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De vez em quando, Hollywood lança um filme que inicialmente recebe avaliações mistas por seu enredo aparentemente absurdo, apenas para ser mais tarde celebrado por suas críticas culturais à frente de seu tempo. Em Beekeeper – Rede de Vingança, que está em cartaz nos cinemas brasileiros, o diretor David Ayer parece determinado a contornar esse caminho de reconhecimento tardio. Ancorado na atuação emocionante de Jason Statham, o filme combina ação divertida e de alta adrenalina com uma representação convincente da decadência institucional moderna. É uma mistura fascinante que posiciona Beekeeper ao lado de clássicos do gênero exploitation que refletem seu meio.
No centro da história está Adam Clay (Statham), um estóico ex-agente de inteligência da organização secreta “Beekepers”. Sua vida fica em desordem quando golpistas on line miram sua querida amiga idosa, Eloise Parker, retratada com autenticidade sincera por Phylicia Rashad. Embora a recompensa emocional do filme pudesse ter aumentado ao se aprofundar no relacionamento deles, o destino de Eloise impulsiona Clay em uma busca desenfreada por vingança. A primeira parada de Clay é um call center desprezível, liderado por um vigarista do tipo Lobo de Wall Street. Mas há uma reviravolta: a operação é apenas uma fachada.
Aqui, Ayer poderia facilmente ter conduzido Clay pelo caminho familiar dos vigilantes e fazê-lo espancar bandidos locais pelos próximos 90 minutos, ao estilo do Paul Kersey, de Charles Bronson, em Desejo de Matar. Alternativamente, ele poderia ter feito Clay enfrentar um sindicato criminoso global que lembra os inimigos de John Wick. Qualquer uma dessas possibilidades poderia ter rendido um filme de ação mais do que útil.
Sórdido cenário político
Mesmo assim, Ayer e o roteirista Kurt Wimmer traçam um caminho mais ousado e oportuno. Os bandidos que Clay está caçando não são apenas ladrões de bolsas. Eles fazem parte de uma elaborada rede de golpistas incorporados e protegidos pelos altos escalões do governo federal. Ao enviá-lo para Washington, Beekeeper ergue um espelho para o nosso sórdido cenário político.
Personificando a podridão nepotista está Derek Danforth (interpretado de forma convincente por Josh Hutcherson), o filho degenerado de um político proeminente. Apesar de fraudar os idosos para financiar seu vício em cocaína, estilo de vida luxuoso e ambições políticas da família, Danforth opera com impunidade: o FBI o trata com luvas de pelica, e seus esquemas são incentivados pelo ex-chefe da CIA Wallace Westwyld (Jeremy Irons, em boa forma), que preside seu empreendimento dinástico. Embora revestido com o verniz de respeitabilidade de um velho estadista, o Westwyld de Irons simboliza a porta giratória venal entre os setores público e privado.
Essa premissa, que pode ter parecido estranha mesmo para aqueles que se aglomeraram para assistir Desejo de Matar há 50 anos, no auge do escândalo Watergate, ressoa na América de 2024. Sua plausibilidade aumenta o impacto do filme, permitindo que Beekeeper evite enredos complicados e intelectuais, postura que pode prejudicar filmes desse gênero.
Nossa atenção então se volta para saborear esse espetáculo de vingança liderado por suas fascinantes sequências de ação. Beekeeper funde a cinematografia nítida e refinada que evoca a franquia John Wick com o design de som corajoso de um filme de terror de Ti West. O resultado é um banquete audiovisual satisfatório, elegante e visceral.
Ação com cérebro
Ver Beekeeper derrubar representantes de vilões do mundo real que espreitam na interseção de agências de inteligência irresponsáveis e interesses privados predatórios oferece mais do que uma descarga de adrenalina. Com uma pitada de humor, valida o cinismo do espectador sobre o funcionamento interno do Complexo Industrial Grift. Claro, essas pessoas podem ser influentes, bem conectadas e superficiais, mas sabemos que são palhaças – dentro e fora da tela.
Outra decisão prudente no roteiro foi tornar a jornada de Clay pessoal, independente de uma causa mais ampla. Reduzir as apostas alinha o Beekeeper com a melhor tradição do subgênero. Como o Major Charles Rane, vivido por Bill Devane, em A Outra Face da Violência, e a atriz Pam Grier, em Coffy: Em Busca da Vingança, o Adam Clay de Statham é movido apenas pela vingança, não pelo idealismo. Isso torna o personagem de Statham mais identificável e preserva a lucidez do filme.
Apesar do seu cenário político, Beekeeper desvia habilmente da moralização pesada e do proselitismo partidário. Há mel para todos os públicos nesta colmeia cinematográfica: os aficionados por ação descobrirão que ele é um nocaute, enquanto aqueles que buscam um pouco mais de profundidade apreciarão seus comentários sociais contundentes. É um filme de ação com um cérebro que não se leva muito a sério enquanto aplica golpes justificados às elites corruptas.
© 2024 National Review. Publicado com permissão. Original em inglês.