A 27.ª Bienal de Arte de São Paulo, que termina no próximo dia 17, levou o tema Como Viver Junto às paredes do Ibirapuera, mas também o transportou para o mundo lá fora. Além de convidar projetos artístico-sociais de todo o mundo, a Fundação Bienal organizou pela primeira vez cinco núcleos de discussão sobre arte na periferia de São Paulo.
A curadora Lisette Lagnado foi buscar uma das obras da exposição na crise econômica argentina: o projeto Eloisa Cartonera, criado em 2003 pelo artista Javier Barilaro. O papelão juntado por catadores, muitos caídos da classe média, que perdeu renda após a declaração de moratória e suas conseqüências, foi transformado em capa para "editar" livros de poetas também provindos da exclusão. Por dois meses, o projeto foi adaptado para a realidade brasileira pela artista Lúcia Rosa, que ensinou três filhos de catadores de São Paulo a pintar. "Antes eu desenhava em casa para relaxar, mas agora pretendo continuar melhorando", diz Peterson Marques Emboava, de 18 anos. "Graças à Bienal, o projeto terá continuidade no Brasil", diz Lúcia.
Outra amostra de intervenção social vem da Suécia, país que abriga milhares de imigrantes do Leste Europeu e Oriente Médio. Alguns deles foram filmados pela conterrânea turca Esra Ersen, em 2001, durante lições de sueco, numa abordagem intimista que deixa claro o choque cultural e as barreiras que o pouco domínio da linguagem traz à adaptação em terra estrangeira.
Da China, o Long March Project retrata mais de mil perfis de pessoas comuns que fazem dobraduras de papel em casa, com foto e exemplar do trabalho manual. A exposição desses documentos ladeados em uma imensa parede provoca um impacto visual semelhante àquele que se deve ter ao desembarcar na populosa Pequim. Já foram estudados mais de 15 mil casos desde 2004, num estímulo para que tornem pública suas habilidades. Um dos entrevistados testemunhou: "É ótimo encorajar as pessoas a se aproximar mais da arte".
Mas são os projetos brasileiros aqueles que trazem a maior carga de denúncia. Do Rio de Janeiro, a grife de roupas Daspu, criada a partie do trabalho da ONG Davida com prostitutas, causou frisson ao promover um desfile de modelitos despudorados na abertura da mostra. Um vídeo documentou o momento em que a 27.ª Bienal abriu as portas para essa categoria social que costuma visitar espaços públicos menos badalados.
Outro trabalho em vídeo da artista baiana Virginia de Medeiros traz depoimentos de travestis, que falam de seus sonhos e dificuldades. Ao lado, uma projeção de fotos abre o álbum da família desses personagens, mostrando o relacionamento com os pais e a inocência da infância.
A reunião de inúmeras obras ligadas à ação social nesta Bienal lhe confere uma carga de engajamento incomum, ao mesmo tempo em que lhe traz um aspecto de "casa da mãe Joana" bem ao gosto do tema da vida em comum. "A estética proposta não é solene", define a curadoria no livro editado para a exposição.
Serviço: 27.ª Bienal de Arte de São Paulo (Parque do Ibirapuera, São Paulo). Até domingo, 17 de dezembro de 2006. De terça a sexta-feira, das 9 às 21 horas; sábados e domingos das 10 às 22 horas. Entrada franca.
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