Já parou para pensar qual o real valor dos dados que serão compartilhados no Open Banking? Quanto valem os dados cadastrais e transacionais de um cliente do sistema financeiro?
Antes de mais nada, para compreender, precisamos refletir sobre o que é valor: para a economia, pode ser definido como a importância que determinado bem representa para alguma pessoa. Para a filosofia, o valor é uma relação entre as necessidades da pessoa e a capacidade dos produtos e serviços de satisfazer as vontades racionais do indivíduo. A partir destas definições, podemos perceber o porquê de preço e valor serem conceitos distintos. O primeiro é a representação monetária de um bem ou serviço e é composto basicamente por custos, margens e dinâmicas de oferta e demanda. E o último, refere-se à capacidade de satisfazer alguém, tornando-se, assim, importante para essa pessoa.
Clive Humby, matemático inglês especialista em Ciência de Dados, disse que dados são “o novo petróleo” (“data is the new oil”). O estudioso se referia ao valor do dado, bem como ao seu enorme potencial de gerar ainda mais valor quando refinado e trabalhado.
Errado ele não está. Mas essa comparação pode ser melhorada. A ressalva aqui está relacionada ao uso contínuo dos dados. Diferente do petróleo, o potencial de gerar valor dos dados não é finito. Não acaba. Não se perde após o uso. Dados estariam mais para uma fonte de energia renovável – como eólica ou solar – do que para um combustível fóssil.
É sempre possível extrair mais informação, um novo enquadramento e múltiplos aprendizados dos dados. E quando olhamos para os dados que poderão ser compartilhados entre as instituições financeiras no Open Banking – mediante consentimento do cliente –, fica ainda mais evidente o potencial de uso e reuso desses ativos.
Um exemplo? Os dados de conta corrente. São informações que podem ser usadas para analisar o fluxo de caixa de um cliente – dinheiro que entra e sai da conta. Também podem ser usados para mapear relacionamentos: para quem se manda ou se recebe dinheiro com frequência? Clientes? Fornecedores? Familiares? Amigos? Ou ainda, a partir de um padrão de comportamento e consumo que se observa nos dados de conta corrente, é possível identificar tentativas de transações atípicas e prevenir fraudes.
Poderíamos citar mais uma dúzia de exemplos de possibilidades que esses dados – isoladamente ou combinados com outros – podem gerar, e certamente, não teríamos pensado em tudo. Mas todas essas aplicações citadas se referem, de forma isolada, a produtos ou serviços desenvolvidos a partir de dados e ofertados por instituições financeiras ou não financeiras. O valor dos dados estaria então apenas em novos produtos e serviços ou modelos nas Instituições Financeiras?
A resposta é não! Reflita. O que, no contexto de mercado, satisfaz alguém de tal forma a tornar-se inesquecível? Experiência!
A experiência de consumo ou interação de qualquer bem ou serviço é única e capaz de gerar maior ou menor satisfação e, por consequência, tornar este produto ou serviço fundamental na vida de cada um. Por isso, oferecer experiências memoráveis é uma tarefa tão complexa quanto rica em possibilidades. Mas, é exatamente aí que entra o Open Banking e a nova dinâmica de geração de valor a partir dos dados.
O valor dos dados é equivalente ao valor gerado pela experiência proporcionada. Para o setor financeiro, o valor recai nos novos dados com profundidade e abrangência suficientes para compreender as particularidades de cada cliente e ofertar produtos e serviços personalizados. Já para os clientes, é a oportunidade de escolher, dentre um leque de oportunidades de experiências ofertadas, aquela que mais lhe encanta.
Além dos exemplos que já trouxemos, sobre o impacto na gestão financeira do cliente, vamos pensar também na criação de experiências memoráveis? Imagine:
A Instituição A recebe dados de determinado cliente e verifica os gastos por segmento, por faixas de horários e tickets médios específicos, dentre outros padrões de comportamento. Por meio dos dados, a Instituição A observa que o seu cliente costuma comprar pizza ou comida japonesa em restaurantes em uma distância de até 7km às sextas-feiras, pagando no crédito. A Instituição A, oferece então, um cartão de crédito sem anuidade e cupons de descontos para os restaurantes mais consumidos com uma mensagem exatamente na sexta à tarde. Bacana, não?
Mas, a Instituição B, com outras expertises em trabalhar com dados, relaciona que o cliente comprador da pizza ou da comida japonesa é também assinante de Streamings de Vídeo. Então, oferta um cartão cuja anuidade converte em assinaturas dos três principais streamings de vídeo, com significativa economia no ano e com cadastro único gerido no aplicativo da Instituição B.
Incrível! Mas, eis que surge a Instituição C, uma empresa de tecnologia intensiva em dados e inteligência artificial, alheia a bancos e, de posse de todos esses dados, que se utiliza do seu assistente virtual no Whatsapp para mandar a seguinte mensagem: “Hey, Cliente, sexta passada vi que você saboreou comida japonesa. Que tal esta sexta devorar uma pizza? Digite “Sim” e olhe o que eu preparei para você”. Ao digitar “Sim”, o assistente informa o cardápio da sua pizzaria recorrente e os preços, opções de outras pizzarias no mesmo raio, com excelente avaliação por consumidores. Quando o cliente aceita uma das sugestões, o pedido é enviado ao restaurante e pago naquele mesmo canal. Por fim, o assistente ainda interage e sugere os top 10 filmes vistos em seu país, considerando os principais serviços de streaming. Afinal, que trabalho que dá escolher um filme. Qual experiência você escolheria?
Numa era de “matches” nas relações, o poder de escolher o “match” com a melhor experiência talvez não tenha preço fixado, mas tem muito... valor. Um valor que não tem fim.
* Karen Machado é Líder do Projeto Open Banking no Banco do Brasil e membro da Confraria de Executivos do Instituto Connect e Rafael Gregório é Head de Dados e Analytics.
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