Mais do que um diferencial, a sustentabilidade na agroindústria é cada vez mais observada como uma tendência mundial. Não só pelo lado da economia de custos e da necessária preservação de recursos para o próprio negócio e o planeta em si, mas também para ganhar competitividade e valorizar os produtos no mercado. Em alguns casos, a produção sustentável também já é ‘mandatária’ para negócios que não desejam perder espaço no mercado internacional, uma vez que diferentes países estão impondo regulamentações mais rígidas na cadeia produtiva relacionadas à sustentabilidade.
Dentro desse ‘movimento’ global, o Paraná tem sido protagonista no Brasil. No ano passado, a sustentabilidade ambiental do estado liderou e foi avaliada com a nota máxima pelo Ranking de Competitividade dos Estados feito pelo Centro de Liderança Pública (CLP) – uma organização suprapartidária –, pelo bom desempenho em indicadores como preocupação com o desmatamento ilegal, cuidados com o desperdício de água, coleta e destinação adequada do lixo e emissão de CO².
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O programa RenovaPR, do Governo do Estado por meio do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR-PR), por exemplo, já implantou cerca de 7,5 mil projetos de energia sustentável nos últimos 30 meses em propriedades rurais do Paraná com parte deles subsidiados pelo Banco do Agricultor Paranaense, seja por painéis fotovoltaicos ou pelo processamento de biomassas para produção de biogás e biometano.
Isso demonstra a preocupação cada vez maior do produtor e das cooperativas paranaenses em práticas sustentáveis. A Frimesa, por exemplo, apresentou em 2023 uma série de compromissos de responsabilidade ambiental até 2040. Entre as metas com diferentes prazos ao longo desse período estão o reuso de parte de água, geração e uso de energia proveniente de fontes renováveis em quase sua totalidade, rastreabilidade completa da cadeia de abastecimento, tornar pelo menos metade de suas embalagens recicláveis, reutilizáveis ou biodegradáveis, até, por fim, neutralizar as emissões de carbono da própria cooperativa.
Além dessas ações gradualmente mais efetivas e planejadas pelo Estado, o transporte pode ser fator importante nessa equação. Nesse sentido, a ampliação das ferrovias é um caminho, uma vez que o transporte ferroviário é um modal mais limpo que o rodoviário, embora ainda utilize majoritariamente combustíveis fósseis. De modo geral, o transporte global é responsável por 23% das emissões de Gases do Efeito Estufa (GEE) do mundo, segundo relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, e 70% têm origem nas rodovias. Ou seja, um maior uso e extensão desse modal, para suprir as necessidades logísticas do setor produtivo paranaense, ainda traria ganhos ambientais.
“O sistema ferroviário tem um potencial de redução de mais de 40% na emissão de carbono em relação à rodovia. A questão é muito pelo que a gente chama de economia de escala. Vamos pegar a rota Cascavel - Paranaguá com soja em grãos como exemplo. Um caminhão tem capacidade para transportar 33 toneladas de soja na carroceria. Um vagão tem capacidade de 80 toneladas, então só daí seriam dois caminhões e meio para cada vagão. Precisaria de três caminhões, seriam três cabines emitindo CO²”, explica o coordenador do Núcleo de Infraestrutura, Supply Chain e Logística da Fundação Dom Cabral, Paulo Tarso Vilela de Resende.
“Quando você vai para ferrovia precisa de uma locomotiva para transportar um, 10, 50, 100 vagões. O que emite mais, uma locomotiva ou dezenas de caminhões? Para determinados produtos e distâncias, não é só questão econômica, é questão de meio ambiente também, emite bem menos”, complementa Resende.
A atual concessionária da Malha Sul, que também possui outras quatro malhas ferroviárias pelo País, traz dados ainda mais positivos nesse sentido. Conforme o Relatório de sustentabilidade da Rumo de 2023, o modal ferroviário apresenta uma emissão de GEE cerca de 7,6 vezes menor do que outros modais menos eficientes.
Dentro de suas políticas de eficiência energética e metas ESG (Governança ambiental, social e corporativa), a empresa destaca que atingiu ‘antecipadamente a meta de redução de 15% das emissões específicas [de GEE] até 2023, com ano-base em 2019, chegando a 17,46% de redução, além de reduzir em 39% as emissões específicas desde 2015’. O relatório destaca que somente em 2023 a companhia ferroviária evitou ‘a emissão de 6,6 milhões de toneladas de CO², quantidade que seria liberada se caminhões estivessem transportando a carga equivalente’.
O pesquisador Paulo Resende ressalta que o setor pode ter um ganho substancial nesse sentido com o uso de combustíveis renováveis e até sem emissão de gases poluentes, como o hidrogênio verde. “O mesmo combustível estudado para rodar caminhão, roda a locomotiva. Seja ele hidrogênio verde ou outro menos agressivo, a tecnologia é a mesma. Hoje de modo geral a locomotiva é a diesel e o caminhão também. No dia em que o caminhão for hidrogênio verde, a locomotiva será também. Tecnologicamente não há impeditivo nenhum. As dificuldades e as facilidades de adaptação são as mesmas”, relata.
Aos poucos, novas iniciativas surgem nesse sentido. No fim de 2022, a Alemanha inaugurou sua primeira frota de trens movido a hidrogênio para atender uma linha regional de passageiros com 126 km de extensão passando por três pequenas cidades. Os cinco trens de hidrogênio substituíram um total de 15 locomotivas a diesel que produziam 4,4 mil toneladas de CO² por ano, segundo a operadora alemã.
Já no Paraná, a Rumo iniciou no segundo semestre de 2023 a operação de duas locomotivas híbridas (com motores mais eficientes e baterias para armazenar energia) em caráter piloto na região Central do Paraná. Segundo a empresa, as locomotivas foram especialmente projetadas para percorrer trajetos com serras e curvas e têm capacidade de carregar uma composição que, atualmente, exigiria seis locomotivas convencionais. Feitas pela Progress Rail, o modelo pioneiro para transporte de cargas no país apresenta, de acordo com a concessionária, eficiência operacional 20% superior em termos de emissões, consumindo 22% menos combustível em comparação com locomotivas convencionais, sendo que 15% dessa economia é proveniente do uso de baterias como fonte de energia regenerativa.
As ferrovias, inclusive, fazem parte dos planos do Brasil para cumprir as metas climáticas. No último mês de dezembro, durante a COP28 (Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas), realizada em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, o secretário nacional de Transporte Ferroviário, Leonardo Ribeiro, declarou que ‘a principal oportunidade para descarbonizar o setor de transportes brasileiro é apostar em um maior equilíbrio na matriz de transportes, priorizando modais que emitam menos gases de efeito estufa, como ferroviário e hidroviário’.
Se conseguir equilibrar essa matriz, além da descarbonização, outro efeito poderá ser a diminuição do número de acidentes e mortes nas estradas, pois haveria menor fluxo de veículos com carga pesada. No Paraná, os acidentes de trânsito registrados nas rodovias federais mataram 559 pessoas em 2023, segundo dados da Polícia Rodoviária Federal (PRF). Ao todo foram 6.827 acidentes, sendo 2.097 envolvendo caminhões. Se os acidentes representaram pouco mais de 30%, as mortes (291) em acidentes com caminhões foram 52% do total.
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