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Verve argentina

Série “O Museu” expõe sentido da senioridade em um mundo dominado pelo modismo

Óscar Martínez vive Antonio Dumas, que assume um importante museu em Madri
Óscar Martínez vive o experiente Antonio Dumas, que assume um importante museu em Madri (Foto: Divulgação Star+)

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Antonio Dumas tem meio século de experiência no circuito das artes plásticas, com livros usados em escolas e tudo mais. Mesmo assim, ao concorrer a uma vaga para dirigir o Museu Ibero-americano de Arte Moderna da Madri contra duas novatas (e claras representantes da onda identitária), Dumas não parece o favorito. Ele mesmo não se coloca nessa posição. No processo seletivo, ao ser instado a se posicionar sobre o tema, ele diz à comissão julgadora: “Sou homem, sou branco, sou velho e sou heterossexual. Obviamente, as outras duas candidatas são escolhas mais conservadoras para vocês”.

A cena antológica é só um aperitivo de O Museu, série de seis episódios de menos de meia hora que chegou outro dia ao Star+. Os realizadores são três argentinos bem conhecidos de quem acompanha o melhor humor latino-americano. Mariano Cohn e os irmãos Gastón e Andrés Duprat são responsáveis por séries divertidíssimas como O Faz Nada e Meu Querido Zelador, além de filmes como O Homem ao Lado e O Cidadão Ilustre, este último estrelado pelo mesmo Óscar Martínez que agora interpreta Dumas (aliás, milagrosamente, ele fica com a vaga de diretor do museu).

A verve da trinca fica mais afiada a cada novo produto audiovisual lançado. Dessa vez, Andrés Duprat, que possui formação de arquiteto, é o nome de destaque. Autor do roteiro e de muitas das obras vistas em cena, o hermano mayor tem intimidade com o assunto. Ele atualmente dirige o Museu Nacional de Belas Artes de Buenos Aires – originalmente, a série se chama Bellas Artes. Portanto, muitas das histórias contadas nos capítulos devem ser familiares para Andrés. Seu alter ego Dumas tem de lidar com a burocracia do Ministério da Cultura espanhol, com o gênio forte da ministra, com o nepotismo interno, com funcionários mimizentos, com assistentes tolos e com artistas mimadinhos. Um inferno – e um deleite para o espectador.

Entre manifestantes e coletivos

Um dos principais embates de Dumas ao assumir o museu é relacionado a uma estátua que passa a ser vandalizada porque manifestantes descobriram que o homenageado tinha uma relação difícil com as mulheres. O diretor faz de tudo para manter o monumento na entrada do estabelecimento, não cedendo aos jovens autoritários que almejam apagar o passado. Qualquer semelhança com outras estátuas espalhadas pelo mundo que estão no alvo de grupelhos histéricos (incluindo o Borba Gato, em São Paulo) não é mera coincidência.

Dumas também tem de aturar um artista chileno filho de banqueiro que cisma em usar uma baleia em decomposição para dar mais veracidade à sua obra de denúncia ambiental. O museu fica empesteado pelo odor pútrido e leva o diretor a tomar uma decisão criativa. Seu jogo de cintura também é fundamental para que ele encontre um destino para um coletivo de artistas do Senegal que chega a Madri para uma residência de um mês dentro do museu. Depois de perceber que a trupe, na verdade, é uma família africana que não quer mais voltar para o seu país, Dumas recorre à própria lábia para desovar os imigrantes em outro canto, num movimento que Larry David também executou para se livrar de uma secretária incompetente na finada Segura a Onda (Curb Your Enthusiasm).

Na esfera particular, o protagonista tem questões bem difíceis para resolver. Ele não se dá com o filho e não tem a menor paciência com o neto. Aliás, nem de ser chamado de avô ele gosta. O sexto e derradeiro episódio dá mais contexto familiar para Dumas e indica que teremos uma segunda temporada em que ele terá de lidar com os parentes mais próximos e com um amor do passado que estava em outro continente e resolve voltar para a Espanha. Dá para imaginar que esse herói moderno, ainda que “homem, branco, velho e heterossexual”, vai conseguir se safar de qualquer encrenca vindoura. Torcida daqui não lhe faltará.

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