres (a ser lançada no Brasil pela editora Companhia das Letras), do jornalista americano Lawrence Wright, recém-vencedor do prêmio Pulitzer.

• Na manhã do dia 11 de setembro, entre às 8h45 e às 10h10, quatro aviões comerciais foram seqüestrados nos EUA.

• Dois deles – um ocupado por 92 pessoas e o outro por 65 – atingiram as torres norte e sul do World Trade Center, na região central de Nova Iorque. Nenhum tripulante sobreviveu e as colisões provocaram a morte de milhares de pessoas que estavam nos prédios, além de membros das equipes de resgate. • O terceiro vôo, com 64 pessoas a bordo, foi lançado contra o Pentágono, sede do Departamento de Defesa americano, em Washington, provocando a morte de mais 190 pessoas em terra.

• O último avião seqüestrado, que contava com 45 pessoas a bordo, caiu no estado da Pensilvânia, matando todos os passageiros. credita-se que este vôo teria Washington como alvo e que os próprios passageiros teriam impedido a ação terrorista.• Ambas as torres do World Trade Center desabaram devido às explosões e a incêndios, assim como um prédio vizinho que integrava o complexo das Torres Gêmeas.

• Oficialmente, 2.479 pessoas, entre civis e membros das equipes de resgate, morreram devido aos ataques, atribuídos à organização fundamentalista islâmica al-Qaeda.

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A manhã de 11 de setembro de 2001 foi o começo de uma história para o jornalista norte-americano Lawrence Wright e a cena final para os seus personagens. O ganhador do Pulitzer 2007, anunciado na última segunda-feira, começa pelo fim: a morte de seus personagens é o início da investigação jornalística que lhe rendeu o mais ambicionado prêmio para repórteres nos EUA.

Rastreando os passos de um agente da unidade de contraterrorismo do FBI, John O’Neil, obcecado em localizar Osama bin Laden e vítima da queda do World Trade Center, Wright encontrou o atormentado herói de The Looming Tower (O Vulto das Torres, na tradução que será lançada pela Companhia das Letras).

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Ele conhece bem a cultura árabe. Wright, 59 anos, é formado pela Universidade Tulane, em Nova Orleans, Louisiana, e pela American University, no Cairo, Egito, onde ensinou inglês e fez pós-graduação em lingüística. Cresceu em Dallas, no Texas, mas começou sua carreira como jornalista escrevendo para a publicação The Race Relations Reporter, em Nashville, Tennessee, em 1971. Em 1992, passou a fazer parte da equipe da revista The New Yorker. É autor de seis livros, roteiros para cinema e tevê, e agora uma peça de teatro, baseada na investigação jornalística sobre a al-Qaeda. Nesta entrevista, em Nova York, ele diz o que espera de seus leitores brasileiros, que vai conhecer em julho, como um dos autores convidados da Festa Literária Internacional de Paraty.

Quanto tempo levou para escrever O Vulto das Torres? Lawrence Wright - Cinco anos. Comecei no dia 11 de setembro de 2001. Naquele dia enviei um e-mail ao meu editor e disse que ficaria exclusivamente dedicado a desvendar aquele ataque. Queria descobrir quem eram as pessoas que tramaram o atentado, quais os seus motivos, o que pretendiam com aquilo. Fiz uma extensa pesquisa sobre Osama bin Laden e seu mentor, Ayman Al-Zawahiri, entrevistando familiares e amigos do grupo que formou a al-Qaeda. Não prestei muita atenção aos livros que foram saindo: alguns eram bons, outros, nem tanto, mas nenhum desvendava a personalidade das pessoas que participaram do ataque. Era o que eu queria fazer.

E o making of do livro se transformou num show de slides.Transformei minha investigação num espetáculo chamado My Trip to al-Qaeda (na tradução, minha viagem a al-Qaeda). Não é só um show de slides, é uma peça, com texto que interroga o sentido do ataque e uma apresentação multimídia, com fotos, filmes e imagens de arquivo da minha pesquisa sobre a al-Qaeda e Osama bin Laden. Queria compreender não apenas quem eram aquelas pessoas e por que haviam feito aquilo, mas também as tremendas mudanças que aconteceram nos EUA depois do 11 de Setembro, como a tortura, as prisões de suspeitos sem direitos legais e sem julgamento.

Qual foi a resposta? Como este movimento de defesa dos EUA se tornou tão contrário às tradições liberais do país? Nós, americanos, ficamos muito traumatizados com o ataque e alarmados com a possibilidade de sermos atacados novamente. Mas não deveríamos sacrificar aquilo que nos distingue culturalmente. Um dos objetivos da al-Qaeda é tornar os EUA um país repressivo, isolar a cultura americana do resto do mundo. Esta seria a maior vitória deste grupo sobre os EUA.

Como se explica que o exército mais poderoso do mundo tenha sido até agora incapaz de prender Osama bin Laden?Somos uma sociedade aberta e, exatamente por isso, muito vulnerável. E na tentativa de nos tornarmos invulneráveis acabamos sacrificando alguns de nossos valores mais preciosos. Mas a história de como nos revelamos até agora incapazes de prender Osama bin Laden é a parte mais terrível de tudo isso, uma falha absurda da nossa comunidade de inteligência. E é uma falha que se segue a outras, como a incapacidade de perceber a desintegração da União Soviética ou de saber que Saddam Hussein não tinha armas de destruição em massa. O serviço de inteligência nos EUA é uma instituição catastrófica. Não estamos apenas enfrentando um grupo político, mas também a desmoralização das nossas instituições, que precisam ser repensadas. Isso vai demorar muito tempo para ser reparado.

