Ricardo Darín? Sim, ele é um grande ator e uma referência no audiovisual argentino. Mas o reinado agora parece pertencer a outro nome: Guillermo Francella. Hoje com 69 anos, ele fez fama com séries e filmes de sucesso, casos de Meu Querido Zelador, A Extorsão, Minha Obra Prima e O Segredo dos seus Olhos. Como se isso não bastasse, o ator protagoniza uma guerra cultural que acontece neste momento na terra dos nossos hermanos.
Com a chegada de Javier Milei ao poder, em dezembro do ano passado, a classe artística do país se dividiu. Em parte, isso aconteceu porque o presidente libertário fez grandes mudanças no Instituto Nacional de Cinema e Artes Audiovisuais (INCAA), um órgão equivalente ao que é a Agência Nacional de Cinema no Brasil. Além de demitir cerca de 200 pessoas, ele direcionou o órgão para bem longe de shows e outros projetos custosos – as despesas operacionais do INCAA eram equivalentes a US$ 1,9 bilhão em 2023. E como Guillermo Francella se encaixa nisso?
Ele foi um dos primeiros artistas a se demonstrar favorável a todas as mudanças realizadas por Milei. Em março deste ano, Francella foi entrevistado pela rádio Mitre, de Buenos Aires, e comentou esperançoso: “O que sei é que foram mais do que necessários [os ajustes no INCAA] e sabíamos que ia haver uma grande cirurgia. Disseram isso na campanha e ele [Milei] cumpriu rigorosamente.”
Com a fala direta, não demorou para que Francella passasse a ser questionado sobre seu posicionamento político em todas as oportunidades. Figuras notáveis do audiovisual do país, como Nancy Dupláa e María Valenzuela, criticaram abertamente o ator. Outros, como Luis Brandoni (estrela de O Faz Nada), saíram em defesa do colega.
O ator até se negou a dar um parecer sobre o assunto por algum tempo. Mas, em julho, quatro meses depois de seu depoimento, Francella decidiu abrir a boca e se dizer “apenado”, apesar de entender que “não disse nada demais para alguém reagir”.
Eliseo premiado
O caso parecia ter dado uma esfriada, até porque Francella estava desfrutando da enorme repercussão da série Meu Querido Zelador. Nela, o ator vive um homem que se dedica à zeladoria de um condomínio há mais de 30 anos. Tudo muda quando os moradores decidem tirá-lo da função para instalar uma piscina no terraço.
A comédia então acompanha inúmeras cenas que mostram o protagonista, Eliseo, usando da sabedoria típica de um antigo funcionário para prevalecer na disputa com os condôminos. Ele não é um personagem bonzinho, mas é divertido em suas sacanagens para se manter o poder, quase como um político profissional.
Neste ano, o seriado chegou à terceira temporada, fazendo barulho por encerrar o último episódio com uma ida do zelador ao gabinete do presidente e trazendo toda a polêmica de Francella à tona. O capítulo, chamado Eliseo Contra o Estado Nacional Argentino, não mostra quem é o chefe de estado da Argentina, mas já serviu para ligar o ator a Milei mais uma vez.
Com sua fenomenal atuação, Francella venceu o Martín Fierro de Oro de 2024, principal prêmio do setor no país. O feito foi considerado surpreendente, dado o número de atores e diretores que criticaram abertamente a Milei em seus discursos de agradecimento. Em sua fala após a vitória, o ator fugiu da polêmica e apenas reforçou que o reconhecimento foi um “mimo para o coração” e que não faz “discursos ou frases de julgamento”.
O melhor de todos
Diversos veículos locais analisaram a situação e reforçaram o fato do astro ser um dos principais (e poucos) nomes da cultura ligados ao atual governo libertário. “Guillermo Francella se tornou o centro das atenções durante o Martín Fierro de Cine, onde seu desconforto com os discursos políticos contra Javier Milei gerou debate nas redes sociais”, analisou a jornalista Marisol García no jornal Aire Digital.
Após a premiação, o próprio Milei repostou em sua conta pessoal no X uma mensagem que parabenizava o desempenho e a postura do ator durante a premiação. “É muito notória a diferença entre um cara que chegou ali por seus próprios méritos e essa gente que quer continuar parasitando o povo argentino pela INCAA”, dizia a postagem. “Sempre com Francella, um grande homem e, de longe, o melhor de todos”, concluía.
Talvez vejamos Francella se posicionar de maneira mais incisiva nos próximos meses. De qualquer forma, ele já está consagrado como um dos maiores nomes do audiovisual argentino. E o melhor de tudo é que isso não se deu por sua visão política, mas por seu belo trabalho na frente das câmeras – basta assistir a Meu Querido Zelador para confirmar isso. Que ele escape de qualquer tentativa de cancelamento e siga entregando o que sabe fazer de melhor, que é sua arte.
Bolsonaro “planejou, dirigiu e executou” atos para consumar golpe de Estado, diz PF
PF acusa Braga Netto de pressionar comandantes sobre suposta tentativa de golpe
Governadores do Sul e Sudeste apostam contra PEC de Lula para segurança ao formalizar Cosud
Congresso segue com o poder nas emendas parlamentares; ouça o podcast