Caso você seja fã de comédia stand-up e não conheça Katt Williams, não se sinta por fora. O humorista de 52 anos, oriundo do estado de Ohio, não integra o primeiro time da classe, composto por Dave Chappelle, Chris Rock, Bill Burr, Ricky Gervais e poucos outros. Ou não integrava até agora. Além de ter viralizado bastante neste ano com trechos de entrevistas em podcasts, Williams estreou um especial transmitido ao vivo na Netflix no sábado passado que está dando o que falar. Nos Estados Unidos, Woke Foke já teve o dobro de espectadores do que a Fritada (ou Roast, no original) com o ex-Gisele Bündchen Tom Brady, lançada no mesmo final de semana e com alta expectativa.
Aqui no Brasil, Woke Foke está disponível com legendas em inglês, numa versão editada após sua exibição no sábado. Foi só a segunda vez que o serviço de streaming transmitiu um stand-up ao vivo, sendo o primeiro o Indignação Seletiva, de Chris Rock. Pela casa, Williams já tinha lançado dois especiais: World War III (2022) e Great America (2018), ambos disponíveis com legendas em português na plataforma. Antes, os stand-ups de Williams eram bancados pela HBO (hoje Max).
Em Woke Foke, o protagonista da noite é introduzido como "o rei da comédia underground". Só que, como já dito, esses dias de cena alternativa podem ter ficado no passado graças ao sucesso do especial. A premissa é que ele teve acesso aos Illuminati, descobriu os segredos que a Ordem guarda e saiu correndo para compartilhar tudo com a plateia. Isso é usado para questionar os rumos da humanidade e nossa passividade diante de tendências idiotas que vão chegando e se alastrando, como a própria expressão woke, presente no título do especial. Williams avisa que não adotará a nova acepção do termo (que indica uma suposta conscientização relativa à justiça social) e seguirá tratando woke (despertar) como somente o oposto de dormir.
Por falar em dormir, o presidente Joe Biden é um dos alvos do humorista no especial. Ele admite que os eleitores abaixaram muito o sarrafo quando escolheram o político para presidir o país e que já fica feliz quando o comandante apenas não tropeça e cai. Ao comentar sobre a feiura do tênis lançado por Donald Trump, ele aproveita para dizer que já usou o tênis de Biden, mas seus pés dormiram. Para mais piadas com o presidente, vale assistir a World War III, em que Williams pega realmente pesado com “Sleepy Joe”, chegando a compará-lo com o personagem do filme Um Morto Muito Louco. Já em Great America, a zoeira é com Trump, que estava no poder à época.
Um casca-grossa das piadas
No momento mais engraçado de Woke Foke, Williams faz troça com a atual era em que uma pessoa pode ser e fazer tudo. Ele mostra um vídeo de um garotinho cego que joga futebol americano com outros colegas que enxergam. Na cena, o menino corre para o lado errado e demora a perceber isso, baseando-se no barulho dos jogadores se distanciando. O ponto de Williams é que você realmente pode jogar futebol americano mesmo sendo deficiente visual, mas será que você deve fazer isso? A piada já deve estar sendo repudiada por alguma associação americana por conta de seu “capacitismo”.
Certamente, isso não amedrontará Williams. Nascido num lar de Testemunhas de Jeová, ele se emancipou aos 13 anos e foi se virar sozinho, morando em abrigos de sem-teto, roubando sons de carro e trabalhando como camelô até se estabelecer no circuito de comédia, no final dos anos 90. De lá para cá, foi preso diversas vezes por confrontos físicos, porte ilegal de arma de fogo, suspeita de furtos e outras confusões do arco da velha. Ele brinca que não precisa mais tirar aquela foto obrigatória quando vai em cana. Os policiais abrem seu álbum de mugshots e perguntam “qual você quer usar dessa vez?”
Cristão com dez filhos para criar (sete deles adotados), Williams merece muito esse grande momento na carreira, dizem seus admiradores, famosos ou não. Antes de Woke Foke, ele vinha dando entrevistas muito intrigantes para podcasts, incluindo uma que marcou a volta do The Joe Rogan Experience para o YouTube. Nesses papos, Williams aparece sereno, cheio de referências intelectuais (chegou a dizer que lê oito livros por dia), numa versão bem diferente da que exibe nos palcos: serelepe com seu 1m65, suando bastante e com o tom de voz cada vez mais estridente. Sua comédia, além dos comentários políticos e sociais, tem muita pornografia e observações sobre as diferenças entre negros, brancos e latinos. Nos próximos capítulos, saberemos se ele foi capaz de ficar no topo ou se sua vida bandida o segurou no underground.