O grande elenco reunido pelo diretor estreante Sidney Lumet, em 1957| Foto: Divulgação Lumine
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Um jovem de 18 anos de idade, acusado de ter assassinado o próprio pai a facadas, está diante do tribunal, aguardando o veredito de seu julgamento. O juiz faz um resumo do caso e informa aos doze membros do júri qual deverá ser o procedimento: a condenação ou absolvição do réu só se dará em caso de certeza absoluta, ou seja, unanimidade. Caso haja discordância entre eles, prevalecerá a inocência. O juiz também ressalta que, em sendo o veredito pela condenação, a única alternativa para o réu será a pena de morte numa cadeira elétrica.

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A sinopse aqui descrita é também uma das primeiras sequências de 12 Homens e uma Sentença, disponível para streaming pela Brasil Paralelo, Lumine, além de locação pela Apple TV. São somente alguns poucos minutos de uma introdução que nos apresenta a um dos maiores clássicos do cinema americano e também mundial, certamente o filme mais prestigiado e de referência mais frequente tanto no universo jurídico, quanto nas escolas de cinema.

Aliás, por ser uma obra que se insere na categoria dos dramas de tribunal, é curioso destacar que todo o desenvolvimento narrativo não acontece de fato no tribunal, diante do juiz, advogados, promotores e testemunhas, mas numa pequena sala na qual os doze jurados se reúnem para chegar a um veredito.

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É nessa sala apertada e desconfortável que doze homens terão de decidir o destino de um ser humano. Já na primeira votação que realizam, onze jurados não hesitam na escolha pela culpabilidade e consequente condenação. Um único jurado, no entanto, vota em contrário. Ele não considera que o réu seja inocente, mas também não tem certeza de sua culpa. Justamente por conta da dúvida, esse jurado prefere investir mais algum tempo discutindo o caso com os companheiros a fim de se chegar a uma sentença correta.

Estão, ali, pessoas de várias posições, de diferentes níveis de conhecimento e de distintos mecanismos para a interpretação dos fatos. Mas, contrariando a todos, um único jurado quer exatamente isso: eliminar dúvidas, afastar preconceitos morais e éticos, desconstruir impossibilidades, até que restem somente os fatos e se encontre uma certeza razoável.

Certezas e dúvidas em foco

12 Homens e uma Sentença foi lançado em 1957, marcando a estreia no cinema do diretor Sidney Lumet. O roteiro é assinado por Reginald Rose, que primeiro escreveu a história como uma peça de teatro. Lumet e Rose se conheceram trabalhando na televisão, no início dos anos de 1950, e chegaram a gravar essa mesma história nesse formato.

Sendo assim, não é de se estranhar que a versão para cinema tenha referências tanto televisivas quanto teatrais. Ocorre que o diretor Lumet, contando com a engenhosidade do fotógrafo Boris Kaufman, criou uma linguagem cinematográfica única, desenvolvendo planos e sequências que evidenciam todo o poder narrativo do roteiro.

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O maior obstáculo, evidentemente, é o espaço restrito. Ainda assim, Lumet e Kaufman conseguem transitar habilmente naquela minúscula sala com as câmeras entre tantos homens e cadeiras. De início são planos mais lentos, sem cortes e abertos, somente para evidenciar a confusão espacial e também de pontos de vista.

Mas, rapidamente, o diretor passa a usar a câmera em close, a fim de desagregar o tumulto verbal, focando as certezas e as dúvidas, a segurança e a hesitação de cada um. De quebra, Lumet também encontra uma forma de realçar o talento individual de cada uma de suas estrelas: Lee J. Cobb, E. G. Marshall, Joseph Sweeney, Ed Begley, Edward Binns, George Voskovec, Jack Klugman, Jack Warden, John Fiedler, Martin Balsam, Robert Webber e, claro, Henry Fonda – o jurado número 8 e responsável pelo enfrentamento –, que também assina a produção do filme.

Em pouco menos de 100 minutos, Lumet cria um ambiente caótico e claustrofóbico. Mesmo não contando com as tradicionais sequências de verborragias jurídicas proferidas pelos advogados, por vezes sedutoras ou até enfadonhas, o diretor Lumet transforma em imagens catárticas as expressões de cada jurado, o suor escorrendo pelos rostos, papéis espalhados na mesa, cigarros e mais cigarros nos cinzeiros.

É o discurso, no entanto, que faz desse filme uma obra-prima (não por acaso entre os 100 melhores filmes de todos os tempos pelo American Film Institute). 12 Homens e uma Sentença mostra que, mesmo diante da letra fria das Leis, não há certeza absoluta, que ninguém possui o monopólio da verdade, que não se pode aceitar uma decisão monocrática e que é necessário, sempre, colocar à frente de tudo a razoabilidade e a impessoalidade quando se pretende fazer justiça.