O que dizer a respeito de um protagonista que devora polvos vivos e esmaga os crânios de seus inimigos com precisão científica? Os mais afobados vão responder que o personagem deve se tratar de mais uma extravagância do norte-americano Quentin Tarantino, acusado de estetizar e banalizar a violência no cinema contemporâneo. Não estarão completamente errados.
No penúltimo Festival de Cannes aquele mesmo que concedeu uma inesperada Palma de Ouro ao documentário Fahrenheit 11 de Setembro , Tarantino fez questão de convencer o júri oficial, presidido por ele, a premiar Oldboy com o Grande Prêmio, espécie de segundo lugar do certame. Não é de se estranhar. A produção coreana, dirigida pelo cultuado Park Chanwook, tem muito mais a ver com o cinema do diretor de Kill Bill do que o excêntrico personagem descrito no parágrafo acima possa sugerir.
Com uma narrativa fragmentada, que subverte a cronologia dos acontecimentos, Oldboy é uma daquelas obras cuja visão é obrigatória, mesmo para quem vá sair da sala de exibição falando mal de tudo. É violentíssimo, nada linear e não tem personagens empáticos, que despertem identificação ou piedade do espectador.
A trama tem início quando Dae-su (o excelente Choi Min-sik), um homem de negócios como milhões de outros espalhados pelo planeta, toma um porre homérico e acaba, sem saber o motivo, confinado a uma prisão particular. Na cela que na verdade mais parece um quarto de hotel duas estrelas ele tem como companhia apenas um televisor e a pintura de um homem parecido com Jesus.
Para não enlouquecer, Dae-Su faz exercícios físicos e começa a cavar, lasca a lasca, um buraco na parede, sabendo que a passagem não lhe garantirá a liberdade. Apenas como uma ocupação.
Depois de anos preso, ele é solto, também sem qualquer explicação plausível. O retorno à vida em sociedade, contudo, não é acompanhado por uma sensação de alívio. O ex-empresário tem apenas uma idéia em mente: descobrir os motivos de sua prisão e vingar-se do responsável pelos anos que perdeu enclausurado. Eventualmente, irá encontar seu algoz, que lhe dará o exíguo prazo de cinco dias para descobrir as razões de seu martírio.
Um mestre da composição visual, Park Chanwook faz de sua ode à vingança uma obra-prima da cinematografia moderna. Cada quadro, cena e seqüência trazem a marca de um diretor meticuloso, obcecado pela forma. O interessante é que todo esse detalhismo não é vazio. Está à serviço, também, de um notável contador de histórias, que seduz, confunde, surpreende e estarrece. Algo raro em tempos regidos pela previsibilidade.
Cinéfilos mais puristas vão, assim como já fazem com Tarantino, cobrar de Oldboy maior profundidade de intenções e transcendência. Não vão faltar aqueles que dirão, em coro, que Chanwook deveria dirigir comerciais e não cinema. Rabugice reacionária e conservadora, enfim.
Assim como acontece na filmografia de Tarantino, o trabalho do coreano parte do princípio de que, ao explorar os limites da forma, subvertendo as convenções do gênero "filme de ação", o diretor está, sim, fazendo uma contribuição valiosa ao fazer cinematográfico, revisitando, reinventando e implodindo fórmulas. Ele tem razão. GGGGG
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