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Emenda pior que o soneto

Foto: Tatiana Kharitonova/Free Images (Foto: )

Uma das promessas de campanha do Bolsonaro – talvez a mais importante dentre elas – era a liberalização das restrições absurdas impostas pelos governos esquerdistas à posse de armas de fogo, de que já tratei em artigo recente. Por causa disto, o decreto publicado esta semana era ainda mais ansiosamente esperado pelo seu eleitorado, que com razão se entusiasmou ao vê-lo fazendo uma arminha com os dedos, que qualquer outra medida do governo. As versões preliminares do decreto que vazaram para a imprensa mereceram o justo repúdio da maior parte dos ativistas da liberação das armas de fogo (que, ao contrário daqueles que a esquerda costuma chamar de “ativistas”, como o felizmente deportado Battisti, não atiram em ninguém). Chegou a haver um bate-boca internético em que, em declaração lastimável, o Primeiro-Filho Carlos Bolsonaro mandou que calasse a boca Benê Barbosa, o mais ativo militante (que também, ao contrário dos de esquerda, não invade nem mata) pela liberalização das armas no Brasil. Ainda teve o desplante de dizer que Benê não sabia do que estava falando. Quem se dedicava à coprofonia, no entanto, era o Bolsonarinho.

Ora, a versão final do decreto saiu ainda pior que as versões vazadas. Em vez de melhorar, de liberalizar, de reconhecer o direito natural, ele piorou a situação dos interessados em comprar uma arma. A única parte boa do bolso-decreto foi um típico “jeitinho” brasileiro em que foi retirado dos delegados de Polícia Federal o poder de decidir arbitrária e discricionariamente se aceitavam ou não a justificativa de “efetiva necessidade”, ao introduzir um rol (igualmente arbitrário) de situações de efetiva necessidade, dentre as quais morar em qualquer unidade da Federação que, estatisticamente, tenha uma determinada quantidade de homicídios para cada 100 mil habitantes. A escolha de homicídios e não, por exemplo, de roubos ou estupros tampouco faz algum sentido, a não ser pela facilidade do acesso aos dados. Foi, literalmente, qualquer nota.

E mesmo esta solução arbitrária e na base do jeitinho “resolveu” um problema que na prática dificilmente ocorria. Ainda que muitos, a maioria mesmo, dos delegados da PF encarregados do assunto negassem o direito de porte de armas aos solicitantes, poucos negavam o de posse. E o resto do bolso-decreto só piora a situação.

O problema de base, o problema maior e que está por trás de tudo isso, até mesmo das leis que não podem ser modificadas por decreto e que limitam tremendamente o direito dos cidadãos, é uma fantasia incentivada pela esquerda, que vê nas armas de fogo uma espécie de diabinho de aço que mata pessoas e controla mentalmente seu proprietário, transformando-o num monstro assassino a seu maléfico serviço. A esquerda brasileira, nisso como sempre imitando servilmente a esquerda americana, criou um tabu em torno das armas de fogo que beira a idolatria (pois há ídolos assassinos; para eles, armas de fogo seriam talvez avatares de Kali, a deusa da destruição…).

A esquerda lançou e mantém nas partes da população sob sua influência uma mentalidade segundo a qual pessoas jamais são culpadas. O culpado é a sociedade, é a arma de fogo (na mão do cidadão de bem, claro, porque na mão do criminoso ela não representaria ameaça real alguma e faria parte do pacote rousseauniano pelo qual a sociedade teria corrompido aquela pobre vítima sua que, por ser oprimida, estupra, mata, rouba e trafica crack), é a publicidade, é a Coca-Cola ou o Prozac, são as estrelas, é a mãe freudiana… é o que se quiser, menos a pessoa. Ninguém tem culpa: “foi o diabo que me fez agir assim” ganhou na esquerda versão igualmente ridícula ao fazer dos meios (as armas) os sujeitos. Assassinatos são péssimos. Assassinos são culpados. Os meios que usam (armas de fogo, facas, as próprias mãos nuas, cordas ou pedaços de pau) são tão culpados quanto o chão em que as pessoas pisam é “culpado” pelos atos delas.

