DVD e Blu-ray
True Detective
R$ 394,90 (Blu-ray) e R$ 334,90 (DVD). Importado (a partir de 10 de julho).
Concepção
Pizzolatto deixou claro desde o início: a história deveria ser contada exatamente como ele a havia concebido, do contrário não haveria acordo. E foi isso que tornou True Detective singular: uma série fechada, um diretor e uma história por temporada e controle absoluto do roteirista do começo ao fim.
Perfil
Criador da série consumia tevê apaixonadamente
O responsável por True Detective é um escritor novato na televisão que só trabalha se tiver controle absoluto sobre os projetos em que se envolve. Entender quem é Nic Pizzolatto é relevante para entender a série que ele conseguiu fazer.
Pizzolatto nasceu no Texas mas foi criado numa área rural ao sul da Louisiana, cercado por personagens excêntricos, situações grotescas, pobreza, racismo e fanatismo religioso.
De uma família iletrada, o escritor não tinha acesso a livros, mas tinha uma televisão, que ele consumia apaixonadamente. Logo após se formar em Artes Visuais, decidiu se mudar para Austin, no Texas, após a morte do melhor amigo. Influenciado pelos livros de Faulkner e Lovecraft, decidiu voltar a estudar e se matriculou num programa de pós-graduação em literatura.
Já casado, começou a escrever contos e de pronto vendeu duas histórias que se tornariam o cerne do primeiro livro, uma coletânea de contos chamada Between Here and the Yellow Sea. O começo dos anos 2000 foi marcado pelo surgimento das séries televisivas de autor na HBO, como Família Soprano, The Wire A Escuta e Deadwood. Ao considerar que as séries eram mais instigantes que a literatura publicada na época, Pizzolatto flertava com a ideia de escrever roteiros para a tevê. A essa altura, já tinha outro livro pronto, o romance Galveston, com ambiente e preocupações semelhantes aos de True Detective.
Em 2010, Galveston recebeu o Prix du Premier Roman, dado pela Academia Francesa de Letras e, durante uma convenção literária, Pizzolatto foi sondado por pessoas interessadas que ele escrevesse algo para a tevê. Perguntaram se ele tinha alguma ideia? "Devo ter umas 30", respondeu ele. Menos de uma semana depois, ele já havia escrito e enviado dois episódios pilotos. Um deles fazia uso do que Pizzolatto guardava como o embrião de um próximo livro um romance policial clássico que retrataria 17 anos na vida de dois detetives do sul de Louisiana. Era True Detective.
No dia 12 de janeiro de 2014, 2,33 milhões de pessoas viram Rustin Cohle, o personagem de Matthew McConaughey na série de tevê True Detective, murmurar num carregado sotaque sulista norte-americano o seguinte monólogo:
"Somos coisas que operam sob a ilusão de ter um eu próprio e fomos programados para pensar que somos alguém quando, na verdade, não somos ninguém. A coisa mais honrável para nossa espécie é negar nossa programação. Parar de reproduzir. Caminhar, de mãos dadas, até a extinção, uma última meia-noite, irmãos e irmãs deixando tudo para trás."
A fala do detetive Cohle faz referência ao ensaio O Último Messias, escrito quase um século atrás pelo obscuro filósofo norueguês Peter Wessel Zapffe (1899-1990), propagador de uma linha de pensamento pessimista que entende os seres humanos como criaturas que nascem com uma habilidade superdesenvolvida (de compreensão, de autoconhecimento), que não se encaixa na concepção da natureza. Simplificando: o desejo humano de compreender questões como a vida e a morte não pode ser satisfeito pela natureza.
Para Zapffe, Cohle e também Albert Camus (o escritor e filósofo francês de origem argelina, das teorias absurdistas), a tragédia é que os seres humanos passam o tempo todo tentando não ser humanos. O que é um paradoxo.
