O isolamento social virou uma realidade não planejada em nossas vidas e, em poucas horas ou dias, os cuidadores primordiais (seja mãe, pai, avós, tios ou parentes próximos de crianças) se viram trancados em casa com seus pequenos.
Não foi como no período de férias escolares, no qual podemos nos organizar e planejar atividades diversas e externas. De uma hora para outra, cá estamos nós em casa (aqueles que podem) com nossos pequenos com muita energia em um momento em que os adultos estão vulneráveis com a economia dos seus lares e da nação.
Nesse momento de recolhimento, a Casa Poppins (tradicional espaço de brincar localizado em Curitiba) aderiu ao fechamento do espaço mas, para seguir cuidando da infância, pensamos em alternativas para estarmos juntos, mesmo que separados, compartilhando com vocês dicas simples de como transformar seus dias com os pequenos em algo prazeroso e leve.
Sugerimos três passos:
Espaço: repense sua casa como um local brincante;
Tempo: observe o “tempo interno” dos pequenos;
Brinquedos: oferte possibilidades “não estruturadas” para o brincar.
Minha casa é um lugar brincante?
Menos não, mais sim. Independentemente do tamanho da sua casa, é possível transformar este espaço em um rico campo de exploração para a criança, sem nenhum recurso externo. A principal pergunta para reflexão é: quanto este pequeno pode se apropriar da casa? Ele pode brincar em todos os ambientes ou o adulto espera que ele se limite a apenas um cantinho, que normalmente é seu quarto?
Onde ele vai criar? História, arte, movimento, ler e se concentrar. Antes ele fazia isso lá fora, mas e agora? Quanto de “não” você encontrou nesta lista? Reflita.
Um dos principais motivos de irritação infantil é o mundo de “nãos” que a criança vive em casa por falta de um ambiente pensado para ela. E quanto mais “não mexe nisso”, “não pega aquilo” ela ouvir, mais irritada irá ficar ou mais reclusa a jogos eletrônicos estará. Isso não quer dizer ter um playground instalado no meio da casa e nem que a exploração infantil não tenha que ter limites, como, por exemplo, a proibição de pintar as paredes da casa.
Você pode não gostar que seus filhos pintem a sala da casa, mas em qual canto da casa ele terá a permissão de criar arte? Por vezes, só um papel kraft colado na parede resolve esta necessidade.
A questão primordial é permitir que a criança possa se movimentar pelo ambiente, com possibilidades de brincar. Veja algumas dicas!
Possibilidades de brincar (atenção para as idades das crianças frente aos exemplos):
- Cozinha: armário de potes de plástico ou panelas;
- Lavanderia: cesto de grampos de roupa;
- Sala: caixas de descobertas. Estas caixas podem conter jogos de montar, livros, etc;
- Quarto: na sua estante de livro, tenha títulos recomendados para a idade da criança;
- Banheiro: gaveta com brinquedos de plástico para o banho;
- Dispensa: latas que possam ser empilhadas;
- Sala de jantar: que tal uma cabana embaixo da mesa? Uma simples toalha ou lençol cria um mundo inteiro de possibilidades lá embaixo.
- Corredor: pode virar campo para jogar bola? Ou quem sabe um desafio de obstáculos?
Permita que sua casa ofereça mais “sim” para os pequenos e eles, com certeza, vão fazer grandes descobertas e se sentirão menos ansiosos. Observe nos primeiros dias quanto “não pegue isso, não mexa aí, aí não pode” você disse e repense se estas coisas podem mudar de lugar. Quanto menos preocupação você tiver com isso, mais harmoniosa ficará a relação de vocês.
Brincar grande e brincar pequeno: tempo interno
Um dos grandes segredos para conduzir o dia com os pequenos é observar qual é a necessidade deles. Estão entediados ou estão super-estimulados e cansados?
O “mundo ideal” é observarmos o comportamento deles para conduzirmos da melhor forma a distribuição das atividades do dia. Se uma criança passa um longo período sem a possibilidade de extravasar toda energia acumulada, ela com certeza irá demonstrar sinais de irritação, birra, descontentamento, etc.
E o contrário também é verdade... Se ela ficar sob os efeitos de muitos estímulos o tempo todo, apresentará os mesmos sintomas. É comum que, nestes momentos, ocorram as brigas entre os irmãos ou excessiva necessidade de chamar atenção dos adultos ao redor, por exemplo.
Nossa dica neste caso é: intercale atividades de queima de energia, como correr (se possível), pular no sofá, brincar de esconde-esconde, etc, com atividades de mais concentração, como jogos de montar, massinha, colorir ou uma brincadeira mais dirigida.
Na maior parte dos casos, provavelmente você terá muitas outras demandas para fazer no dia, que não seja estar disponível para o brincar o dia todo (e nem recomendamos). Então, um grande artifício é você convidar a criança para ajudar nas tarefas da casa.
No início, pode parecer que tudo ficará mais difícil com a “ajuda” deles, mas o prazer de cuidarem juntos do espaço coletivo e de se sentirem úteis naquela estrutura familiar, fará toda diferença. É só uma questão de costume, para ambos.
Vamos organizar a casa? Liguem uma música e brinquem nesta tarefa tão rotineira. Precisa fazer algo mais demorado na cozinha? Peça para a criança organizar os talheres da gaveta ou lavar os legumes. Todo mundo sai feliz!