Afinal, armas de fogo são ferramentas, pura e simplesmente. Exatamente como alicates, chaves de fenda, furadeiras e outros objetos que a testosterona que flui em nossas veias faz achar interessantes. Quem não a tem, no mais das vezes, aliás, não se interessa muito por eles. Armas de fogo são ferramentinhas que servem para jogar longe um pedacinho de chumbo rodopiante (os rodopios servem para que ele se mantenha em trajetória estável), não mais nem menos que isso. Assim como chaves de fenda servem para desaparafusar parafusos do tamanho adequado a elas e chaves phillips servem para desaparafusar outro tipo de parafusos, armas de fogo servem para jogar o bendito pedacinho de chumbo longe. Na prática, para pessoas decentes, a utilidade de jogar pedacinhos de chumbo à distância é dupla: ou se o faz para abrir buraquinhos em pedaços de papel ou latinhas (e outras modalidades de tiro ao alvo: quando eu era jovem e atirava muito, eu colhia frutas do alto de árvores grandes atirando nos talinhos para que elas caíssem), ou se o faz para intimidar ou mesmo tirar de ação um agressor poderoso.

Este segundo uso, em outras palavras, é o de equalização entre os seres humanos. Como dizem os americanos, “Deus criou o homem e o coronel Colt [inventor do revólver de repetição] tornou os homens iguais”. Com uma arma de fogo, uma mocinha de 40 quilos é exatamente igual a um rapagão fortíssimo que a estrangularia com uma mão só, a estupraria ou faria qualquer outra barbaridade com ela sem esforço algum. Com uma arma de fogo, um senhor idoso pode afastar cinco galalaus mal-encarados de sua propriedade. Com uma arma de fogo na mão da vítima em potencial – como se vê na clássica cena do filme Caçadores da Arca Perdida –, o treino em artes marciais não faz mais de um fortuchinho um super-homem.

Na imensíssima maioria das vezes, neste seu segundo uso, a arma de fogo não chega a ser usada para jogar seu pedacinho de chumbo no atacante. Não é necessário; afinal, a perspectiva de morrer ou ficar gravemente ferido normalmente já chega para dissuadir um mau sujeito de fazer a barbaridade que preparava. Quando a mocinha ou o senhor idoso saca a arma, o galalau mal-encarado retira-se. E pronto, acabou-se. É assim que a banda toca em quase todos os casos. Em alguns poucos, há a necessidade de dar um tiro para cima ou para baixo, apenas para deixar mais claro o perigo para o assaltante, que enfia então o rabo entre as pernas e sai atrás de uma vítima sobre a qual ainda tenha preponderância física. Assim, mais uma vez, pronto e acabou-se: dissolveu-se a situação de perigo, e nenhum crime foi cometido. Isto evidentemente, não é refletido nas estatísticas de crimes. Afinal, elas não têm como apresentar números sobre crimes que não chegaram a acontecer, e ninguém que evitou assim um crime há de querer perder horas numa delegacia para fazer um Boletim de Ocorrência que só serviria para alimentar um banco de dados.

Mas como, para a esquerda, nem o crime é crime (afinal, em sua visão invertida das coisas, o assaltante ou estuprador é uma pobre vítima da sociedade, e sua vítima é na verdade seu opressor e merece tudo o que venha a acontecer com ela), nem as pessoas têm culpa (a não ser, claro, a culpa social coletiva de fazer parte das famigeradas “estruturas de opressão”), cai tudo em cima da arma. Armas viram coisas malignas, seres maléficos que criam patinhas e matam as pessoas sem que ninguém encoste nelas, avatares do mal que controlam seus proprietários e os levam a matar os outros. Essas coisas. Delírios ideológicos que negam completamente a realidade das coisas, em que há gente decente e gente ruim, em que as pessoas escolhem o que vão fazer, em que uns são mais fortes e outros mais fracos fisicamente, psicologicamente, moralmente. Cheguei a ler, espantado, um texto numa rede social que dizia que armas em casa fazem com que, para a esposa, o lar seja o lugar mais perigoso de estar, pois seu marido pode usá-las contra a pobrezinha. Ora, pitombas, se o marido é esse monstro, bastar-lhe-iam as próprias mãos para esganar sua pobre e sofrida esposa. Já ela, tendo acesso à mesma bendita arma (pois, se a arma está em casa, é de quem pegar primeiro…), torna-se igual dele, podendo sair, chamar a polícia, mandá-lo morar na casa da vagabunda com quem ele está saindo, voltar pro colo da mãe, essas coisas que mulher zangada faz. E a situação está no momento resolvida, sem que ninguém seja esganado, furado a bala ou morto.

