Uma paixão amazônica

O cineasta paulista Beto Brant é praticante do cinema colaborativo. Diz acreditar que seus filmes, para darem certo, exigem um comprometimento intenso de toda a equipe. Levando essa filosofia para além do processo de realização, agora ele e os atores Camila Pitanga e Gustavo Machado têm percorrido o país, nas semanas que antecedem o lançamento de seu novo longa-metragem, Eu Receberia as Piores Notícias de Seus Lindos Lábios, que estreia em circuito nacional na próxima sexta-feira, dia 20 de abril.

Foi com esse espírito de "guerrilha", que o trio passou um dia em Curitiba, não apenas falando com a imprensa sobre o filme, mas o debatendo calorosamente – assista ao registro do encontro de nossa reportagem com eles.

VÍDEO: Asssita à entrevista com o diretor e os atores de Eu Receberia as Piores Notícias de Seus Lindos Lábios

Baseado no romance homônimo de Marçal Aquino, publicado pela Companhia das Letras, o longa de Brant, codirigido com Renato Ciesca, pode ser descrito como a história de um amor louco nas profundezas da Amazônia.

Mudanças

O diretor avisa que, embora o roteiro tenha autoria compartilhada com Aquino, parceiro do cineasta em todos os seus longas (leia mais no quadro acima), Eu Receberia as Piores Notícias de Seus Lindos Lábios não é uma versão literal do livro. "Fizemos mudanças na história. Não é mais um grande flashback do Cauby [o protagonista vivido por Machado], e a ação foi transposta da época do garimpo, da Serra Pelada, para um momento mais atual, em que a questão política mais palpitante é exploração ilegal da madeira."

Cauby, no entanto, continua sendo um protagonista exemplar na obra de Aquino, autor de outras histórias filmadas por Brant, como Os Matadores e O Invasor: ele é um homem à deriva, cujo passado nebuloso o leva, sem maiores explicações, a uma pequena cidade no coração do Pará. Lá, ele ganha a vida como fotógrafo, trabalhando para um pequeno jornal local e fazendo outros bicos, inclusive para a polícia.

A rotina sem muitos sobressaltos de Cauby dá uma reviravolta quando conhece e começa a fotografar Lavínia (Camila Pitanga), a jovem mulher de Ernani (Zé Carlos Machado), um pastor protestante que, segundo Brant, "estaria ligado tanto à Teologia da Libertação quanto ao Santo Daime."

De Lavínia, Cauby – e o público – também pouco sabe, apenas o seu estado civil, mas isso não impede que eles mergulhem em uma avassaladora paixão.

Cercados por uma natureza selvagem, mas ao mesmo tempo sob risco, algo que o filme está sempre a sugerir sem apelar para um discurso panfletário, Cauby e Lavínia são personagens trágicos, talvez fadados ao infortúnio, porque carregam muita dor no passado, do qual pouco falam. Mas, também, podem ser redentores.

"É interessante, porque, no livro, a química entre Lavínia e Cauby é evidente. Há sempre um tesão, um desejo muito forte entre os dois. Mas o romance descreve Ernani como um homem mais sisudo, autoritário. O filme mudou isso: Lavínia também o ama. Ela goza com ele. Mas, quando conhece Cauby, tudo muda."

Santarém

Beto Brant contou à reportagem da Gazeta do Povo que, para conseguir transpor para a tela a complexidade tanto da trama quanto da geografia onde ela se passa, conhecer a fundo Santarém, onde Eu Receberia as Piores Notícias de Seus Lindos Lábios foi rodado, era essencial.

Tanto que os preparativos se iniciaram meses antes das primeiras tomadas. "Precisávamos ser impregnados por aquela realidade." Gustavo Machado, para dar maior veracidade a Cauby, chegou a morar na casa onde vive seu personagem, e ajudou o diretor de arte, Akira Goto, na elaboração da cenografia, para que conseguissem o máximo de autenticidade.

Antes, ainda em São Paulo, começou a estudar fotografia. "Cheguei a fazer sessões de fotos da Camila", disse o ator, que já havia sido dirigido por Brant na minissérie, depois transformada em longa, O Amor Segundo Benjamim Schianberg. "Foi um salto no abismo sem paraquedas, mas com a rede de proteção de uma equipe entrosada e em sintonia", afirmou Machado.

Lavínia

Quando leu Eu Receberia as Piores Notícias de Seus Lindos Lábios, Brant sabia que, para que sua adaptação para o cinema desse certo, tinha de achar a atriz ideal. "Precisava encontrar uma mulher capaz de fazer você tremer e a Camila foi o primeiro nome que me veio à cabeça."

Ex-prostituta, abusada sexualmente pelo padrasto e dependente química, Lavínia encontra em Ernani, um ex-alcoólatra que buscou sua redenção na fé, um esteio, a salvação. E, com ele, embarca para a Amazônia. "Quando o Beto me propôs o projeto, já fiquei tentada. Depois de ler o livro e o roteiro, eu sabia que tinha de fazer o filme, mas o que me convenceu mesmo foi o método de trabalho colaborativo, a possibilidade de interferir no processo criativo que isso possibilita, e é tão raro hoje em dia."

Vencedora do prêmio de melhor atriz no último Festival do Rio, Camila não subestima a experiência: "Esse filme mudou minha vida. Fez com que eu me sentisse uma artista de verdade."

Cultura e Lazer | 5:24

Atores e diretor vieram a Curitiba lançar o novo longa "Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios".