Segui um padrão ao longo dos artigos escritos durante o ano: qualquer que fosse o assunto, ressaltei o valor das virtudes cardeais (prudência, justiça, fortaleza e temperança), da responsabilidade individual, dos deveres e obrigações na vida em sociedade. Na contramão das preocupações hodiernas, fazia questão de deslocar o eixo do senso comum desvirtuado para aqueles elementos que enaltecem a condição humana e que nos permitem lidar com nossos dramas existenciais e com a maldade que reside no espírito de alguns homens.
Na política, objeto de meus estudos e análises, parece que aqueles cujo protagonismo sobressai carregam consigo a marca degenerada de um espírito degradado, corrompido. Suas ações são, por isso mesmo, o corolário dessa corrupção que transborda de seu interior para se manifestar como infâmia social ou violação do Código Penal. Como na famosa definição de Mussolini sobre o fascismo, nada fora da desonra, tudo dentro da desonra.
A política não é, entretanto, sede única das vilezas, solo fértil da baixeza. É, antes de tudo, instrumento imperfeito de ordenação e de equilíbrio social. E, como todo território de construção humana, nada garante a realização plena de seus objetivos, posto que se trata de gestão de meio e não de fim.
Trata-se esse, aliás, de um dos maiores equívocos a seu respeito, fonte profunda de expectativas frustradas: sendo a política caminho, cabe a quem a orienta, organiza, comanda, ser capaz de controlar as próprias paixões – aquelas sobre as quais David Hume tanto alertou em seus ensaios –, de não se deixar seduzir pelas forças negativas que corroem espíritos fracos, de não se fazer escravo das tentações pelo poder, pelo supérfluo.
O ano que passou, 2018, foi temporada crucial de transformações profundas. Foi um período de ebulição, turbilhão, catarse social e política, de manifestação daquela conciliação de ambiguidades apontada por Paulo Mercadante como traço português da nossa brasilidade. Foi um ótimo ano em vários sentidos, especialmente para o conservadorismo, que começa a ter, mesmo que de forma incipiente e reduzida, representantes qualificados.
Aqueles que descobriram recentemente o extraordinário mundo da política e das ideias que a preenchem e antagonizam reagiram como era de se esperar, como crianças que se machucam quando aprendem a andar.
Por mais brutal que possa ter sido (e ser) o comportamento de muitos, inexiste processo de maturidade sem os arroubos juvenis, porque é impossível envelhecer prematuramente, como queria Nelson Rodrigues, e sem a emergência de pretensões revolucionárias e reacionárias num país cuja tradição política autoritária forjou uma mentalidade que consiste em querer destruir tudo porque a desordem e a torpeza das elites parecem fundamentar o todo e não ser expressão de uma minoria com poder político e econômico. E é assim que, sem informação e formação, há quem só veja como solução uma intervenção militar ou uma revolução destruidora em vez de, por reformas, uma solução conservadora.
Mas, apesar da aparência de baixeza reinante que choca, que horroriza, nem só de infortúnios vive a nossa sociedade e a nossa política. Como somos treinados a odiar o nosso país, temos um radar refinado para detectar torpeza e uma antena quebrada para identificar retidão. Nosso espírito tornou-se incapaz, porque anestesiado por toda sorte de violência e indignidade cometida por poucos, de perceber a beleza disponível, a dignidade sediada no coração e nos atos de boa parte da população. Por treinamento e exposição aos infortúnios, nos tornamos uma espécie de oncologista que, diante da beleza complexa do corpo humano, só tem olhos para os vários tipos de câncer.
Sim, estamos experimentando neste momento um processo de mudança, um momento de transição, cujas oportunidades e possibilidades superam os desafios, as dificuldades. Seja na reforma social, que começa numa reforma interna em que a liberdade individual é conquistada a duras penas, seja na transformação política, nada avança, nada muda substancialmente, nada é transformado para melhor substantivamente, se cada um de nós não assumir as responsabilidades, os deveres, as obrigações que nos cabem. Sim: é árduo, doloroso, penoso, mas igualmente possível e redentor.
Que 2019 seja um excelente ano, que seja a antítese do título do meu livro: um ano de deveres máximos e direitos mínimos. Fiquem com Deus e até a próxima!
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