Assim, o problema social maior é essa demonização das armas, esse tratamento legal diferenciado de um tipo de ferramenta que é baseado nos delírios idolátricos de um movimento que nega a moral e quer eximir de culpa quem realmente tem. Este decreto, para tristeza de qualquer pessoa de bom senso, continua exatamente no mesmo trilho, tratando as armas como coisas monstruosas que se deve tirar da mão das pessoas, como objetos demoníacos saídos de um filme ruim que fazem com que pais de família se transformem em assassinos e rapazotes magrelas estudantes de fagote virem estupradores. As medidas que estabelece, além de manterem essa demonização de que tratamos, ou seja, de continuarem o problema, pioram tremendamente e burocratizam ainda mais o acesso legal ao direito natural que é ter uma arma de fogo (ou um alicate, uma bicicleta ou um sapato).

A primeira ideia de jerico do decreto é que as armas – essas coisas malignas – têm de ficar escondidas. Escondidas do jeito que um burocrata em Brasília acha bom, não do jeito que o dono da ferramenta quiser: “na hipótese de residência habitada também por criança, adolescente ou pessoa com deficiência mental, [o coitado que só quer comprar uma ferramenta deve] apresentar declaração de que a sua residência possui cofre ou local seguro com tranca para armazenamento”. Como a infeliz legislação brasileira já proíbe cortar o cano das espingardas, o tal do cofre tem de ser enorme se o cidadão quiser comprar uma. Além disso, claro, a casa é do dono dela, a ferramenta idem. Ele tem todo o direito do mundo de guardá-la onde quiser, de enfiá-la onde lhe der na telha.

Eu acrescentaria ainda que, em termos pedagógicos, nada pode ser pior que fazer da arma que se tem em casa um tabu (continuando, de uma certa maneira, a visão idolátrica da esquerda). Se a criança não pode mexer na arma, não pode ver a arma, não pode chegar perto dela, não pode nem sequer respirar o mesmo ar que ela, é claro, é óbvio, é evidente que a arma será para o petiz algo fascinante. Já se a criança é levada pelo pai para atirar e sente na mão o coice do tiro, e fica com o ouvido zunindo com o barulho dele etc., ela terá tanto interesse em atirar quanto em dirigir o carro do pai (cujas chaves porventura poderiam ser também sempre trancadas em cofres, se depender das ideias de jerico dos burocratas). Este interesse infantil nas armas, aliás, provavelmente será menor que o de dar umas voltas sozinho no carro paterno, porque o coice e o barulho da arma ser-lhe-ão desagradáveis. Ela preferirá, para brincar junto (pois tiro ao alvo é uma delícia de brincadeira!), uma espingarda de chumbinho ou, no máximo, uma pistola ou carabina .22. Quanto às pessoas com deficiência mental, compete a seu cuidador decidir o que é melhor fazer acerca de armas, serras elétricas, furadeiras, martelos, facas de cozinha, giletes, venenos pra rato e mosquito, cordas e o que mais houver de perigoso. Cada cuidador sabe as limitações da pessoa de que cuida e faz o que julgar apropriado. Não é um burocrata em Brasília que pode dar uma regra geral.

Mais ainda: eu jamais botaria uma arma num cofre, assim como jamais deixaria uma arma descarregada. Uma arma descarregada não é uma arma: é um pedaço de metal inerte, que não tem uso algum senão o de peso para papéis. E uma arma num cofre é uma arma fora de acesso imediato, o que faz com que ela perca sua utilidade em caso de emergência. Trancar uma arma num cofre faz exatamente o mesmo sentido que trancar nele um extintor de incêndio (aliás, dá pra morrer respirando o que sai de alguns tipos de extintores).

