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A cozinheira Aoy usa sua panela wok para crescer no mundo gastronômico
A cozinheira Aoy usa sua panela wok para crescer no mundo gastronômico| Foto: Divulgação Netflix

Filme tailandês de estrondoso sucesso na Netflix neste mês de abril, Fome de Sucesso acompanha a trajetória da jovem Aoy, cozinheira que deixa seu humilde estabelecimento familiar para tentar se tornar alguém especial trabalhando com Paul, o chef celebridade que prepara refeições para endinheirados em eventos exclusivos. Como em várias das cenas alimentos são manipulados e belos pratos são servidos, a obra atrai muitos espectadores interessados na poética das panelas e no prazer da comida. Mas Fome de Sucesso usa desse ambiente da cozinha para debater outros assuntos, como as relações de poder no trabalho e na sociedade, a falta de classe de uma certa elite financeira e as corrupções cotidianas. Tudo isso sem muitas nuances.

Quem chega ao filme mais pelo fator alimentar pode se decepcionar com passagens inverossímeis ou que não representam bem a paixão pelo oficio de se preparar um prato. Na equipe Hunger do chef Paul, os funcionários precisam furtar alimentos se quiserem descobrir o real sabor de um fígado de ganso. Aoy, em seu primeiro teste para fazer parte dessa triste trupe, vira a noite tentando fritar uma fina fatia de Wagyu A5, a carne mais valiosa do mundo. Isso, obviamente, nunca aconteceria na vida real, pois é inconcebível que se desperdice uma iguaria dessas num teste de calouro.

Outro momento indigesto para quem entende um pouco dos prazeres da mesa se dá quando o chef Paul rememora o que o fez escolher sua profissão. Ele recorda uma refeição na casa onde sua mãe trabalhava, em que o filho da patroa comia caviar como se fosse a mais trivial margarina espalhada no pão. Na cena seguinte, o pequeno Paul abre a geladeira curioso para entender o que eram aquelas microesferas pretas ingeridas pela criança rica. O filho da patroa flagra o xereta, que com o susto espatifa o pote de caviar no chão da cozinha. Penalizados, mãe e filho começam a recolher a sujeira, quando Paul pega umas bolinhas e leva à boca. Ele acha horrível o gosto das ovas e decide nesse instante que quer trabalhar na área! O fascínio não vem pelo paladar, mas sim pela possiblidade de iludir ricaços com ingredientes que custam caro, mas não são gostosos de fato (uma heresia para quem sabe o que é caviar).

Quando a elite tailandesa é mostrada devorando os banquetes preparados por Paul, as cenas são dantescas. Parecem animais descontrolados chafurdando em lavagem. Nos momentos menos escrachados, Paul tapeia os comensais servindo água com sal como se fora uma sopa muito refinada ou prepara um caldo usando somente sachês de temperos de macarrão instantâneo. Em contraposição a isso, Aoy tenta não perder a alma ao cozinhar, e até tenta emplacar nesse meio esnobe uma receita aprendida com sua avó e que é sucesso entre seus familiares há décadas, cujo nome não poderia ser melhor: macarrão manhoso.

A dúvida se Aoy vai ou não triunfar nesse meio asqueroso é o que sustenta as duas horas e meia de Fome de Sucesso. Para quem não ficou animado com o clima cínico que perpassa todo o filme, vale dizer que a importância da família é ressaltada no momento mais crucial, então a moral da história conforta quem prefere uma cozinha mais caseirinha ou um divertimento na Netflix sem condimentos muito desafiadores. Quem quiser prato arrojado deve mudar para o Star+ e provar O Menu.

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