A indústria da moda é uma das mais poluentes do mundo, tendo um impacto significativo sobre o meio ambiente em várias etapas do seu ciclo de produção| Foto: Pixabay
  • Por Sustentabilidade
  • 28/06/2024 12:21
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A implementação de modelos de economia circular tem ganhado força nas indústrias brasileiras, transformando a maneira como os materiais são utilizados e descartados. Esse movimento não só gera economia significativa para as empresas, mas também reduz o impacto ambiental, promovendo um ciclo virtuoso de sustentabilidade. Reutilização, reciclagem e compostagem se tornaram palavras-chave nesse processo de transformação.

O Brasil gera cerca de 80 milhões de toneladas de resíduos sólidos por ano, segundo dados recentes da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (ABRELPE). Desse total, apenas uma pequena fração é reciclada. A maior parte ainda é destinada a aterros sanitários e lixões, causando um grande impacto ao meio ambiente.

De acordo com o Relatório Planeta Vivo 2020 do WWF, o Brasil consome 1,7 vezes mais recursos do que o planeta é capaz de repor anualmente, o que representa o esgotamento dos recursos naturais.

Edson Grandisoli, embaixador e coordenador pedagógico do Movimento Circular, explica que a economia circular se apresenta em diferentes formatos para incentivar a economia circular. Entre eles, há indústrias que têm se dedicado a pensar um design diferenciado para seus produtos, facilitando as etapas de desmontagem, reciclagem e reaproveitamento de componentes; a criação de mecanismos – em maior escala e maior eficiência – de logística reversa; e também o modelo de compartilhamento, facilitando a mobilidade e o uso de espaços, por exemplo. 

O especialista, que também é co-idealizador do Movimento Escolas pelo Clima, fala que os principais benefícios da economia circular estão relacionados às duas pontas da cadeia de produção, uma vez que, aumentando a circulação de materiais, é possível diminuir a exploração de recursos naturais e a geração de resíduos. “Ações fundamentais quando estamos falando da conservação da vida e de ecossistemas”, pontua.

Casos de sucesso

Grandisoli diz que um exemplo emblemático no setor industrial é o da Scania, que se destaca por sua abordagem abrangente à economia circular. A empresa sueca, com operações no Brasil, conseguiu reciclar, reaproveitar ou compostar mais de 98% dos resíduos gerados em sua cadeia de produção. Esse feito, segundo ele, é resultado de investimentos em novas tecnologias e programas educacionais que capacitam funcionários e colaboradores para adotar práticas sustentáveis.

Para Claudia Coser, que é especialista em ESG e fundadora da Plataforma Nobis, a economia circular desafia o modelo linear tradicional de produção-consumo-descarte, buscando a contínua reutilização dos materiais. “O lixo é erro de design na economia circular. O princípio é de que os materiais continuem circulando e tendo utilidade”, afirma, referindo-se às novas utilidades de um produto a partir do reuso, da economia compartilhada, da utilização de novos materiais mais inteligentes e sustentáveis. 

Políticas públicas

O governo brasileiro tem adotado medidas para incentivar a economia circular. A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) – Lei 12.305/2010 – representou um marco na gestão ambiental do país. Isso porque a lei estabelece diretrizes, objetivos e instrumentos para a gestão e o gerenciamento de resíduos sólidos, promovendo a redução do impacto ambiental e incentivando práticas sustentáveis.

A Política Nacional de Economia Circular (PNEC), que está em tramitação no Congresso Federal, é outro passo importante na legislação brasileira ao apoiar a transição das indústrias para modelos mais sustentáveis. O Brasil conta ainda com outras ações, como o Programa Recicla+, de 2022, e a Criação de Créditos de Logística Reversa – ou Créditos de Reciclagem.

No entanto, Claudia Coser diz que “sobram políticas e regulamentações, mas faltam fiscalização e definição de diretrizes setoriais para a economia circular”. Ela cita como exemplo o Plano Nacional de Resíduos Sólidos (PLANARES) – que integra a PNRS – e prevê porcentuais gradativos de destinação e reciclagem. “Mas, na prática, não há definições específicas sobre como as empresas deverão corresponder”, alfineta. 

Claudia cita ainda o comportamento pós-consumo, que carece de capacitação. “As pessoas sequer separam adequadamente os resíduos que geram dentro de casa”, pontua. 

Desafios 

Na economia circular, itens que seriam descartados ganham novas funções.| Foto: Pixabay

Apesar dos avanços, Grandisoli salienta que as indústrias enfrentam vários desafios ao implementar práticas de economia circular. A falta de conhecimento e a necessidade de altos investimentos em infraestrutura e tecnologias são barreiras significativas. Muitas empresas ainda operam sob modelos lineares e precisam adaptar processos e mentalidades para se tornarem mais circulares.

Entre os exemplos positivos, Claudia destaca o setor de vestuário que, segundo ela, tem mostrado potencial crescente com os brechós como meio de estender o tempo de vida útil das peças. “Mas ainda precisa do consumo consciente”. No setor agrícola, ela ressalta a permacultura, prática que visa criar sistemas agrícolas sustentáveis e resilientes, inspirados nos padrões e processos observados na natureza. Trata-se de uma abordagem que integra plantas, animais, paisagens e pessoas em um ciclo harmonioso, onde cada elemento sustenta os outros, promovendo a biodiversidade, a conservação dos recursos naturais e a sustentabilidade a longo prazo.

Impacto econômico 

A transição para a economia circular pode ser vista como uma oportunidade. Ao investir em tecnologias de reciclagem e reutilização, as empresas conseguem reduzir custos operacionais e criar novos modelos de negócios. Um estudo do Ministério do Meio Ambiente (MMA) estima que a economia circular pode gerar até 7 milhões de novos empregos no Brasil até 2030, principalmente nos setores de reciclagem, reuso e remanufatura.

O papel central dos consumidores não pode ser ignorado. A crescente conscientização ambiental está impulsionando a demanda por produtos e serviços sustentáveis, incentivando as empresas a adotarem práticas circulares. Claudia afirma que há uma forte tendência nos padrões de consumo entre as gerações mais jovens, influenciadas por preocupações acentuadas com os desafios ambientais. “Essas gerações exercerão força intensa sobre o que consumir e onde trabalhar, a partir de critérios essencialmente relacionados aos níveis de sustentabilidade com o planeta e responsabilidade com as pessoas”, ressalta a especialista.