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“É bom que a imprensa esteja aqui. Continue filmando.” Esses são os dizeres de um médico enquanto ele e sua equipe fazem massagem cardíaca na tentativa de reanimar uma criança. A cena seguinte mostra uma poça de sangue no chão e os assistentes do doutor chorando. Essa sequência resume bem a crueza com que o documentário 20 Dias em Mariupol, que acaba de estrear nos cinemas brasileiros, retrata os tristes ocorridos da guerra na Ucrânia em seus estágios iniciais.
A produção é simples. Ela foi dirigida e captada por Mstyslav Chernov, um jornalista que passou 20 dias preso na cidade litorânea ucraniana que foi atacada por russos e resultou na morte de mais de 20 mil civis. Mesmo que fossem apresentadas de maneira mais pomposa, as imagens duras e realistas continuariam sendo suficientes para que a película recebesse a merecida indicação ao Oscar de Melhor Documentário em Longa-metragem.
Separado em partes que representam cada dia, o filme mostra como a situação vai escalando. O caos aumenta gradativamente, começando com bombeiros lutando contra o fogo em casas atingidas por bombardeios. Depois, cenas de mortes, hospitais lotados e pessoas perdidas ficam cada vez mais comuns, mas não sem afetar o espectador.
O trabalho jornalístico de Chernov é bem fidedigno com a situação. Ele tenta ao máximo captar as reações dos ucranianos e, ocasionalmente, pedir até opiniões da população para entender suas visões sobre a batalha. Sua narração, feita por cima das imagens, ajuda a dar contexto sobre sua atuação, humanizando seu papel como alguém que precisa retratar os horrores da guerra, mas também lutar para sobreviver e garantir que seu trabalho seja entregue a todo o mundo. Nem todo movimento é perfeito, porém todos eles trazem o senso de urgência necessário ao material, como quando Chernov precisa buscar abrigo para se proteger de um bombardeio.
Nem todo mundo será capaz de assistir a 20 Dias em Mariupol. É um documentário trágico e que abala qualquer um que entende como mortes infundadas e guerras são perversas. Porém, sua importância é inegável, ainda mais considerando que a guerra acabou de completar dois anos. As tristes imagens, que têm grandes chances de serem premiadas no Oscar, servem como importante documento para sensibilizar mais pessoas e, quem sabe, inspirar um eventual cessar fogo. Isso se o presidente russo, Vladimir Putin, não continuar afirmando de maneira cretina que o trabalho de Chernov e outros repórteres de guerra é “terrorismo de informação”.