Tob, Mike, Jairzinho e Simony, em encontro propiciado pela série documental do Star+| Foto: Divulgação Star+
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Quem era criança e pegou o Balão Mágico na primeira metade dos anos 80 certamente não tem ideia do impacto daquilo no mercado brasileiro. A garotada só queria saber dos discos e demais produtos relacionados a Simony, Tob, Mike, Jairzinho e Fofão, além de não perder o programa da patota na tv e, eventualmente, tentar ver uma apresentação ao vivo com som ruim e visão do palco prejudicada. A Superfantástica História do Balão, série documental em três capítulos recém-lançada pelo Star+, empenha-se em revelar os bastidores desse fenômeno, não somente ofertar algo nostálgico para quem ainda não superou a mais tenra idade.

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A iniciativa é válida porque mesmo quem participou daquilo tudo era capaz de não ter uma visão completa do caos. Após a disponibilização do material, Simony demostrou choque com declarações proferidas por quem estava em seu entorno e um grande descontentamento por sua família de artistas de circo aparecer entre os vilões do Balão, uma vez que eles detiveram as rédeas e o controle financeiro das apresentações ao vivo em boa parte da jornada. Mas há quem diga que um produto do tipo só é bom quando os radiografados se incomodam, então esse seria um indício de que a série cumpre seu papel.

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Conforme pontua José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, homem forte da Rede Globo à época, o Balão Mágico foi pioneiro e o preço a se pagar pelo pioneirismo é alto. Simony, Tob e Mike incialmente foram recrutados apenas para cantar, seguindo uma onda de grupos musicais infantis que existiam mundo afora. Nesse momento, é crucial a figura de Edgard Poças, compositor encarregado de verter para o português as músicas de sucesso que a gravadora recolhia em países europeus. A Galinha MagricelaSuperfantástico e demais hits do Balão passaram pelo tratamento de Poças, hoje também conhecido por ser pai da cantora Céu.

Quando o grupo vira uma atração televisiva, entra em cena o grande humorista Orival Pessini (1944-2016) e seu personagem Fofão. A criação foi rechaçada pelos executivos, que ficaram com asco do formato das bochechas do alienígena, que deveriam lembrar um buldogue velho, mas possibilitava uma associação com a anatomia masculina. Pessini defendeu que quem deveria julgar Fofão era Simony, não adultos. E a garota reagiu com um “que fofinho” quando apresentado à criatura, garantindo sua inclusão na turma. O boato de que os bonecos comercializados do Fofão possuíam uma faca dentro do corpo, que poderiam ser acessadas arrancando sua cabeça, também é assunto endereçado pela série – atenção para a última cena de todas, no terceiro episódio.

Vida após o furacão

É bem verdade que a diretora Tatiana Issa e os roteiristas Fernando Ceylão e Beatriz Monteiro poderiam ter aprofundado algumas passagens, como a que Simony, já crescida, envolve-se com um rapper preso no extinto Carandiru. O desespero por atenção da mídia que virou uma marca da ex-cantora mirim renderia uma análise psicológica mais detalhada, já que a série se propõe a resumir as trajetórias dos participantes após o fim do Balão. É muito interessante constatar que Tob sempre foi o artista introvertido e perturbado do núcleo, algo acentuado por sua demissão, quando a voz começou a engrossar e o rosto encheu de espinhas. E também que o carisma e a língua solta de Mike (filho do assaltante inglês Ronald Biggs) foi essencial para o projeto t er vingado, assim como é essencial para que A Superfantástica História do Balão tenha força. Ele é o sal da receita.

Tanto para o espectador que viveu a época quanto para quem é de outra geração, o aspecto que mais desperta reflexões é sobre como coisas que aconteciam lá atrás hoje são vistas como criminosas ou sem noção. Mike, sem segurança alguma, pendurado do lado de fora de um automóvel descendo a Estrada do Joá (RJ) com Fabio Jr ao volante na gravação do clipe de Amigos do Peito é uma cena surreal de ser vista em 2023. A forma áspera e sarcástica como um dos representantes da gravadora fala da molecada também deve causar espécie em muita gente. Mas eram os anos 80 e, como disse Boni, tudo era mato antes do Balão Mágico asfaltar. Trem da Alegria, Xuxa, Angélica, Sandy & Junior, a própria dupla que Simony formou com Jairzinho na pré-adolescência são todos subprodutos de algo que surgiu na base do “vamos ver no que que dá essa ideia” e terminou inventando a criança consumidora brasileira.