Por uns bons meses, o público brasileiro estava em dúvida se conseguiria assistir a um dos filmes mais comentados do ano e cujo lançamento nos Estados Unidos esteve cercado de polêmicas. Trata-se de Som da Liberdade, que amargou cinco anos de espera para alcançar os cinemas americanos, após o filme ter sido engavetado pela Disney e justamente pelo cerco das tais polêmicas – sempre vazias e insustentáveis. Lançado por uma distribuidora pequena e independente, a Angel Studios (da série The Chosen: Os Escolhidos), a grande surpresa: sucesso imediato nas bilheterias. Até esse momento, o filme estrelado pelo astro Jim Caviezel já ultrapassou a marca dos US$ 200 milhões arrecadados em escala global – uma fortuna quando se sabe que ele custou parcos US$ 14 milhões para ser produzido. O estardalhaço chamou a atenção do mundo, incluindo o Brasil, e assim nós também estamos tendo agora a chance de conferir a obra, que teve sua estreia comercial no país nesta quinta-feira, 21.
E eu estava lá! A convite desta Gazeta do Povo, fui acompanhar a primeira sessão de estreia de Som da Liberdade numa das ótimas salas do circuito Cinesystem do Shopping Morumbi Town, em São Paulo. A sessão das 19h estava praticamente lotada. Casais, sendo alguns acompanhados dos filhos, gente mais jovem e até senhores e senhorinhas marcaram presença. Conversei com um punhado desses espectadores, mas sem a premissa de que seriam obrigados a se identificar, preservando assim a liberdade do anonimato de cada um e, mais importante, evitando qualquer ranço de viés ideológico.
A primeira e mais impactante constatação: jamais, passados 30 anos como crítico de cinema, vi um filme que provocasse tanta emoção já em seus minutos iniciais. Apenas para contextualizar, Som da Liberdade narra a história real de um agente do FBI que investiga uma rede de pedofilia e o consequente tráfico internacional de crianças com objetivos de comércio sexual. A trama gira em torno desse agente, Tim Ballard, que consegue salvar um garotinho das mãos de um pedófilo traficante, mas acaba descobrindo que a irmã do menino também fora sequestrada. É quando Ballard, após inúmeras pistas, decide arriscar-se na selva colombiana em busca da garota. Logo nos primeiros minutos, o filme mostra a estratégia vil de como os traficantes agem e acabam roubando as crianças de seus pais. Já nesse momento, em que acompanhamos na tela o sofrimento de um pai que vê seus dois filhos desaparecerem, o que antes era silêncio absoluto torna-se ruidoso: comecei a perceber o desconforto do público e ouvir soluços de choro. Algumas pessoas, certamente já sabendo o que esperar, foram preparadas. Como a moça sentada a duas poltronas da minha, na casa dos 30 anos de idade, que segurava uma caixa de lenços.
O filme nos conta que a pedofilia, somente nos últimos cinco anos, cresceu mais de 5000%, apenas por conta das inúmeras redes clandestinas nos abismos da internet. Aprendemos que o tráfico de crianças que serão usadas como escravas sexuais rende algumas centenas de milhões de dólares. O agente Tim Ballard, disposto a interromper ou no mínimo amenizar esses dados, não esconde sua emoção diante de seu superior no FBI, pouco inclinado a colaborar. O público, por sua vez, reage e evidencia a indignação: “que absurdo”, “isso é crueldade”, dizem alguns. “Queria ver se fossem os filhos dele”, foi o comentário de uma senhora idosa também muito próxima a mim. Em dado momento, a câmera dá um close no personagem de Caviezel, suas lágrimas escorrendo pelo rosto, e pude testemunhar o público chorando junto com ele. Assim, com a emoção, a indignação e muitos lenços, a sessão foi transcorrendo por suas 2 horas e 15 minutos.
Um filme cristão
Tão logo os créditos começaram a surgir na tela, aproximei-me de algumas pessoas. Um senhor acompanhado da esposa e a filha (todos enxugando os olhos) elogiou a produção e, muito emocionado, disse que essa era “uma história que todos deveriam conhecer e se preocupar”. A esposa dele emendou: “Isso acontece todos os dias, debaixo de nossos olhos... é inaceitável”. Já a filha, uma jovem de 20 e poucos anos de idade, deu um depoimento mais politizado: “Essa é uma história verdadeira, não é de direita nem de esquerda. Cadê a teoria da conspiração? E onde está a polêmica? Só por que ele fala de Deus”?
De fato, entre as tantas acusações que o filme tem sofrido, uma delas é por ser um filme cristão. Em um dos marcantes diálogos, Tim Ballard resume seu engajamento na luta contra o tráfico sexual infantil dizendo que “Os filhos de Deus não estão à venda”. Evidentemente que apenas isso não se configura cristianismo, evangelização ou o que o valha. E mesmo que fosse, qual seria o problema? A resposta, de forma bastante incisiva, surgiu no depoimento de outro rapaz que se juntou à rodinha de conversa: “O progressismo atual, a esquerda radical que diz se preocupar com cultura e respeitar a diversidade, simplesmente odeia o conhecimento, a família e qualquer religião”.
Ainda correndo os créditos finais, uma janela se abre na tela e surge o ator Jim Caviezel para dar um recado. Ele descreve toda a jornada de sofrimento, desgaste e também de empenho de toda a equipe para a realização do filme, que por muito tempo foi rechaçado por grandes estúdios, atacado, injustiçado e demonizado. Sim, é uma propaganda da obra, contando com a sua maior estrela, e com a intenção indiscutível de fazer com que o público compareça às salas de cinema. Uma estratégia inédita nesses tempos de marketing digital e, por isso mesmo, muito apropriada. E o mais impressionante: assim que Jim Caviezel, olhando para a câmera, pede para que o público aponte o celular para QR Code na tela e faça doações ou compre ingressos para os amigos ou aqueles que não possuem recursos para tal, praticamente todos os espectadores da sala ergueram seus aparelhos. Para mim, que também me emocionei muito durante a projeção do filme, ficou absolutamente claro que o som da liberdade é também o som do altruísmo.