A segunda besteira do decreto é a absurda diminuição em 33% do número de armas de fogo que se pode ter legalmente. Hora, já é uma imbecilidade haver um limite: afinal, qual é a diferença entre um sujeito com quatro armas, com seis armas ou com 20? Ele só tem duas mãos. Não vai atirar com todas ao mesmo tempo. Apenas na ótica idolátrica que vê armas como agentes do mal uma imbecilidade dessas faria algum sentido. Antes, a lei permitia duas armas curtas (como pistolas e revólveres), duas carabinas e duas espingardas. Agora ela restringe a quatro armas de tipo não especificado (e isso inclui calibres que em muitos países nem sequer são considerados arma de fogo, como o .22, calibre adequado para matar ratos e outras pragas).

Aí me vem gente perguntando “quatro armas não bastam?!”. Suspiro eu e pergunto de volta: “bastam pra quê, cara-pálida?”. Armas, repito e tripito, são ferramentas. São coisas que servem para fazer coisas. Seu dono é que sabe de quantas “precisa”, ou quantas quer (pois quem realmente precisa de algo, fora comida, bebida e teto?). Eu não tenho televisor. Não vejo uso para tal objeto, e certamente não preciso dele. Isso por acaso me daria direito a restringir a posse de televisores ou determinar limites de número (no máximo duas tevês por residência!)? Já outras pessoas não conceberiam a ideia de viver sem tevê. Ora, é um direito delas, que nem eu nem ninguém mais pode negar. Aliás, diga-se de passagem, televisores são bem mais perigosos que armas: eles matam a alma!

Do mesmo modo, ainda, minha esposa tem uma fixação em sapatos. Ela já chegou, à moda Imelda Marcos, a ter centenas de sapatos. É uma fixação muito comum entre mulheres, aliás, exatamente como a fixação em armas é comum entre os homens. E tanto sapatos quanto armas têm sua utilidade e são necessários em algumas ocasiões e desnecessários em outras. Galochas de borracha são desnecessárias em festas finas, e sapatos de salto não servem para nada na lama. Mesmo assim, eu viveria perfeitamente com quatro pares de sapatos, ou até menos. Já minha mulher – que certamente também sobreviveria, ainda que triste, a um eventual desaparecimento de todos os sapatos da face da terra – prefere comprar outro hoje, outro ontem e outro amanhã. Direito dela, exatamente como é meu direito – negado pelo bolso-decreto – comprar as armas que eu quiser.

Afinal, se eu quiser fazer tiro-ao-alvo num barranco do sítio, vou querer uma arma de calibre pequeno, cuja munição é mais barata e cujo recuo é menor. Essa arma, contudo, seria péssima para a defesa pessoal ou da casa. A arma que vou preferir portar (sou policial aposentado; a mim não é negado este direito, que o bolso-governo continua negando à maioria da população) ao sair de bermuda e camiseta (pequena, fina, que não apareça através da roupa) certamente será diferente da que preferirei se sair de casacão num dia de inverno (com cano mais longo para maior precisão, mais larga para caber mais munição etc.). Para defender minha casa preferirei, claro, outra arma ainda (uma espingarda), mas, se a ameaça estiver lá na porteira do sítio, uma carabina seria mais efetiva. E por aí vai. É tão absurdo restringir o número das armas quanto o número dos sapatos. Não é questão de “precisar” ou de “bastar”. Menos ainda teria o Estado, logo o Estado (esse coletivo de burocratas e políticos), o direito de dizer quantas “bastam” ou “são necessárias”, como se pudesse prever todas as situações pelas quais passam as pessoas.

Outra barbaridade ainda inserida no decreto é acerca do registro das armas. Já é péssimo que exista este registro, que não tem absolutamente nenhum bom uso e tem muitos péssimos usos. Convenhamos: se os comunistas houvessem conseguido, como queria José Dirceu, conquistar o poder (coisa muito além de estar no governo de que foram felizmente defenestrados há pouco), este registro serviria para desarmar a população de bem, exatamente como um semelhante na Alemanha serviu a Hitler. E o decreto, apesar de alongar o prazo de validade do registro, ainda o mantém. Ou seja: além de ter de registrar cada arma com um Estado enxerido que restringe indevidamente seu número e nos manda comprar cofres inúteis, esse registro tem de ser refeito a cada dez anos. E o decreto ainda piora o registro ao tornar obrigatório que seja refeito todo o processo burocrático absurdo do registro inicial. Antes bastava ir à PF e pagar um dinheirão para renovar o registro. Por sorte, renovei há pouco os registros de todas as minhas armas, ou teria de refazer todo o caríssimo e dificílimo processo inicial.