Para desenredar uma trama policial, True Detective mistura então obscuras referências filosóficas pessimistas e absurdistas, de um pensador norueguês desconhecido e de um franco-argelino que comparou a existência humana ao mito grego de Sísifo (capturado, este sofreu a punição de empurrar uma pedra até o topo de uma montanha apenas para vê-la rolar ladeira abaixo e ter de começar tudo de novo, por toda a eternidade).
Complicado?
Há ainda O Rei de Amarelo, a entidade emblemática por trás dos assassinatos ritualísticos na série alusão ao livro homônimo de horror escrito por Robert W. Chambers, em que cada uma das histórias faz menção a uma peça teatral fictícia. Quem ler o texto além do segundo ato, acaba ficando louco. O livro acaba de sair no Brasil pela Intrínseca.
Não perca o fio da meada: outra referência é Carcosa, cidade fictícia que apareceu pela primeira vez num conto de Ambrose Bierce, de 1891, e também foi mencionada no livro de Chambers como um lugar misterioso e amaldiçoado. Na produção da HBO, ele serve como esconderijo onde ocorrem sacrifícios de mulheres e crianças.
Não só parece complicado para uma produção de tevê como de fato é: True Detective está abarrotado de referências estranhas. Publicações como The New York Times, The Wall Street Journal, Time, Forbes e outras tantas alardearam que se trata de uma revolução capaz de mudar o jeito como assistimos à televisão. Não mais como entretenimento superficial, mas como porta de entrada para uma experiência mais significativa. A série talvez represente artística e tecnicamente um golpe forte no duelo entre tevê e cinema pela primazia na cultura popular de qualidade.
Quanto mais densa a história, mais escrutínio ela tolera
Para se ter ideia do êxito comercial de True Detective, a série conseguiu nos oito episódios da primeira temporada manter a mesma audiência da última temporada de Breaking Bad (exemplo clássico de tevê aclamada tanto por público quanto por crítica).
O sucesso do seriado tem uma explicação: a internet. O telespectador é também um internauta, e porque a internet oferece às pessoas a possibilidade de compartilhar opiniões, divagar sobre teorias e conceitos, quanto mais denso for o produto consumido, mais escrutínio ele tolera. "Falar sobre", na internet, se tornou uma parte importante da experiência de ver tevê. E nisso True Detective foi cirúrgico porque soube usar referências que geraram inúmeras interpretações.
Na aparência, a história dos dois detetives aposentados do departamento de polícia de Louisiana, interpretados por Woody Harrelson e Matthew McConaughey, e da investigação de um assassinato sinistro que afetou suas vidas, tem elementos encontrados em qualquer série do gênero: cronologia fragmentada e cheia de flashbacks, detetives parceiros que não poderiam ser mais diferentes um do outro, superiores babacas e vilões associados a pessoas poderosas. Enquanto Martin Hart (Harrelson) é o típico pai de família suburbano e aparentemente bonachão, Rustin Cohle (McConaughey) é o pária solitário e pessimista com um passado obscuro. Os dois passam a maior parte do tempo dentro de um carro, rodando por vizinhanças barras-pesadas e trocando insultos um com o outro.
O que vemos no decorrer da série são dois indivíduos obcecados: um com validar a existência humana, outro com apontar o quão inútil essa tentativa é. Os dois cercados por vilões que atestam a banalidade do mal. Tudo embalado com longos diálogos de uma complexidade verbal mais comum a textos literários. Sobre os atores principais basta dizer que a última vez que se viu uma dupla tão afinada na tevê foi em transmissões de jogos de basquete nos anos 1990, quando Michael Jordan e Scottie Pippen jogavam juntos para os Bulls de Chicago.
Colaborou: Irinêo Baptista Netto.
Número de obras paradas cresce 38% no governo Lula e 8 mil não têm previsão de conclusão
Fundador de página de checagem tem cargo no governo Lula e financiamento de Soros
Ministros revelam ignorância tecnológica em sessões do STF
Candidato de Zema em 2026, vice-governador de MG aceita enfrentar temas impopulares
Deixe sua opinião