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A falta de comunicação entre a CIA e o FBI foi uma das principais razões deste fracasso, não? Sim. Foi um dos pontos-chave que permitiram que o 11 de Setembro acontecesse. A CIA sabia da existência da al-Qaeda, conhecia seus objetivos, tinha conhecimento da presença de agentes da al-Qaeda nos EUA pelo menos 20 meses antes do ataque. Se o FBI tivesse sido informado pela CIA, teria todas as informações e a autoridade legal necessárias para prender o grupo e impedir o ataque. E o FBI não foi informado.

Como se explica isso? Isso se explica por uma cultura do segredo da informação, a má vontade que impede a comunicação entre as duas agências. Houve uma disputa entre o FBI e a CIA pelo controle das operações antiterrorismo. E o que é pior: as duas agências parecem incapazes de compreender o inimigo que enfrentam, de penetrar na sua organização e impedir seus ataques com um trabalho de espionagem e de inteligência investigativa.

Os EUA estão mais preparados hoje para enfrentar esta ameaça? Não. Nossas agências de inteligência ainda estão confusas, num processo de moralização. Não estamos mais seguros. Se você visitar o sétimo andar do quartel-general do FBI, a organização que fez a sua reputação por desbaratar a Máfia ou por enfrentar o IRA, o Exército Republicano Irlandês, o que você vê por lá? A memória de um tempo em que eles de fato conheciam as organizações que combatiam, e aprendiam a falar a linguagem do inimigo para melhor enfrentá-lo e destruí-lo. Hoje não é piada quando você vê um agente das organizações antiterroristas americanas prestar depoimento e dizer, sob juramento, que ele não conhece a diferença entre xiitas e sunitas. E o que é pior: ele diz que esta é uma questão irrelevante. Não é, de jeito algum. Significa que este agente não sabe algo que é muito elementar na cultura do inimigo que combate. Como poderá combatê-lo então? E eu digo isso não só do FBI, que ao menos é franco o suficiente para debater seus problemas, mas de todo o sistema de inteligência americano. Eles são derrotados pelo seu próprio preconceito. Há uma cultura do preconceito contra muçulmanos, contra sua religião, seus hábitos e costumes, contra sua língua.

Uma das linhas de investigação sobre as formas de financiamento da al-Qaeda leva à região da tríplice fronteira entre Brasil, Argentina e Paraguai, onde há uma grande comunidade islâmica. É possível que membros da al-Qaeda tenham levantado dinheiro com imigrantes da região. Qual a sua informação a respeito? Sei que alguns membros da al-Qaeda passaram por esta região. Mas não cheguei a investigar essas formas de financiamento de grupos terroristas na tríplice fronteira. Mas é importante dizer que o financiamento não é o principal de uma operação terrorista. Na verdade, o terrorismo não precisa de muito dinheiro. Os ataques da al-Qaeda são relativamente baratos: toda a operação do 11 de Setembro custou meio milhão de dólares e não é difícil levantar esta quantia. O terrorismo é barato no que se refere aos materiais e trabalha com voluntários fanáticos, que resistem a tudo por ideologia.

O seu trabalho no roteiro do filme Nova York Sitiada, de 1998, foi considerado uma antevisão do ataque às Torres. Como foi possível escrever aquele roteiro? Eu trabalhava numa investigação sobre o FBI na ocasião do filme, sobre terroristas. O World Trade Center havia sido atacado em 1993, e eles investigavam aquele ataque. Fiquei impressionado com a possibilidade de um novo atentado. O FBI estava preocupado com esta possibilidade. E o filme reflete esta ansiedade, naquele momento. Não foi realmente uma profecia. Foi um trabalho investigativo sobre algo que tinha possibilidades reais de acontecer.

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Um ataque poderia voltar a acontecer? Claro que sim. Esta semana houve um ataque da al-Qaeda na Argélia. Eles estão ativos e podem se reorganizar a qualquer momento. Vamos ver ataques como esses por muito tempo. Há uma nova geração de combatentes da jihad sendo formada. É difícil, para mim, imaginar hoje uma resolução deste problema.

O que podemos fazer para nos proteger? Temos que reorganizar os serviços de inteligência de modo que eles possam trabalhar sem preconceitos. Eles fizeram um péssimo trabalho para enfrentar estes grupos simplesmente porque se recusam a trabalhar com pessoas que poderiam penetrar e se confundir com o inimigo, para confundi-lo e desorganizá-lo. Outra coisa: é preciso uma grande aliança internacional contra o terrorismo. Os EUA estão isolados atualmente.

Mas este isolamento é uma conseqüência da guerra contra o Iraque, não?Sim, é verdade, mas também é verdade que existe hoje muito antiamericanismo pelo mundo. Os EUA não dão mais assistência aos seus aliados. Também há o fato de que vivemos agora um momento muito importante de princípio de entendimento entre palestinos e israelenses. Os árabes parecem estar com a esperança de que haja paz. É hora de aproveitar o momento precioso e fechar a porta ao conflito. Isso enviaria uma mensagem importantíssima de justiça para toda a comunidade islâmica, tão revoltada com as injustiças na Palestina. Representaria um sinal positivo que começaria a mudar a imagem dos americanos na região do Oriente Médio e em todos os países islâmicos.