Pois este processo continua intocado, com a exceção do “jeitinho” dado na declaração de efetiva necessidade, que era o ponto em que um delegado da PF poderia arbitrariamente negar a um cidadão o seu direito de ter uma ferramenta. Para comprar algo que não é mais perigoso ou “mau em si” que um facão ou uma lata de veneno de rato, o cidadão precisa apresentar certidões de antecedentes criminais da Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral (!), fazer um exame psicotécnico (!!), apresentar documento comprobatório de ocupação lícita (!!!) e de residência certa (!!!!) e comprovar capacidade técnica para o manuseio da arma (como se quem já soube mexer numa arma fosse deixar de saber). Isso evidentemente é caro e muito trabalhoso, além de ser completamente desnecessário. E a obrigatoriedade dada pelo infeliz bolso-decreto de refazer essa via crúcis a cada dez anos é uma péssima notícia para quem quer que seja que goste de armas. Eu gosto, assim como minha esposa gosta de sapatos. E se o governo começasse a fazer essas mesmas exigências com sapatos, será que veríamos passeatas de mulheres furiosas? O que teríamos seria a desobediência civil, exatamente como acaba acontecendo em relação às armas.

E, finalmente, é necessário desfazer outro engano absurdo, outra falácia que vem sendo usada pela esquerda para facilitar a escravização da população: a liberação (que não ocorreu, como visto acima) do acesso a armas de fogo não tem como objetivo imediato a diminuição da criminalidade (ou, como a esquerda prefere, da “violência”). Trata-se simplesmente do direito de cada ser humano de ter acesso às ferramentas necessárias para proteger sua vida e seus bens. Assim como não se pode restringir o acesso a chaves de fenda (que podem ser usadas para matar e arrombar portas, aliás), menos ainda se pode restringir o acesso àquilo que serve para defender nossa própria vida. Se houver uma diminuição da criminalidade em decorrência de uma liberação (que não ocorreu!) do acesso a armas, este será um benefício social indireto: se 10% das estudantes universitárias tiverem uma arma na bolsa, é muito provável que diminuam ou mesmo acabem os recorrentes estupros nos câmpus universitários brasileiros. Mas o objetivo da liberação não é acabar com esses estupros, e sim deixar de negar às moças a possibilidade de elas mesmas se precaverem contra eles.

Tratar a liberação ainda inexistente do acesso a este tipo de ferramenta como uma solução para o problema da criminalidade é uma falácia. É como dizer que o acesso a extintores de incêndio tornaria desnecessário o Corpo de Bombeiros, ou que o acesso a guarda-chuvas e condicionadores de ar fosse um modo de combater as mudanças climáticas ora em curso. Ter (e portar!) uma arma de fogo é simplesmente um direito pessoal inegável, pela simples razão de que há diferenças físicas entre as pessoas, mas não há diferenças na sua dignidade humana. Rapazes serão sempre mais fortes que mulheres e idosos, mas todas estas três categorias têm o mesmíssimo direito de andar em paz pelas ruas. Se não há acesso a armas de fogo, os rapazes são automaticamente os mestres das mulheres e dos idosos. E dentre eles, assim como dentre as moças e dentre os idosos, há um pequeno porcentual de pessoas más, de psicopatas, de predadores, de agentes antissociais. Se houvesse (e, repito, não há) este acesso, todos tornar-se-iam iguais e a dignidade dos mais fracos não poderia ser negada pelo estupro ou roubo que os maus dentre os rapazes podem perpetrar pela simples presença intimidatória. Um rapaz forte não precisa de arma para estuprar uma moça ou roubar um idoso. Mas a moça e o idoso precisam delas para impedir que sejam vitimados. Danem-se as estatísticas. Estamos falando de um direito humano natural, do respeito à dignidade de cada um.

Resumindo, a emenda foi muito pior que o soneto. O direito ao acesso a armas de fogo continua restrito, e em muitos aspectos está mais restrito que antes. A única diferença foi a “solução” de um problema na prática inexistente. Foi um tiro n’água do novo governo, que espero sinceramente seja retificado em breve. Caso contrário, o que teremos será mais um caso clássico de estelionato eleitoral, em que um político é eleito prometendo uma coisa e faz seu oposto.

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