Muito antes de eu sequer sonhar em escrever sobre cultura pop, eu era fã já do namorinho no cinema.
A autora de romances juvenis Beverly Cleary, em seu livro “Fifteen”, conseguiu capturar perfeitamente esse ritual. Depois de tê-lo lido quando criança, eu sonhava como seria sair num encontro para ver um filme e depois ir tomar sorvete com o namoradinho. Foi na época da faculdade que eu fui ao Grauman’s Chinese Theater pela primeira vez para namorar, e o rapaz se deliciava em passar comigo pelo portão extravagante do cinema, enquanto eu ficava maravilhada com o papel de parede barroco e o tamanho do auditório, aparentemente infinito. Ainda tenho todo um carinho por “Argo”, o drama de espionagem de Ben Affleck, porque foi o filme que eu fui ver com meu marido em nosso primeiro encontro.
Mas, se eu quiser assistir a um filme de verdade, não há nada melhor do que entrar no cinema sozinha, de preferência no meio da tarde, quando é provável que o cinema esteja bem vazio.
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O problema de ir ver filme como parte de um encontro é que o filme se torna subordinado ao encontro. Em vez de dedicar sua atenção plena ao que está acontecendo na tela, você talvez esteja imaginando se vocês vão se dar as mãos, ou sentindo o peso do braço da outra pessoa no seu ombro. Vocês estão dividindo a pipoca ou então os dedos esbarram na hora em que os dois vão pegar o chocolate ao mesmo tempo.
E, mesmo que você não esteja se distraindo com esses pequenos choques de contato físico, o modo como você processa o filme num encontro é inevitavelmente moldado pela discussão que virá depois. Eu gostei, mas será que ele vai gostar? Eu odiei, será que ele vai odiar também? Como é que alguém pode achar que isso aí é romântico ou inteligente ou intrigante ou satisfatório? Se eu falar de cinematografia, será que ele vai me achar pretensiosa? E, se eu não falar nada de cinematografia, será que ele vai achar que eu sou burra? Eu queria estar vendo “Star Wars”. Eu queria que ele fosse alguém que quisesse ver “Star Wars”.
Não, se você quiser mesmo se entregar a uma obra cinematográfica – e ter uma experiência estética que seja sua e somente sua –, o único jeito é vendo o filme a sós.
Choro compulsivo
Uma das primeiras experiências que me convenceram disso foi em 1994, quando fui assistir a “Adoráveis Mulheres” na pequena cidade de Vermont, onde minha família morava à época. Eu chorei tanto quando Beth (Claire Danes) morreu que um vizinho ligou para a minha mãe para saber se não tinha acontecido nada.
Este ano, eu assisti a “A Qualquer Custo”, o magnífico neo-western de David Mackenzie e Taylor Sheridan, sozinha numa tarde de sexta-feira. Um dos motivos pelo qual ele permaneceu no topo da minha lista particular de melhores do ano foi que, apesar de eu ter falado dele para todo mundo logo após sair do cinema, eu não conseguia pensar em nada absolutamente a respeito do mundo exterior enquanto assistia ao filme.
Há algo de uma decadência singular em torno de todos os outros prazeres de se ir ao cinema sem companhia. Não que seja vergonhoso curtir um balde enorme de pipoca ou um refrigerante sozinha, mas há um deleite em particular em não precisar dividir as guloseimas com ninguém, nem ser observada enquanto come. Se ir ao cinema sozinha é uma chance de não precisar prestar atenção às reações de uma outra pessoa, é também uma chance de não ter ninguém reagindo a você, seja quando você dá risada de alguma piada imbecil, mas irresistível, ou enquanto come uma caixa inteira de balinhas durante a primeira parte do filme.
Sozinhos com a arte
Muito de nosso consumo de cultura pop vem se tornando inescapavelmente público, seja quando você fica acordado até tarde no domingo para ver o mais novo episódio de “Game of Thrones” para poder discuti-lo no trabalho no dia seguinte, seja assistindo a todos os filmes indicados ao Oscar para poder participar dos debates sobre os concorrentes ou então para falar mal do espetáculo todo como uma fraude racista e machista.
Em certa medida, eu acho isso maravilhoso. Afinal, eu mesma ganho a vida com o fato de que as pessoas adoram ter debates públicos vigorosos sobre cultura pop. Mas parte do que faz com que nossas conversas sobre arte sejam tão maravilhosas e o que faz com que elas sejam tão diferentes dos debates sobre política é que as nossas reações à cultura são altamente pessoais e imprevisíveis.
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O único modo de termos respostas particulares de verdade é criando espaço para que possamos ficar sozinhos com a arte. Ir ao cinema sozinho é um pequeno luxo. Mas também é o melhor modo de assistir a um filme de verdade e talvez até mesmo flagrar, de relance, um vislumbre do seu “eu” interior em reação a ele.
*Alyssa Rosenberg escreve sobre cultura pop na seção de Opiniões do The Washington Post.
Tradução: Adriano Scandolara
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