Quando a pandemia bateu à nossa porta, trabalhar remotamente parecia uma ideia para um futuro distante. Bastaram alguns meses de home office para que pesquisas começassem a apontar que o novo modo de trabalho não seria abandonado mesmo com o “retorno à normalidade”. Hoje, um ano depois do início dessa experiência, o trabalho híbrido é tido como certo no pós-pandemia - pois trabalho remoto funciona, mas a interação humana é insubstituível-, o que deve acarretar mudanças nos escritórios.
“Daqui para frente, as pessoas devem trabalhar principalmente em casa, indo para o escritório quando tiverem algo importante ou tiverem que se reunir. Com isso, o que deve acontecer é que teremos mais compartilhamento de espaços e rotatividade. Então, você não vai ter mais a tua mesa: a tua mesa vai ser aquela que estiver livre quando você chegar no escritório”, diz a arquiteta e gerente comercial da Interprint, Helena Capaz.
A lógica é que se nem todos vão ao escritório diariamente - tanto devido ao novo modelo quanto à necessidade de reduzir o adensamento desses espaços -, não é necessário ter espaços individuais para cada membro da equipe. Isso acarreta uma redução no número de mesas - que pode ser combinada à substituição de espaços individuais por mesas para serem usadas por várias pessoas ao mesmo tempo -, no compartilhamento das estações de trabalho entre todos e, consequentemente, na despersonalização. “A tendência é não ter mais a foto do marido ou do cachorro, a plantinha, o porta-lápis”, explica Helena.
Integração e flexibilidade
Essa alteração não trata apenas do espaço físico. Se o trabalho pode ser realizado em casa - ou em qualquer lugar que tenha acesso à internet, seguindo a proposta do anywhere office -, o ambiente da empresa deixa de ser aquele em que o trabalho individual é realizado para se tornar uma área de troca entre a equipe e de fortalecimento da cultura da empresa.
“Os escritórios vão valorizar os espaços compartilhados, os espaços de inovação. Vamos ter áreas maiores desse tipo de espaço, onde os funcionários vão para fazer trabalhos em conjunto ou criativos, reuniões, para interagir”, explica Mayara Wal, designer e sócia do escritório especializado em projetos corporativos Ponto 41. Conforme ela, para envolver os funcionários, de fato, esses espaços devem contar com atrativos, como a área para o café ou tecnologias a que comumente não se tem acesso em casa.
Além disso, para se adequar à nova realidade, o ambiente corporativo deve deixar de ter uma estrutura rígida para se tornar mais flexível. “Com a modalidade híbrida, uma hora você vai ter cinco pessoas de um time, outra hora serão 15, então o escritório vai precisar ser mais adaptável ou componível. Não dá mais para ser rígido, com mesas fixas e salas de reunião. Você vai precisar de uma sala que fecha para a reunião e que abre para colocar uns pufes e fazer um auditório”, explica a líder de customer success e marketing da Workplace Arquitetura Corporativa, Claudia Trentin.
Os móveis deverão ter o mesmo tipo de flexibilidade para se adequarem às necessidades de cada dia.
Conexão com a natureza e cuidados com a saúde
Com as preocupações trazidas pela pandemia de Covid-19 e o foco se deslocando do trabalho para as pessoas, a tendência é que os escritórios também sejam mais centrados no bem-estar delas, considerando cuidados com a saúde física e mental. Isso deve acarretar uma valorização ainda maior da arquitetura e do design biofílicos, que usam elementos naturais - como madeiras, plantas, luz natural etc. - para promover a conexão com a natureza.
“Um elemento natural que se tornou muito importante, que temos discutido muito nos nossos projetos é o ar, áreas com circulação de ar”, diz Claudia. Isso significa que, se até aqui os ambientes herméticos eram bem difundidos, a partir da pandemia eles provavelmente serão evitados e, onde for possível, os vidros fixos devem dar lugar a janelas que permitam a ventilação.
Ao mesmo tempo, os ambientes externos podem passar a ser mais utilizados. “Empresas que já tinham essa possibilidade provavelmente já faziam esse uso, mas sem um cuidado grande. Então, talvez a utilização da área externa também seja ressignificada, com atenção ao paisagismo, criando áreas que possam ser usadas para reuniões”, afirma Mayara.
A atenção à saúde também deve passar pela adaptação dos escritórios a hábitos adquiridos durante a pandemia, como a criação de espaços de higienização na entrada de prédios e a adoção de tecnologias para evitar o contato com superfícies, como portas automáticas, a leitura facial ou de irís, os sensores para acionamento de torneiras e descargas.
Mudança de comportamento
Para que o trabalho híbrido funcione - e as novas propostas para escritórios também -, as adaptações do espaço deverão ser acompanhadas de mudanças no comportamento das equipes. Conforme Helena, uma demanda que já vem sendo sentida desde que o sistema home office passou a ser utilizado mais amplamente será por momentos de integração, mesmo que on-line, promovendo conversas sobre outros tópicos que não o trabalho em si, inclusive sobre o bem-estar dos trabalhadores.