Possibilidades de brincar grande:
- Ofertar um lençol (fazer pequenos furinhos) para que sirva de rede de objetos como bola. Cada um segura as pontas do lençol, joga a bola no meio e ninguém pode deixar cair.
- Com uma corda fazer “cobrinhas” no chão para a criança pular. Não tem corda? Emende cintos!
- Sentados, cada um de um lado da sala, pernas abertas... Joga a bola para correr no chão mesmo (para não fazer barulho no vizinho, por exemplo) e fazer “gol” entre as pernas do outro.
- Brincar de “estátua”.
- Dar banho nos bichos de pelúcia no balde.
- Mímica.
- Andar sobre os pés.
- Desenho no vapor do box.
- Corredor de dança.
- Desenhar amarelinha no chão com giz ou fita crepe.
- Fazer circuitos pela casa com cadeiras, mesas e outros objetos.
- Morto Vivo.
- Bola de sabão.
Possibilidades de brincar pequeno:
- Montar uma cabana.
- Desenhar e pintar.
- Ler uma história.
- Ofertar revistas ou jornais velhos que possam ser recortados e colados.
- Blocos de montar ou quebra-cabeças.
- Construir novos brinquedos com lixo reciclável.
- Gol de dedos: com as mãos você faz as traves apoiando o dedão na mesa, uma tampinha de garrafa é a bola.
- Brincadeiras de mão, como, por exemplo, adoleta.
Brincadeiras simples, que não requerem preparo, mesmo que feitas repetidas vezes, continuam fazendo sucesso!
Brinquedo que não brinca sozinho
Para nós, adultos, é apenas um brinquedo, mas para a criança é uma ferramenta de formação de seus corpos, é alimento para sua alma. Que alimento estamos dando para a criança, para seu brincar?
A primeira coisa que vem à cabeça é aquele baú de brinquedos modernos, supercoloridos, que piscam, falam, andam sozinhos, são caros e que, provavelmente, estão vinculados a alguma personagem de desenho animado famoso. Pensamos quanto brinquedo meu filho tem, mas acaba não brincando com nada por mais de 5 minutos. Sabe por quê? Estes brinquedos são o que chamamos de “brinquedos estruturados”, normalmente eles têm uma única função entediante de brincar.
A “sorveteria de massinha” só faz massinha em formato de sorvete! O caminhão de bombeiros que tem três botões, um para fazer a escada magirus subir, outro para ligar a sirene e outro para o caminhão ficar andando de um lado para o outro com a sirene ligada e todas as luzes piscando.
O caminhão é todo vermelho e colorido, com infinitos detalhes. O que a criança irá fazer com um brinquedo desses? Apertar botões e ficar parada, olhando o caminhão se mexer sozinho.
Quanto tempo a criança ficará entretida com esse tipo de brinquedo? Provavelmente muito pouco. Então, se você está preocupado que não tem brinquedos o suficiente na sua casa, respire! O mais legal da infância é inventar brinquedos com tudo aquilo que não é brinquedo!
Materiais não estruturados são objetos que colocamos à disposição da criança para que elas inventem a sua própria brincadeira: palitos, botões, rolos de papel higiênico, rolha, barbante, cabo de vassoura, corda, bola. Tudo ganha um novo significado, dependendo da interação da criança e da liberdade que você der a ela de ter tempo e espaço para explorar.
Eles são um contraponto aos brinquedos prontos, que muitas vezes possibilitam um número limitado de brincadeiras.
Brinquedos não estruturados:
- Panos de diversos tamanhos e texturas. Quanto mais longo, melhor!
- Cordas e elásticos.
- Bolas (feitas de meias, inclusive).
- Cabo de vassoura.
- Carrinhos de madeira.
- Bonecas de pano sem “personagem” predefinido.
- Novelos de lã.
- Toquinhos de madeira e blocos de montar.
Basicamente, nossa função como adultos nesta criação de ambiente fértil para os pequenos é preparar a casa para não ter tanta preocupação com perigos, disponibilizar materiais não estruturados para brincar e ficar atento se está na hora de acalmar ou de agitar. Parece simples, não? Por fim, respire fundo e pratique a escuta!
Crianças normalmente são muito claras em comunicar suas necessidades, nós é que normalmente estamos muito ocupados para ouvir. Não será uma tarefa simples equilibrar todas as nossas tarefas e ainda com os pequenos confinados em casa o dia todo por tanto tempo.
Abra concessões, aceite que nem tudo ficará no lugar e que criança em casa sempre quer dizer que algo vai quebrar, algo vai estragar, algo vai riscar. Mas são marcas da infância, e tudo bem. Se a tolerância encurtar, se afaste e respire por 5 minutinhos longe das crianças.
Não precisa ser perfeito! Você cria expectativa de virar o animador de festa profissional e manter seu filho ocupado com atividades elaboradas e incrivelmente educativas o tempo todo. Há apenas uma nova rotina a ser estruturada e é possível, com ações muito simples, construir este espaço de convivência onde as necessidades dos adultos e das crianças sejam realizadas em harmonia. Tudo o que a criança mais precisa, ela terá: sua presença.
Seu filho sabe brincar, deixa ele te ensinar. Só nos promete uma coisa: assim que tudo acalmar, traga ele para brincar na natureza? Estaremos com saudades! Um afetuoso abraço de toda a equipe da Casa Poppins! Fiquem bem e saudáveis!